Aedes aegypt. Acervo:www.md.saude.com |
No mês de fevereiro
de 2016, as Forças Armadas do Brasil foram para as ruas para divulgar a
necessidade de manter uma guerra contínua contra o mosquito Aedes aegypti buscando
a conscientização da população brasileira para a prevenção. Este mosquito já
provou que pode ser mais devastador que uma guerra convencional, sendo um vetor
de transmissão de doenças como a dengue, a febre chikungunya e o zika vírus.
Mosquitos já são indesejados e até insuportáveis por sugarem o sangue numa
vampirização sistemática dos seres humanos. Porém, além de irritantes eles são
das mais eficientes formas de disseminação de doenças graves. No caso do Aedes aegypti
a sua história no Brasil nos remete ao século 16 no contexto das grandes
navegações. Originário do Egito, o Aedes
se difundiu no Novo Mundo por meio dos navios que realizavam o tráfico de
escravos da África. Portanto, o Brasil passou a ter contato com este mosquito
que foi descrito cientificamente em 1762 e denominado de Aedes aegypti em 1818.
Na forma de epidemia,
o primeiro registro foi feito no Peru, no século 19. A dengue foi descrita no
Brasil no final do século 19 em Curitiba e no início do século 20 em Niterói.
Nesta época o mosquito era transmissor da febre amarela, doença de elevada
gravidade tendo apresentado inclusive, neste período, casos em Rio Grande. O
mosquito foi descrito cientificamente por Antonio Peryassú no Rio de Janeiro em
1908 (Instituto Oswaldo Cruz), constando sua reprodução em focos de água. Com a
luta para combater a febre amarela, o Brasil considerou que o Aedes aegypti
estava erradicado em 1955. Porém, no final da década de 1960 o mosquito voltou
a ser registrado e hoje está presente em todos os estados brasileiros. A
primeira ocorrência de dengue documentada laboratorialmente ocorreu em 1981 em
Roraima. Em 1986, uma epidemia de dengue assolou o Rio de Janeiro e capitais da
região Nordeste assinalando um avanço sem precedentes do vetor causador da
dengue, o Aedes (o vírus fica alojado na saliva do mosquito que tem um ciclo de
vida de um a dois meses). Portanto, este problema da difusão grave do mosquito não
é recente, mas já se arrasta há 30 anos e vem se tornando cada vez mais grave
devido aos casos de Zika vírus. Talvez
possamos até fazer uma reflexão irreverente de que a erradicação dos corruptos
e do Aedes sejam os dois maiores desafios a serem enfrentados pelos
brasileiros.
O virologista Pedro Vasconcelos da Organização
Mundial de Saúde (OMS) comentou em entrevista a Folha de São Paulo (08-02-2016)
que a afirmação do Ministro da Saúde de que o Brasil estava perdendo a guerra
contra o mosquito é parcialmente correta: “Eu diria que o mundo está perdendo a
guerra. Não é só no Brasil que isso ocorre simultaneamente. Todos os países
hoje sendo anunciados com zika também têm dengue e chikungunya. Há perda global
da espécie humana para a espécie Aedes aegypti. É difícil dizer onde houve
erro. As nossas cidades são pouco limpas. O sistema de coleta de lixo não é
eficiente. O de fornecimento de água também não. Há acúmulo de água nas casas e
de lixo nas ruas. Tudo isso num país tropical onde chove muito, o que tende a
aumentar os criadouros do mosquito”, afirmou Vasconcelos. Segundo ele, a
declaração de emergência mundial em saúde pela OMS, permitirá maiores recursos
e a busca de uma integração de esforços no combate ao Aedes e no
desenvolvimento de uma vacina (num prazo de até cinco anos). Ele reitera que a
dengue está sendo subestimada: “a OMS estima a ocorrência de 300 milhões de
infecções por dengue por ano, das quais 100 milhões com sintomas.
Aproximadamente 50 mil doentes morrem por ano. A dengue é negligenciada. Parece
banalizada no mundo todo. Mas é mais grave que chikungunya e zika juntos”.
O Zika, que colocou vários países em alerta
devido à associação com casos de microcefalia (questão polêmica entre os
especialistas) apresentou a primeira epidemia nas Ilhas Yap na Micronésia no
ano de 2007. Não chamou a atenção devido ao aparente caráter “benigno” do
vírus. Porém, o Brasil se tornou uma referência internacional na literatura
médica frente à gravidade dos casos. As formas de transmissão também são
preocupantes, pois o vírus pode sobreviver na urina, no sêmen e no sangue. A
Organização Pan-Americana de Saúde projeta quatro milhões de novos casos nas
Américas. Em termos mundiais, em apenas 24 horas o vírus pode se difundir pelo
planeta a bordo de aviões com pessoas contaminadas. A hipótese mais forte da
chegada do Zica ao Brasil foi através do tráfego aéreo que é um eficiente
transmissor de agentes virais e infecciosos.
No presente devemos nos mobilizar para uma
guerra persistente, travada no cotidiano de cada residência, de cada rua, com o
olhar crítico para cada objeto com água que seja um possível criadouro de
larvas, num esforço coletivo em prol da saúde. O poder público tem uma função
imensurável de higienizar os espaços sob sua responsabilidade e de desenvolver
políticas de educação preventiva de combate ao mosquito. Afinal, cem anos
depois da Guerra da Tríplice Aliança, o Brasil está travando a Guerra da
Tríplice Epidemia: Dengue, Zica e Chikungunya.
Matéria publicada no Jornal Agora no dia 23 de fevereiro de 2016.
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