Na fotografia, o monumento já está instalado para a inauguração. Acervo: Papareia. |
Conforme
Juarez Fuão (O Monumento-Túmulo a Bento Gonçalves da Silva. In: ALVES &
FUÃO. Estatuária na cidade do Rio Grande nos primórdios da República Velha. Rio
Grande: FURG, 2005), a idéia da construção de um monumento em homenagem a Bento
Gonçalves da Silva foi prevista no art. 8º das disposições transitórias da
Constituição do Rio Grande do Sul (1891).
Fator que
mobilizaria a cidade do Rio Grande para sediar o monumento ocorreu a partir de agosto
de 1900, quando chegam os restos mortais de Bento Gonçalves da Silva a Rio
Grande, os quais foram doados pelo filho, Coronel Joaquim Gonçalves da Silva. O
coronel Ignácio Xavier Azambuja tornou-se o responsável pela guarda até a
remoção para o prédio da Intendência Municipal em setembro de 1900. Os despojos
foram colocados em uma urna de mármore com a inscrição: ‘Aos heróis de 1835 o
Rio Grande agradecido’. Ficaram no salão nobre da Intendência para visitação.
A
República no Brasil e no Rio Grande do Sul ainda estava em fase de afirmação e
a Revolução Farroupilha é ressaltada enquanto um projeto republicano, mesmo que
prematuro pois o Brasil continuou monarquista após 1845, daí o destaque ao
General Bento Gonçalves como o nome máximo da República Rio-Grandense. Parte
das autoridades políticas da cidade do Rio Grande eram ligadas ao Apostolado
Positivista associando o herói Bento Gonçalves com o projeto da República. Junto aos despojos ficou um busto de Benjamin
Constant, personagem venerado pelos positivistas como um dos fundadores da
República no Brasil. A trindade cívica era composta por Tiradentes, mártir da
Inconfidência Mineira, José Bonifácio como patriarca da Independência e
Benjamin Constant, como referencial no pensamento republicano. Bento Gonçalves
foi representado pela égide do militarismo, pela luta em prol do sentimento de
liberdade republicana, estando no panteão dos grandes heróis.
O
historiador Alfredo Ferreira Rodrigues já vinha resgatando a Revolução
Farroupilha enfatizando que a memória da ‘geração de 35’ estava sendo perdida com o
falecimento destas pessoas sendo necessário preservar a documentação, publicar
sobre o tema, manter para as novas gerações a memória daqueles acontecimentos
que teriam formado o homem sul-rio-grandense. Daí todo o esforço de Alfredo
Ferreira Rodrigues ao edificar o monumento nesta cidade. O monumento
representaria um combate ao esquecimento e a preservação daquela memória
farroupilha.
Ampla
campanha de subscrições para arrecadar fundos para a construção foi executada
no Rio Grande do Sul, recebendo a Comissão responsável valores consideráveis na
cidade e em outras localidades da zona da campanha que tinham um vínculo de
identidade com a epopéia farroupilha como Bagé, Jaguarão, Alegrete e outras.
No final do
ano de 1903 a
Comissão responsável pela edificação do monumento precisou escolher o escultor
da obra. Foi indicado o escultor português Teixeira Lopes numa ‘comunhão entre
a alma portuguesa e o patriotismo brasileiro’ (Echo do Sul, 19 de março de 1904).
Rodrigues,
fascinado pela cultura e arte européia, será o maior responsável pela escolha
que sua importância na Comissão. A firma da cidade do Porto Cardoso, Moreira
& Cia representou a Comissão em Portugal. O contrato com o escultor foi assinado
em 10 de maio de 1904. A
escolha do local a ser instalado o monumento foi fator de severa polêmica.
Rodrigues foi o iniciador do projeto de edificação do monumento defendia a
Praça General Telles (atual Xavier Ferreira). Já o coronel Ignácio Xavier de
Azambuja que se notabilizou por adquirir os restos mortais e possuir laços
familiares com Bento Gonçalves, defendeu a Praça Tamandaré. Uma representação
popular endereçada a Intendência Municipal defendia a Praça Tamandaré. Nestas
discussões propunha-se retirar a Estátua da Liberdade e o chafariz da Praça
General Telles para instalação do monumento. Alfredo Ferreira Rodrigues em
agosto de 1904 afastou-se da Comissão descontente por ser voto vencido na
escolha do local. A Praça Tamandaré vivia um dos seus melhores momentos.
“Inquestionavelmente um dos pontos mais aprazíveis do Rio Grande é a vasta e
belíssima praça Tamandaré, com o seu copado arvoredo, com o seu lago a colear
de extremo a extremo, com a profusão de flores que balsamizam a atmosfera;
fartamente iluminada à noite; cheia de bancos e com outros poderosos agentes
para a comodidade pública. Ora, sendo assim, porque nossas gentis patrícias e
os que fogem à canícula, não procuram aquele logradouro, preferindo a General
Telles, cujo passeio é acanhado para conter todos os que, aos domingos, e
tradicionalmente, andam naquele vai-vem interminável? Com a farta iluminação,
agora dotada à praça Tamandaré, já não tem mais razão de ser o abandono em que
a deixa, notadamente à noite, o nosso mundo chic (...) Corre mundo o ditado de
que o amor velho não deve ser trocado pelo novo; mas o certo é que a Tamandaré
é, hoje, o ponto mais próximo para passeio de exmas. Famílias. Aproveitando
este, teremos conseguido que a praça Tamandaré receba grande trânsito,
tornando-se assim o ponto verdadeiramente chic (Echo do Sul, 29 de dezembro de 1908).
A
Praça General Telles ainda se constituía no espaço elitizado e tradicional para
os passeios das famílias de posição social mais elevada. A Praça Tamandaré
ocupava uma região menos nobre, não estando diretamente ligada à tradição
portuária da Praça General Telles onde os principais comerciantes tinham suas
casas comerciais e residências. Porém, o Intendente Conrado Miller dos Campos,
em 28 de julho de 1902, também defendeu a Tamandaré: ‘Dentre todas as maiores
cidades de nosso Estado de há muito que sobressai a do Rio Grande como aquela
onde existe o melhor jardim público, mesmo quanto ao esmero com que são nele
tratadas as mais belas plantas de adorno. Essa vantagem completou-se agora pelo
desenvolvimento que nos últimos tempos tem adquirido a Praça Tamandaré, a maior
de quantas conhecemos ajardinadas em todo o Estado. Isso, porém, bem pode ser
compensado pela satisfação que devemos ter, como primeiro porto deste Estado,
em apresentar ao viajante que aqui aporta as melhores impressões mediante as
quais bem possa julgar do grau de desenvolvimento dos centros mais populosos e
avançados’. Foi necessário retirar o chafariz do local em que estava para novo
espaço na Praça Tamandaré: “Tendo sido escolhido pela comissão glorificadora da
memória do legendário General Bento Gonçalves da Silva, o local na Praça
Tamandaré onde existia um chafariz, para ali ser levantado o monumento em cuja
base serão depositados os preciosos despojos mortais de tão eminente cidadão,
realizaram-se, no dia 20 de setembro, as cerimônias de assentamento da pedra
fundamental com a maior solenidade e brilhantismo e a qual assistiram as
autoridades civis e militares, corpo consular, chefes das diversas repartições
e a população em geral. (...) Na pequena ilha que existe no centro do lago da
Praça Tamandaré e fronteira ao edifício da Beneficência Portuguesa está sendo
colocado o chafariz” (Relatório apresentado ao Intendente Municipal, 10 de
julho de 1902).
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