Porto do Rio Grande em 1908

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terça-feira, 22 de outubro de 2019

O NOTICIADOR E A DÉCADA DE 1830

Fotografia da Rua Marechal Floriano em 1865. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense.


Poucas são as notícias da década da primeira metade da década de 1830 na Vila do Rio Grande de São Pedro. O primeiro jornal a registrar acontecimentos diariamente vividos pela população foi o jornal O Noticiador, que teve o seu primeiro número lançado em 1832. Francisco Xavier Ferreira e o padre Bernardo Viegas estiveram diretamente ligados a este periódico de cunho liberal-radical. Pagaram com suas vidas pelas idéias defendidas num dos períodos mais conturbados da história brasileira: o período Regencial.
         Algumas notícias apresentadas nos permitem um olhar sobre o que ocorria na então Vila do Rio Grande de São Pedro que a partir de junho de 1835 passaria a denominar-se cidade do Rio Grande. Podemos constatar que algumas novidades tiveram grande importância por décadas como o Teatro Sete de Setembro que estava surgindo e que importantes mudanças ocorriam na Praticagem da Barra que trazia o declínio a um dos personagens fundamentais nas primeiras décadas do século 19 - Francisco Marques Lisboa. O jornal registrou o abandono de peças de artilharia nas trincheiras evidenciando a sua existência desde a década de 1820, e demarcando a cidade que vive dentro dos muros e a cidade extramuros. Neste período está surgindo a Sociedade de Beneficência e a inauguração de um hospital, entrando em cena até o presente a Santa Casa de Misericórdia. Os problemas de navegação na Barra do Rio Grande e o medo dos ventos de um forte temporal soterrarem a Vila do Rio Grande também ficou registrado nas páginas do O Noticiador.    

O crescimento da Vila do Rio Grande: O Noticiador informava com orgulho que “a Vila do Rio Grande já contava com mais de seiscentos fogos” [casas] (24 de fevereiro de 1832).  
        Praticagem da Barra: Tendo caído o monopólio de Praticagem da Barra, de Francisco Marques Lisboa, contra o qual havia grandes queixas, de 1º de dezembro de 1834 em diante, o serviço passou a ser feito livremente. Os antigos práticos José da Rosa Pereira e Manuel Joaquim da Rosa fizeram uma sociedade, propondo-se a dirigir as embarcações tanto na entrada como na saída, para o que dispunham de uma catraia e lancha e outras pequenas embarcações para levarem pratico a bordo de qualquer navio. O preço da praticagem continuava o mesmo de 20$000 por cada embarcação” (21 de novembro de 1834).
Indenização ao patrão-mor: “Por decreto de 24 de outubro de 1832, foi declarada livre a praticagem da Barra do Rio Grande, devendo ser o prático-mor indenizado das propriedades que tinha naquele lugar, necessárias para a segurança e comodidade do comércio” (22 de novembro de 1832).
A Barra: “Acha-se na Barra para seguirem a diversos portos 20 embarcações, algumas há mais de mês; a razão, segundo fomos informados, parece ser a falta de água para saídas, ao mesmo tempo em que as entradas tem sido mais felizes” (19 de fevereiro de 1834).
Próprios Nacionais em Abandono: O jornal afirma que existiam nas trincheiras, enterradas na areia, muitas peças de artilharia, rodízios e obuses, algumas de bronze; que essas peças tinham sido colocadas em diversos pontos de uma irrisória trincheira que custara quarenta contos; que o portão das trincheiras e a Casa da Guarda Militar do Moinho de Vento [como se chamava a Aquidaban] estavam caindo em ruínas, que já lhe tinham roubado portas e janelas e estava desaparecendo a telha; que das casas que tinham servido de quartéis e armazéns de depósitos só restavam os míseros restos do traquete roto; que no centro da vila ainda existia um horrendo calabouço, no qual jazeram enterradas muitas vítimas do despotismo e da prepotência dos pachás comandantes da vila até 1828; que seria melhor reparar este calabouço, abrindo-lhe janelas, para servir de cadeia, visto que a da vila estava caindo aos pedaços, dando-se seguidamente arrombamentos noturnos” (2 de agosto de 1832).
Teatro: Em 7 de setembro de 1832 foi inaugurado o novo Teatro Sete de Setembro, sendo representada ‘ a insigne peça de Antonio Xavier de Azevedo’, ‘o bom amigo’. Ante de começar o espetáculo, recitou um elogio Carlos Antonio da Silva Soares. Terminou o divertimento com uma ‘jovial e graciosa pantomima e com a farsa intitulada ‘O Casamento por gazeta’. Em tudo isto fez sentir a Companhia, com bastante espírito e jocosidade, o engraçado do enredo e a boa execução dos autores” (10 de setembro de 1832).
Grande Temporal. “No dia 2 do corrente, pelas 4 e meia da tarde, tendo precedido um calor excessivo, ausência de sol, ar sombrio e vento brando do noroeste, repentinamente se levantou uma ventania tão forte que, se durasse mais tempo, teria esta vila de ser destruída na maior parte de seus edifícios, ou de todo submergida. Aquela coluna de vento julgamos que subsistiu 5 minutos, e a areia que circunda a vila por uma parte, voou por toda ela de tal modo que nuvens de semelhante terra movediça a circularam a uma distância incrível que parecia noite. De todas as casas , altas e baixas, destruiu mais ou menos os telhados e lançou por terra grande número de muros, algumas de parede dobrada feita a cal, arrancou arvoredos,  quebrou vidraças grande parte das telhas arremessadas do vento sobre as que estavam fronteiras, derrubou algumas pequenas casas, arremessou ao mar próximo e cobriu de areia grande quantidade de roupa que estava estendida no lugar onde se costuma lavar, e só neste genro causou considerável prejuízo. No mar, dizem que se viraram algumas pequenas embarcações, que morreram algumas pessoas, o que ainda não está bem averiguado. Abrandou muito, e com a mesma rapidez o vento. Seguiu-se uma grossa chuva de grandes pedras, algumas de peso de uma onça, que também concorreu para a quebra das vidraças, e passando algum espaço cessou, continuando toda a noite a chuva ordinária e vento” (7 de outubro de 1833).
A Sociedade de Beneficência: “Em 20 de novembro de 1831 foi instalada no Rio Grande a Sociedade de Beneficência, destinada a melhorar a condição da classe indigente e desvalida. Foram seus iniciadores setenta e cinco dos mais distintos cidadãos da vila. Francisco Xavier Ferreira, presidente; padre Bernardo José Viegas, secretário; Isabel Eufrásia de Oliveira, Anna Joaquina Afonso Braga, Fernandes Duarte, Francisco Inácio da Silveira, José Maria de Sá, Custódio José Antunes Guimarães, João da Costa Goulart e Vicente Manoel Espíndola” (3 de janeiro de 1832).
A inauguração do hospital: “Os honrados habitantes desta vila e seu termo, que sempre se distinguiram em dons nacionais e que sempre celebraram as suas festividades patrióticas com grandeza e profusão; os briosos rio-grandenses que formaram uma sociedade e subscreveram voluntariamente para a ereção e sustentação de um suntuoso teatro, muito próximo a concluir-se; o interessante Corpo de Comércio que instituiu uma associação por empresas para a difícil abertura de um canal, cujos resultados serão da maior utilidade para esta província e de considerável aumento para esta vila; não podiam deixar de correr com emulação a exarar seus nomes nesta prestante sociedade. Discurso de Francisco Xavier Ferreira no dia da inauguração do novo hospital” [o atual da Santa Casa teve a pedra fundamental colocada em 1850] (16 de julho de 1832).

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