Cartão-postal da Praça Tamandaré por volta de 1910. Em primeiro plano a Vênus ao Banho. Acervo: Walter Albrecht. |
Os chafarizes franceses instalados no Brasil a partir da segunda metade do século XIX, transcenderam a sua funcionalidade inicial de serem fontes de abastecimento de água. Por sua beleza estética e situarem-se em espaços públicos, -as praças, que eram valorizadas enquanto espaço recreativo das famílias-, os chafarizes contribuíam ou muitas vezes foram a maior atração, no embelezamento da paisagem urbana.
Em
região próxima a Paris, no Departamento de Haute-Marne, estabeleceram-se no
século 19, destacadas fundições artísticas: a Val d’Osne, a Capitain-Gény, a
Dommartin e a Durenne. A fundição artística na França remonta a década de 1830
produzindo além dos chafarizes, estátuas, lamparinas, colunas, fontes e outros
ornamentos.
A
divulgação desta arte em ferro assumiu maiores proporções nas Exposições
Universais, que desde o ano de 1851 buscavam difundir novas tecnologias, onde
administradores e visitantes conheciam os novos modelos a serem encomendados a
partir dos catálogos disponíveis. A arte em ferro assume o caráter de uma
indústria que se difunde pelo planeta e passa a ser orgulhosamente ostentada
nos espaços públicos. Este encontro com a arte ao ar livre, tem o sentido para
os países adquirentes, de estar em sintonia com os padrões estéticos europeus e
seus projetos de civilidade.
Além
da Europa, países como o Brasil, Estados Unidos, México, Venezuela, Argentina,
Chile e Canadá, adquiriram estas peças a serem colocadas em praças ou na
residência de particulares. Somente para o Rio de Janeiro, foram importados mais
de 200 chafarizes e estátuas para adornarem praças, parques, jardins...
As
novas técnicas de modelagem do ferro e a capacidade de produção em larga
escala, especialmente, em relação às ferrovias, permite refletir na sua relação
direta com o desenvolvimento da Revolução Industrial no século 19. A arte em ferro foi
adaptada a um mercado consumidor em expansão possibilitando que milhares de
pessoas participassem das várias etapas que iam da idealização, produção,
divulgação e venda destas inúmeras peças fundadas no ecletismo.
José
Francisco Alves, é um autor que se especializou na pesquisa sobre a arte em
espaços públicos do Rio Grande do Sul. Publicou recentemente Fontes d’Art no Rio Grande do Sul pela
editora Artfólio. Para este autor as fontes de arte ou fontes d’art eram peças artísticas e ornamentais que tinham o
caráter utilitário de serem usadas como chafarizes, bebedouros etc. Apesar da
Inglaterra e Escócia terem fundições desta modalidade artística, as fundições
da região próxima a Paris de Champagne-Ardenne (Departamento de Haute-Marne)
tinham um mercado latino-americano que ambicionava os padrões estéticos franceses.
O Rio de Janeiro foi no Brasil o maior mercado para estas peças. O Chafariz
Monroe da fundição Val d’Osne, localizado na Cinelândia, é considerado como um
dos mais bonitos do mundo.
Os
chafarizes vindos para o Rio Grande do Sul foram produzidos pela Fundição
Antonie Durrene. A cidade pioneira no recebimento foi Porto Alegre que chegou a
contar com sete chafarizes. O primeiro foi instalado na Praça da Alfândega e
inaugurado por D. Pedro II em outubro de 1865. Seguiram-se outros seis
chafarizes, totalizando sete. Destes chafarizes das décadas de 1860-70, atualmente
só restou o Chafariz Imperial que foi importado em 1866 da Fundição Durenne,
estando localizado no Parque Farroupilha. José Francisco Alves acredita que
administrações municipais os venderam como ferro-velho a mais de cem anos
atrás. A quebra das empresas que os utilizavam para fornecer água potável e o
sucateamento do material pode ter motivado esta atitude. Porém, o assunto não
está esclarecido na documentação: como seis fontes de arte desapareceram sem
maiores informações?
ARTE FRANCESA EM RIO
GRANDE
Da arte em ferro colocadas em espaços
públicos e elaboradas em fundições francesas, cinco peças podem ser destacadas:
a Vênus e os quatro chafarizes.
Muito já se
especulou sobre a Vênus da Praça
Tamandaré. O autor contribuiu com o esclarecimento da procedência desta peça: “Na
Praça Tamandaré, temos a reprodução em ferro, produto das fundições Val D’osne,
de um exemplar bem representativo da escultura francesa do séc. XVIII, cujo
original em mármore pertence ao acervo do Museu do Louvre: a Banhista, também
conhecida como Vênus ou Vênus ao Banho. Trata-se de uma célebre
escultura de Christophe-Gabriel Allegrain (Paris, 1710-1795), exibida no Salão
de Paris de 1767. Tem-se que a obra original foi a que impulsionou a carreira
de Allegrain e encantou de forma extrema a ninguém menos do que o nascido no
Departamento do Haute Marne, Denis Diderot (1713-1784), o qual teria se
pronunciado ao vê-la: ‘Linda, linda, figura sublime; até mesmo a mais linda, eles
dizem, a mais linda figura de uma mulher que os modernos criaram’. Muito
provavelmente, esta cópia em ferro fundido da escultura foi comprada para a
Cidade do Rio Grande em fins do séc. XIX ou princípios do séc. XX com o
objetivo de embelezar a praça”. Contribuindo com as informações do competente
pesquisador, no ano de 1888 a
Vênus ao Banho (altura de 1,65m e peso de 340kg) estava instalada na atual
Praça Julio de Castilhos, local que havia uma fonte de captação de água. Em
algum período posterior, possivelmente primeira década do século XX, foi
transferida para a ilha onde está localizada na Praça Tamandaré. No ano de 1888, a nudez da estátua,
era motivo de comentários irreverentes em jornal da cidade.
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