Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

quinta-feira, 25 de abril de 2019

O PRIMEIRO DE MAIO

Sociedade União Operária por volta de 1910. Estúdio Fontana. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense. 



Atividade na Sociedade União Operária em 01-12-1908. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense. 


Na véspera do “Dia do Trabalho” é relevante recordar a marcante presença de operários, a partir da segunda metade do século XIX, em Rio Grande. Um pesquisador desta temática, Benito Bisso Schimdt contribui para caracterizar o movimento operário local o papel da Sociedade União Operária.
Conforme Benito Schmidt no artigo “A Diretora dos Espíritos da Classe: a “Sociedade União Operária” de Rio Grande (1893-1911). Cad. AEL, v.6, n.10/11, 1999”, Rio Grande foi uma das primeiras cidades gaúchas a apresentar as marcas da sociedade urbano-industrial. Sobretudo nos primeiros anos, após a proclamação da República, desenvolveram-se no município indústrias de tecidos, charutos e conservas alimentícias, com consideráveis índices de capital investido e mão-de-obra empregada. Sendo o principal porto do estado, procurava alcançar o mercado nacional com poucos produtos, em torno dos quais concentrava o poder competitivo de suas empresas. Este processo foi percebido por muitos daqueles que o vivenciaram. Pedro Dantas, por exemplo, colaborador do jornal socialista Democracia Social, da vizinha Pelotas, assim descrevia a paisagem rio-grandina em 1893: “para todos os lados que se virar os olhos depara-se com um enorme cano de fábrica como que recortando os rolos de nuvens que passam pelo ar” (10-12-1893). Concomitantemente à industrialização ocorreu a formação de um proletariado urbano. É difícil precisar a população operária naquele momento, contudo algumas aproximações são possíveis. Segundo o jornal A Patria, Rio Grande tinha uma população de 20.277 pessoas em 1883. Já em 1897, o Echo Operario calculava serem ao redor de 8.000 a 10.000 aqueles que viviam de seu próprio trabalho, incluindo os donos de oficinas e artesãos autônomos.
Segundo Benito Schmidt, Rio Grande destacou-se também como um dos principais núcleos do movimento operário do estado, cujas manifestações fizeram-se sentir desde as últimas décadas do século passado: jornais, associações, greves, meetings, comemorações do 1º de maio, entre outras atividades, despontaram na cidade ao longo da I República. A primeira tentativa de organizar o proletariado de Rio Grande ocorreu com a Liga Operária (1892) que teve duração efêmera. No final de 1893 um grupo de operários convocou uma reunião para organizar uma sociedade voltada aos anseios do proletariado. O resultado foi à criação da União Operária que foi fundada em 24 de dezembro, mas, instalada oficialmente no dia 1° de maio de 1894, data em que pela primeira vez foi comemorado o Dia do Trabalho na cidade.  

INDÚSTRIA PESQUEIRA

Exposição de produtos da Pescal. Acervo: papareia.

Exposição de produtos da Torquato Pontes. Acervo: papareia.

Caviar de ovas de Miragaia. Acervo: papareia.


O cientista alemão Hermann von Ihering no livro A Lagoa dos Patos no século XIX na visão do naturalista Hermann von Ihering. (Rio Grande: Ecoscientia, 2003, p. 24-27, tradução de Clarisse Odebrecht), enfatizou da importância da pesca para a cidade do Rio Grande na primeira metade da década de 1880. Segundo ele, o mercado público do Rio Grande dispõe de peixes todos os dias, com exceção, naturalmente, de dias com muita chuva e trovoada, quando o trabalho na água é impossibilitado. Existem quatro a cinco grandes companhias de pescado, que não trabalham para o mercado, mas sim para a exportação. A maioria dos produtos capturados são embalados em barris ou tonéis e enviados para o Rio de Janeiro, Bahia ou Pernambuco, mas em parte também para Montevidéo, principalmente os camarões. Os produtos destinados ao Rio de Janeiro são levados normalmente em barcos a vapor (2$000 Rs. de frete por barril), e os para a Bahia e Pernambuco são embarcados em navios a vela”.
Não resta dúvida de que a atividade pesqueira do Rio Grande ainda poderia ser expandida consideravelmente. Mesmo se, de acordo com a natureza do produto – peixes salgados e secos - exportação do Rio Grande se dirige principalmente para o mercado no Norte do Brasil, ainda assim existem, entre os produtos locais, uma série de artigos que poderiam garantir rapidamente uma posição no mercado internacional. Seria de grande interesse para a população do litoral brasileiro que o governo brasileiro desenvolvesse a pesca marinha, a qual até o presente não foi bem estudada ou cuidada nem no Brasil nem em outros locais da América do Sul. Essa atenção seria de interesse para o bem-estar da população. Especialmente as dainhas e os linguados, bem como os camarões, poderiam tornar-se significativos na exportação ultramar. Pelos dados parciais levantados por Ihering, cerca de 15.000 quilos de miragaia seca eram produzidas por ano A dainha é capturada principalmente em maio, quando freqüentemente é capturada em quantidade tão grande que os pescadores só retiram tantos peixes da rede quantos podem guardar, jogando o resto de volta à água. Elas são preparadas com sal em barris. Em cada barril cabem 108-120 peças, com produção anual de cerca de 1.000 barris.
Na década de 1950 a cidade do Rio Grande passou por uma forte crise no setor industrial que promoveu alto índice de desemprego. A indústria têxtil, de alimentos e frigorífica estavam em decadência. O setor pesqueiro, na década de 1960 absorveu significativa mão-de-obra operária até a segunda metade da década de 1980 quando entra em falência. A indústria pesqueira na década de 1960 apresentava 17 empresas atuando no beneficiamento e exportação de pescado, voltado para diferentes mercados do Brasil e exterior. Significativo número de trabalhadores atuaram neste ramo industrial.
Fator de destaque para a implementação da indústria pesqueira no município foi a criação da SUDEPE em 1962 com incentivos fiscais previstos pelo Decreto-Lei n° 267, de 1967. Estes benefícios incluíam isenção de impostos e taxas federais sobre produtos importados, produtos industrializados, taxas aduaneiras na importação de máquinas e outros benefícios. O capital disponibilizado para o setor foi aproveitado pelo empresariado deste ramo que consolida em Rio Grande um parque industrial pesqueiro de renome nacional. O município apresentava as condições necessárias para ampliação do parque produtivo, como matéria-prima abundante e mão-de-obra qualificada na captura e no processamento fabril. (ver MARTINS, Solismar. Cidade do Rio Grande: industrialização e urbanidade (1873-1990). Rio Grande: Editora da FURG, 2006). Antigas salgas se transformam em novas plantas industriais sendo a comercialização do pescado industrializado direcionado para outros estados brasileiro.
O avanço tecnológico do setor pesqueiro e a disponibilidade do mar territorial do Uruguai e da Argentina, fez com que em 1970 a captura chegasse a 120.000 toneladas. Com a delimitação do mar territorial brasileiro em 1970 e as restrições então feitas pelo Uruguai e Argentina na pesca brasileira em seu mar territorial, a área de captura do pescado ficou bastante reduzida. No início dos anos 1980 o setor era constituído por 27 empresas que abarcavam o congelamento, salga, enlatamento, feitura da farinha, óleos e gelo. O setor empregava 20.000 trabalhadores, ou cerca de 90% da mão-de-obra industrial pesqueira empregada no Rio Grande do Sul. As empresas aqui atuando eram: Jahu Indústria e Comércio de Pescado, Torquato Pontes Pescados, Pescal, Eduardo Ballester Ind. de Pescados, Cooperativa Mista de Pescados Nipo-Brasileira, Atlântica Pescados, Guanapesca Indústria e Comércio de Pescados, Joqueira Indústria Alimentícia, Junca Indústria e Comércio de Pescados, Abel Dourado Indústria Alimentícia, Leal Santos Pescados, Albano Oliveira e Irmão, Manoel Pereira de Almeida, Frigorífico Anselmi, Rio Grande Produtos Alimentícios, Domar Ind. e Com. de Pescados, Furtado, Pesqueira Nacional, Cunha Amaral, Indústria e Comércio Figueiredo, Promar, Redentor, Indústria Charrua de Pescados, Marsilva Importação e Exportação de Pescados, Atlantis Comércio de Pescados, Nilmarsul Comércio e Exportação de Pescados, F.R. Amaral Indústria e Comércio de Pescados.  
             A crise do setor está relacionada com a redução da área de captura, a escassez  do pescado devido à sobrepesca de algumas espécies e a retirada o Estado como incentivador fiscal. Em 1985 ocorreu o desembarque de 87.490 toneladas de pescado com o declínio a partir do ano seguinte.
         Conforme Solismar Martins, o parque industrial pesqueiro não proporcionou a formação de uma classe média para a cidade, visto que seus operários trabalhavam em troca de baixa remuneração e, muitas vezes, com empregos temporários. Se a indústria pesqueira era moderna quanto ao processamento do pescado, tal riqueza, concentrada nas mãos de poucos, não se transferia para os demais trabalhadores envolvidos no processo. Além disso, a intensificação do processo de capturas levou ao descompasso dos ritmos reprodutivos das espécies de maior valor comercial. A partir da década de 1990 o pescado chegou a Rio Grande em menores quantidades sendo absorvido pelas poucas indústrias pesqueiras que permaneceram em Rio Grande, sendo consumido na própria cidade e principalmente sendo enviado in natura para processamento em outros centros por meio de caminhões frigoríficos ou containers. De cidade pioneira na indústria da pesca, Rio Grande foi se moldando como um grande entreposto de pesca, num caminho de industrialização às avessas.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

SANTA ENGRÁCIA


      A Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa, teve sua obra iniciada em 1568 e sua construção perdurou por quatro séculos sendo finalizada na década de 1960 como Panteão Nacional onde repousam figuras destacadas de Portugal.
O longo tempo para sua execução popularizou a expressão “como as obras de Santa Engrácia”, em referência a algo que não chegará a acontecer, ou que demorará muito a acontecer. Versão popular fala de uma maldição lançada pelo cristão-novo Simão Pires Solis que era apaixonado por Violante filha de um fidalgo que não aceitou o relacionamento dos jovens. Solis foi acusado de roubar o relicário de Santa Engrácia e executado na fogueira. Enquanto seu corpo começava a ser envolvido pelo fogo ele teria lançado a maldição: “É tão certo morrer inocente como as obras nunca mais acabarem!”. A lenda pode ser parcialmente verdadeira, pois em 1630, os registros paroquiais registram a condenação à morte de Simão Pires Solis por desacatar Santa Engrácia!
No imaginário ficou a relação entre a maldição e a lentidão ou inviabilidade em encerrar uma obra. O interessante é que a lenda portuguesa era lembrada em Rio Grande em matéria do Jornal Rio Grande do dia 24 de fevereiro de 1956.  O tema se refere à construção do “Parque Princesa Isabel” no local atual do Parque do Trabalhador junto ao pórtico da cidade. A crítica é feita a lentidão/inexistência de trabalhos caracterizando segundo o jornal uma “obra de Santa Engrácia” isto é, “toda construção que demora mais do período normal entre o início e o fim”. No caso do Parque Princesa Isabel ocorreu uma dupla maldição de Santa Engrácia: em Portugal a igreja/panteão foi finalizada enquanto o referido Parque, com aquela proposta arquitetônica, nunca foi efetivado.

Acervo: Biblioteca Rio-Grandense. 


sexta-feira, 12 de abril de 2019

ANÚNCIOS DA SAVAG




Gustavo Cramer e Getúlio Vargas. 
Fundada em 1946, a Sociedade Anônima Viação Aérea Gaúcha (SAVAG) foi fundada na cidade do Rio Grande e tinha sua sede no andar térreo do edifício da Câmara do Comércio. Rio Grande já havia escrito um capítulo fundamental da aviação comercial brasileira com sua participação destacada na criação da VARIG com a “Linha da Lagoa” em 1927. Quase uma década depois, o comandante Gustavo Cramer foi um dos fundadores da SAVAG e se destacou na interligação aérea do Rio Grande com Porto Alegre e outras cidades gaúchas como Pelotas, Bagé, Passo Fundo, Carazinho e Erechim.
Gustavo Cramer nasceu em Rio Grande em 1911, dedicou-se à aviação sendo instrutor de voo no Aeroclube do Rio Grande e tornou-se piloto da Panair do Brasil. Desta empresa foram comprados os três aviões Lockheed Lodestar que deram início aos voos da SAVAG em janeiro de 1947. O primeiro dos aviões foi batizado de “Cidade de São Pedro do Rio Grande”, com voos entre Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre. Posteriormente, foi comprado um Douglas DC-3, e iniciado os voos para Rio de Janeiro e São Paulo.
Na tarde do dia 30 de julho de 1950, Gustavo Cramer pilotava o “Cidade de São Pedro do Rio Grande” quando ocorreu um acidente em São Francisco de Assis que resultou na morte de todas as seis pessoas que estavam a bordo. O motivo da viagem era levar o ex-ministro da Aviação, senador Salgado Filho, para uma visita a Getúlio Vargas em São Borja. A tragédia teve repercussão nacional e uma trágica curiosidade está relacionada com Salgado Filho: no dia 28 de julho, dois dias antes do acidente fatal, ele não conseguiu embarcar no voo 99 da PANAIR (o Lockheed Constellation estava lotado) avião vindo do Rio de Janeiro que se chocou/explodiu com o Morro do Chapéu (Sapucaia do Sul) deixando 50 mortos. Salgado Filho teve mais dois dias de vida antes do trágico acidente que também tirou a vida de Cramer!  
No ano de 1956, propagandas da SAVAG estavam diariamente presente no jornal “Rio Grande”. Três exemplos destes anúncios são aqui reproduzidos.   






A PRIMEIRA FOTOGRAFIA DE UM BURACO NEGRO



Sua existência foi prevista por Albert Einstein quando da elaboração da Teoria da Relatividade Geral e das questões relativas à curvatura do espaço-tempo. Após décadas de discussões teóricas e observações astronômicas, a primeira fotografia de um buraco negro foi divulgada. Um esforço científico envolvendo mais de 200 profissionais e vários centros de pesquisa/rede de telescópios em diferentes países possibilitou observar um gigantesco buraco negro três milhões de vezes maior do que o planeta Terra. Sua localização é a distante galáxia M87 que está a 55 milhões de anos-luz da Terra (é só multiplicar 55 milhões por 10 trilhões de quilômetros).  
A divulgação da fotografia ocorreu no último dia 10 de abril e vai instigar o aprofundamento da investigação destes corpos de massa e densidade extraordinárias, na fase final de evolução estelar, que colapsaram e cuja atração gravitacional é tão forte que não deixa escapar nem a luz. As imagens mostram o buraco negro na parte escura central e as rajadas de energia de radiação que são sugadas para dentro do buraco.
Mais informações em https://www.natgeo.pt/espaco/primeira-fotografia-de-um-buraco-negro




sexta-feira, 5 de abril de 2019

O CONFRONTO LUSO-ESPANHOL

Cartografia portuguesa de 1777.


Cartografia espanhola de 1776.

Durante 13 anos, entre 1763 e 1776, a Vila do Rio Grande de São Pedro foi controlada pelos espanhóis.
Fundada em nome da Coroa Portuguesa em 1737, Rio Grande teve sua ocupação questionada por hispano-platinos desde os primórdios e transformou-se num dos espaços de conflito no século XVIII. Em 1763 ocorreu a ocupação espanhola da Vila que foi retomada pelos portugueses em abril de 1776. Os dois eventos consistem em momentos exponenciais e dramáticos que definiram o projeto civilizatório luso-brasileiro no Rio Grande do Sul. A manutenção da presença espanhola poderia ter lançado a atual fronteira com o Uruguai, no Chuí, pelo menos duzentos quilômetros ao norte. A ocupação espanhola e todas as atuações épicas ligadas à retomada portuguesa constituem episódios de destaque no cenário da história militar brasileira e nos desdobramentos geopolíticos de constituição do Brasil nação.
Com a ocupação espanhola, ocorreu o êxodo de grande parte da população luso-brasileira-açoriana que se dispersou pelo centro-leste do Rio Grande do Sul. A retomada portuguesa da Vila do Rio Grande envolveu um contingente de mais de quatro mil homens que expulsam os mais de 1.600 combatentes espanhóis. Os anos seguintes são de reconstrução e de repovoamento, ocorrendo um lento e gradual período de valorização econômica da Capitania do Rio Grande e o incremento das atividades marítimas e lagunares.
A produção cartográfica deste período é uma das melhores do Brasil da segunda metade do século XVIII. Portugueses espanhóis se esforçaram para retratar geograficamente o cenário em que se disputou a soberania cujo epicentro é a Barra do Rio Grande. Os dois mapas/plantas/planos selecionados são: Plano do Rio Grande de São Pedro (1777) da Biblioteca Nacional de Portugal; Plano del Rio Grande de San Pedro (1776) acervo do Arquivo General Militar de Madrid.