Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

quinta-feira, 25 de abril de 2019

INDÚSTRIA PESQUEIRA

Exposição de produtos da Pescal. Acervo: papareia.

Exposição de produtos da Torquato Pontes. Acervo: papareia.

Caviar de ovas de Miragaia. Acervo: papareia.


O cientista alemão Hermann von Ihering no livro A Lagoa dos Patos no século XIX na visão do naturalista Hermann von Ihering. (Rio Grande: Ecoscientia, 2003, p. 24-27, tradução de Clarisse Odebrecht), enfatizou da importância da pesca para a cidade do Rio Grande na primeira metade da década de 1880. Segundo ele, o mercado público do Rio Grande dispõe de peixes todos os dias, com exceção, naturalmente, de dias com muita chuva e trovoada, quando o trabalho na água é impossibilitado. Existem quatro a cinco grandes companhias de pescado, que não trabalham para o mercado, mas sim para a exportação. A maioria dos produtos capturados são embalados em barris ou tonéis e enviados para o Rio de Janeiro, Bahia ou Pernambuco, mas em parte também para Montevidéo, principalmente os camarões. Os produtos destinados ao Rio de Janeiro são levados normalmente em barcos a vapor (2$000 Rs. de frete por barril), e os para a Bahia e Pernambuco são embarcados em navios a vela”.
Não resta dúvida de que a atividade pesqueira do Rio Grande ainda poderia ser expandida consideravelmente. Mesmo se, de acordo com a natureza do produto – peixes salgados e secos - exportação do Rio Grande se dirige principalmente para o mercado no Norte do Brasil, ainda assim existem, entre os produtos locais, uma série de artigos que poderiam garantir rapidamente uma posição no mercado internacional. Seria de grande interesse para a população do litoral brasileiro que o governo brasileiro desenvolvesse a pesca marinha, a qual até o presente não foi bem estudada ou cuidada nem no Brasil nem em outros locais da América do Sul. Essa atenção seria de interesse para o bem-estar da população. Especialmente as dainhas e os linguados, bem como os camarões, poderiam tornar-se significativos na exportação ultramar. Pelos dados parciais levantados por Ihering, cerca de 15.000 quilos de miragaia seca eram produzidas por ano A dainha é capturada principalmente em maio, quando freqüentemente é capturada em quantidade tão grande que os pescadores só retiram tantos peixes da rede quantos podem guardar, jogando o resto de volta à água. Elas são preparadas com sal em barris. Em cada barril cabem 108-120 peças, com produção anual de cerca de 1.000 barris.
Na década de 1950 a cidade do Rio Grande passou por uma forte crise no setor industrial que promoveu alto índice de desemprego. A indústria têxtil, de alimentos e frigorífica estavam em decadência. O setor pesqueiro, na década de 1960 absorveu significativa mão-de-obra operária até a segunda metade da década de 1980 quando entra em falência. A indústria pesqueira na década de 1960 apresentava 17 empresas atuando no beneficiamento e exportação de pescado, voltado para diferentes mercados do Brasil e exterior. Significativo número de trabalhadores atuaram neste ramo industrial.
Fator de destaque para a implementação da indústria pesqueira no município foi a criação da SUDEPE em 1962 com incentivos fiscais previstos pelo Decreto-Lei n° 267, de 1967. Estes benefícios incluíam isenção de impostos e taxas federais sobre produtos importados, produtos industrializados, taxas aduaneiras na importação de máquinas e outros benefícios. O capital disponibilizado para o setor foi aproveitado pelo empresariado deste ramo que consolida em Rio Grande um parque industrial pesqueiro de renome nacional. O município apresentava as condições necessárias para ampliação do parque produtivo, como matéria-prima abundante e mão-de-obra qualificada na captura e no processamento fabril. (ver MARTINS, Solismar. Cidade do Rio Grande: industrialização e urbanidade (1873-1990). Rio Grande: Editora da FURG, 2006). Antigas salgas se transformam em novas plantas industriais sendo a comercialização do pescado industrializado direcionado para outros estados brasileiro.
O avanço tecnológico do setor pesqueiro e a disponibilidade do mar territorial do Uruguai e da Argentina, fez com que em 1970 a captura chegasse a 120.000 toneladas. Com a delimitação do mar territorial brasileiro em 1970 e as restrições então feitas pelo Uruguai e Argentina na pesca brasileira em seu mar territorial, a área de captura do pescado ficou bastante reduzida. No início dos anos 1980 o setor era constituído por 27 empresas que abarcavam o congelamento, salga, enlatamento, feitura da farinha, óleos e gelo. O setor empregava 20.000 trabalhadores, ou cerca de 90% da mão-de-obra industrial pesqueira empregada no Rio Grande do Sul. As empresas aqui atuando eram: Jahu Indústria e Comércio de Pescado, Torquato Pontes Pescados, Pescal, Eduardo Ballester Ind. de Pescados, Cooperativa Mista de Pescados Nipo-Brasileira, Atlântica Pescados, Guanapesca Indústria e Comércio de Pescados, Joqueira Indústria Alimentícia, Junca Indústria e Comércio de Pescados, Abel Dourado Indústria Alimentícia, Leal Santos Pescados, Albano Oliveira e Irmão, Manoel Pereira de Almeida, Frigorífico Anselmi, Rio Grande Produtos Alimentícios, Domar Ind. e Com. de Pescados, Furtado, Pesqueira Nacional, Cunha Amaral, Indústria e Comércio Figueiredo, Promar, Redentor, Indústria Charrua de Pescados, Marsilva Importação e Exportação de Pescados, Atlantis Comércio de Pescados, Nilmarsul Comércio e Exportação de Pescados, F.R. Amaral Indústria e Comércio de Pescados.  
             A crise do setor está relacionada com a redução da área de captura, a escassez  do pescado devido à sobrepesca de algumas espécies e a retirada o Estado como incentivador fiscal. Em 1985 ocorreu o desembarque de 87.490 toneladas de pescado com o declínio a partir do ano seguinte.
         Conforme Solismar Martins, o parque industrial pesqueiro não proporcionou a formação de uma classe média para a cidade, visto que seus operários trabalhavam em troca de baixa remuneração e, muitas vezes, com empregos temporários. Se a indústria pesqueira era moderna quanto ao processamento do pescado, tal riqueza, concentrada nas mãos de poucos, não se transferia para os demais trabalhadores envolvidos no processo. Além disso, a intensificação do processo de capturas levou ao descompasso dos ritmos reprodutivos das espécies de maior valor comercial. A partir da década de 1990 o pescado chegou a Rio Grande em menores quantidades sendo absorvido pelas poucas indústrias pesqueiras que permaneceram em Rio Grande, sendo consumido na própria cidade e principalmente sendo enviado in natura para processamento em outros centros por meio de caminhões frigoríficos ou containers. De cidade pioneira na indústria da pesca, Rio Grande foi se moldando como um grande entreposto de pesca, num caminho de industrialização às avessas.

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