Águas invadem a rua Riachuelo na esquina com a Barroso. Acervo: Relatório da Enchente de 1941 (Carlos Santos). |
As águas faziam movimento de baixa trazendo
esperança que logo era frustrada: “Ontem (15), as primeiras horas da manhã, as
águas baixaram consideravelmente notando-se no cais no Porto Velho quase que a
altura normal do mar. Às 10 horas, porém, e de forma brusca, as águas se
elevaram novamente e atingiram nível dos dias anteriores, notando-se, à noite,
ligeiro declínio das águas. Esse fenômeno deve-se a influência lunar sobre os
mares (O Tempo, 16 de maio de 1941).
No dia 17 as águas apresentaram uma acentuada
elevação, ocasionando a inundação de mais casas. Na madrugada deste dia as águas
atingiram o nível máximo até então alcançado junto à área central. Porém, o
ápice ainda estava por vir! No dia 19, sob ação do vento nordeste, às águas
atingiram a altura máxima invadindo ainda mais residências, aumentando os
flagelados e paralisando grande parte do tráfego de bondes. Até os bondes da
linha Silva Paes pararam pois a esquina com as ruas Barroso e Pedro II estava
alagada. Porém, para alívio da população, a elevação das águas começaria uma
rápida redução nas horas seguintes. No dia 20, o processo desencadeado no dia 4
de maio, entrava em declínio para euforia expressa no jornal O Tempo: “As águas baixaram. Esse foi o
grato comentário de toda a gente, durante o dia de ontem (...) grande parte da
cidade até anteontem coberta pelas águas, oferece trânsito a pé enxuto. A linha
de bonde Circular a vários dias modificada foi ontem normalizada em virtude da
rua Riachuelo ter ficado perfeitamente transitável”.
Foram recolhidas aos abrigos de emergência
3.905 pessoas. Um número ignorado recolheu-se a casa de parentes e amigos, mas
pela ampla região abrangida pela inundação pode ter sido considerável. Além das
perdas materiais em nível das residências, as perdas em maquinários, estoques,
matérias-primas e estruturas físicas das empresas foi muito elevada. O período
de desativação das atividades acarretou em grandes prejuízos pela não produção
e até perda de mercados. Trabalhadores sazonais sem trabalhar não tinham renda.
Assim como os prejuízos aos agricultores, a maioria voltados ao cultivo da
cebola, quase sempre foi total nas áreas abrangidas pela enchente. O número
daqueles que abandonaram as atividades agrícolas nas ilhas é desconhecido mas
certamente foi relevante, pelos grandes prejuízos sofridos nas chácaras,
ampliando o êxodo rural em curso desde as primeiras décadas do século 20.
Na Torotama, onde moravam 1.500 pessoas, uma
lâmina de até 1 metro
de água permaneceu por 34 dias, provocando o abandono temporário da localidade
e a morte de 2.000 cabeças de gado. Na Ilha dos Marinheiros, onde viviam 2.400
pessoas em 300 chácaras, o chamado pela imprensa de “celeiro do Rio Grande”, os
prejuízos com a enchente fizeram com que muitos moradores desejassem “abandonar
aquelas plagas”. (Conforme o Relatório –
Extensão, repercussão e danos causados pela Grande Enchente 1941. Dirigido
ao Prefeito Municipal do Rio Grande Dr. Roque Aíta. Rio Grande: julho de 1941).
Os prejuízos nas ilhas, com o plantio da cebola, vinhedos e
hortifrutigranjeiros foi total. Os pescadores também tiveram grandes perdas de
redes, barcos e utensílios, além da inviabilidade ou redução do pescado nas
semanas seguintes a enchente.
O apoio dado aos desabrigados foi fundamental
evitando epidemias decorrentes deste tipo de evento, inclusive de leptospirose,
que em Porto Alegre
teve alguns casos. Quase 16.000 vacinas contra tifo foram aplicadas, além de
vacinação contra difteria e desinteria, realizada pelo Centro de Saúde. A
Comissão Central de Auxílio aos Flagelados coordenou os esforços de apoio a
população desabrigada com alimentação e estadia. Tiveram destacada atuação o
Corpo de Bombeiros, o Exército, a Brigada Militar, a Capitania dos Portos, a
Liga Feminina da Ação Católica, a Sociedade União Operária e vários segmentos
da comunidade. As refeições eram distribuídas em quatro locais: Sociedade União
Operária, Escola Agnella Nascimento, Vila Junção e Parque.
O governo municipal, tabelou o preço do arroz
e da batata, incentivando os consumidores a denunciarem abusos. Em Porto Alegre ,
inúmeros comerciantes foram para a cadeia por abusarem dos preços.
A vida cultural do cinema e teatro não parou
durante a enchente. Vivia-se na Era do Rádio e não na Era da TV, o cinema era
ainda a grande indústria cultural no campo visual, tendo grande freqüência de
público. Diferente de Porto Alegre, onde os cinemas na área da “Pequena
Broadway” ficaram alagados, em
Rio Grande continuaram funcionando assim como as
apresentações teatrais. Os cinemas Carlos Gomes, Avenida e Guarani mantiveram
seções. O Teatro Politheama apresentava o espetáculo La
Cumparsita (Companhia Lison Gaster de Sainetes e
Revistas). Inclusive era divulgado no jornal do dia 28 de maio, uma peça que
estrearia no dia 7 de junho no Teatro Sete de Setembro: “Chuvas de Verão”!
Depois das devastadoras “chuvas de outono”, será que o público teve inspiração
para assistir “Chuvas de Verão”?
O
texto foi adaptado do livro de minha autoria Águas de Maio: a enchente de 1941 em Rio Grande , o qual está disponível aqui no blog.
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