Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

terça-feira, 22 de outubro de 2019

RIO GRANDE: INDUSTRIALIZAÇÃO E A PRESENÇA FEMININA


Depósito da Swift. 
Mulheres no setor de funilaria da Swift. 


Na República Velha (1889-1930), Rio Grande teve um papel importante nos quadros da industrialização gaúcha. Localidade que sediou a primeira grande indústria do Rio Grande do Sul, a Rheingantz, e manteve um patamar elevado de empregos em suas fábricas têxtil, de conservas alimentícias, carne frigorificada entre outras. A presença feminina neste proletariado é um item relevante num período conservador em que o espaço da mulher é o da casa e não o da rua. Neste sentido, o espaço aberto às mulheres nas atividades industriais antecipou em quase um século o quadro atual em que as mulheres dividem o mercado de trabalho com os homens. Foi pesquisado o ano de 1918 como referencial para o levantamento dos dados a seguir.

 O MUNDO DO TRABALHO
O ano de 1918 foi marcado por movimento grevista que frequentemente buscava melhores condições de trabalho, de salário ou repúdio as atitudes arbitrárias de mestres. Em junho deste ano ocorre uma greve no Frigorífico Swift. Nos primeiros dias de outubro inicia uma greve na Companhia Francesa entre trabalhadores de carga e descarga de armazéns. A participação ocorreu com trabalhadores do setor de serviços, operários de construção civil de várias obras, operários de estaleiros, estivadores, funcionários ligados ao fornecimento de energia elétrica, carroceiros e operários navais num total de 1.100 trabalhadores. “A repressão foi violenta, com as sedes de entidades invadidas ou sendo vigiadas pela Brigada, indústrias trabalhando com garantia da polícia, bem como patrulhas policiais no porto e nos armazéns, além de intensa campanha contra os operários e suas idéias, ditas subversivas”.[1] A maior parte do operariado industrial estava concentrada em algumas empresas de grande e médio porte, apesar de existir dezenas de outras de pequeno porte que empregavam entre 40 e somente três operários. Estavam instaladas na cidade fábricas de tecidos, conservas alimentícias e biscoitos, charutos e fumos, calçados e alpargatas, cerveja e gasosa, frigorífico, além de inúmeros estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços. Na tabela abaixo é possível observar as maiores empresas do período:

Estatística das fábricas existentes no município em março de 1918*

Nome da Fábrica
Localização
Produtos
Pessoal empregado
Produção Anual
Mercado
Companhia União Fabril
(sucessora da Rheingantz)
Rua Rheingantz
Algodões, lãs, cobertores e ponchos
983
Lã 4.000kg diariamente; algodão 336.000kg anualmente
Brasil e Montevidéu
Companhia de Tecelagem Ítalo-Brasileira
Senador Correa n°1
Tecidos de algodão branco, tinto e cru
600
2.500.000 m por ano
Brasil
Leal Santos & C.
Ruas Gen. Portinho n°1 e Aquidaban n°44
Biscoitos e conservas
300
1.500.000 latas de conservas, 300.000kg de biscoitos
RS, Norte do Brasil e Inglaterra (carnes)
Charutos Poock
Senador Correa n°51
Charutos finos e entrefinos
150
5.000.000 charutos por ano
Brasil, Argentina, Uruguai e Chile
Llopart, Mata & Cia
Boulevard 14 de Julho
Alpargatas e calçados
150
300.000 pares
RS e outros estados brasileiros
Companhia Swift
Porto Novo
Carnes e conservas
2.000
Somente entrou em funcionamento em setembro deste ano
Europa e Estados Unidos
Sociedade Comercial e Industrial Rio-Grandense
Boulevard 14 de Julho
Conservas
130
600.000 kg
Brasil e Europa

Para um período tão recuado no tempo em que o espaço da rua no Brasil ainda é majoritário para os homens, em Rio Grande enquanto cidade em expansão industrial, constata-se uma significativa presença do gênero feminino na classe operária. A indústria de tecelagem é o grande fator desta significativa participação. Os dados para o ano de 1919 trazem os seguintes indicadores: na Companhia União Fabril havia 1.024 operários sendo 370 homens e 71 meninos (idade entre 12 a 70 anos) e 444 mulheres e 139 meninas com idade entre 12 a 60 anos; Fábrica de Tecelagem Ítalo-Brasileira com 600 operários sendo 150 homens (entre 20 a 50 anos) e 450 mulheres entre 15 a 40 anos (salários diários em média dos homens 6$500 e das mulheres 5$000); Companhia Swift do Brasil com 944 operários sendo 896 homens (27 anos em média) e 48 mulheres (22 anos em média); Leal Santos & C. havia 300 operários sendo 200 homens (de 20 a 40 anos) e 100 mulheres (de 18 a 30 anos) com salários diários médios para homens de 6$000 e para mulheres 1$400; Companhia de Charutos Poock empregando 200 operários sendo 60 homens e 140 mulheres com salários diários entre 3$000 e 15$000; Llopart & C. empregando 120 operários sendo 65 homens (entre 12 a 50 anos) e 55 mulheres (entre 12 a 50 anos).
         Os dados esclarecem a representativa presença feminina no operariado local, o salário inferior aos homens por elas recebido e também a presença sistemática de meninos e meninas a partir dos 12 anos de idade nas atividades industriais. Nas fotografias tiradas em Rio Grande entre 1919-1920, se observa operárias da Companhia Swift nos setores de empacotamento e de funilaria. 


[1] LONER, Beatriz Ana. O movimento operário na cidade de Rio Grande na República Velha. In: ALVES, Francisco das Neves (Org.). O Mundo do Trabalho na Cidade do Rio Grande. Rio Grande: FURG, 2001, p. 37.
* Outras fábricas são citadas com um número inferior a cem trabalhadores. São fábricas de caixas de madeira, de sabão, de massas, de cervejas e gasosas, bebidas e vinagre, vassouras, fumo e café, licores, louças de barro, botões e tijoletas. In: Relatório do capitão dr. Alfredo Soares Nascimento. Rio Grande: Oficinas do Rio Grande, 1918.

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