Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

sábado, 19 de outubro de 2019

JUVENAL MILLER E A REPÚBLICA

Fotografia de Juvenal Miller. Acervo: Papareia.


A partir de artigo do historiador Paulo Ricardo Pezat (Juvenal Miller e a difusão do Positivismo nos Primórdios da República In: ALVES, Francisco das Neves (Org.) Para uma História Multidisciplinar do Rio Grande. Rio Grande: FURG, 1999) é que será contada a trajetória republicana e positivista de Juvenal Miller, um dos personagens mais destacados da história do município do Rio Grande durante os primeiros tempos do regime republicano.
         Juvenal Octaviano Miller nasceu na cidade do Rio Grande em 13 de outubro de 1866. Antes de completar 15 anos, Juvenal Miller já havia se decidido a seguir a carreira militar, matriculando-se na Escola Militar de Porto Alegre e seguindo posteriormente para o Rio de Janeiro, onde ingressou na Escola de Cadetes da Corte. No princípio de 1882 foi admitido no curso de Engenharia Militar na capital do Império, datando desta época seu contato sistemático com o pensamento de Auguste Comte, através de Benjamin Constant, de quem foi aluno. Em abril de 1887, nas vésperas de concluir o curso, foi suspenso em virtude de questões políticas: havia remetido um telegrama de apoio a Joaquim Nabuco por ter este protestado contra a intromissão do Imperador no processo eleitoral. Retomando a Porto Alegre, Juvenal Miller fundou com amigos o jornal O Debate, de caráter abolicionista e republicano. Em fins de 1889, com a proclamação da República, retornou ao Rio de Janeiro para prestar os exames finais na Escola Militar. Formado como engenheiro-militar, foi promovido a 2º tenente no final de 1890, passando a servir no 2º Batalhão de Artilharia, na capital federal. Após a conclusão deste curso passou a 1º tenente, sendo destacado, em março de 1892, para servir em Rio Grande.
         Desde então a adesão de Miller ao positivismo já estava consolidada, como demonstra o artigo que publicou no jornal governista Diário do Rio Grande em resposta as críticas ao pensamento de Comte e aos seus adeptos no Rio Grande do Sul feitas em intervenções em debates jornalísticos, Juvenal Miller tomou parte ativa nos combates que marcaram os primeiros anos da República no Rio Grande do Sul. Simpático ao projeto político implementado por Julio de Castilhos através da Constituição sul-rio-grandense de 14 de julho de 1891, que tinha por suporte ideológico o positivismo comtiano, Juvenal Miller participou da defesa de Rio Grande contras as duas tentativas de tomada da cidade por parte das forças federalistas unidas à Revolta da Armada, entre o final de 1893 e o princípio de 1894.
         Apesar desta adesão ao positivismo, Juvenal Miller não integrava o Club Cooperador Positivista Sul-rio-grandense, fundado em Rio Grande no mês de fevereiro de 1891 por um grupo de duas dezenas de simpáticos da Igreja Positivista do Brasil (IPB) e que subsistiu até meados de 1894. De fato, alguns dos integrantes deste clube apoiaram a dissidência republicana liderada por Demétrio Ribeiro, que se uniu às forças do liberal Gaspar Silveira Martins contra o governo castilhista, fazendo com que os diretores daquela instituição se desinteressassem pela sua continuidade.
         Em 1894, quando ainda estava em curso a Revolução Federalista, Miller foi colocado à disposição da Comissão de Linhas Telegráficas do Mato Grosso, onde acumulou o sub-comando da referida comissão com o comando da 2ª Companhia do 1º Batalhão de Engenharia. Por influência de Julio de Castilhos, que desfrutava de amplo prestígio junto à cúpula do Exército, Juvenal Miller conseguiu retornar ao Rio Grande do Sul no final de 1895, sendo destacado para a Escola Militar de Porto Alegre. Nesta época ele já mantinha intensa correspondência com Miguel Lemos e Teixeira Mendes, os apóstolos que dirigiam a IPB, responsável pela propaganda da vertente religiosa do pensamento de Comte no Brasil. A influência que Miller recebeu da Religião da Humanidade, a religião ‘científica e demonstrável’, nas palavras de Comte, fica evidente nos nomes que atribuiu aos filhos de seu casamento com Maria Ignacia Rodrigues Barbosa, ocorrido em 1890: Clotilde, Sofia Maria, Augusto Otávio, Carlos Edmundo, Jorge Floriano, Maria Inês e Branca Eleutéria. Todos estes nomes são originários do Calendário Positivista concebido por Comte ou pertencem aos ‘grandes vultos da Pátria’ cultuados pela IPB. Percebe-se assim que a influência das idéias de Comte penetrava no âmbito da sua vida privada. De outra parte, neste período sua vida profissional já estava intimamente relacionada com a Igreja Positivista do Brasil. Em meados de 1896, Miller e alguns colegas de magistério na Escola Militar de Porto Alegre conceberam a idéia de criar em Porto Alegre uma instituição de ensino superior voltada à formação de engenheiros.
         Em 7 de setembro de 1900, fez um discurso no Teatro São Pedro em Porto Alegre, exaltando a Independência do Brasil e a figura de José Bonifácio. Neste discurso fez uma defesa vigorosa da República e um ataque aos que desejavam um retorno a restauração do Império no Brasil.
         Em 1901, Miller elegeu-se deputado à Assembléia dos Representantes pelo Partido Republicano Rio-grandense, tornando-se deputado federal em 1903, ocasião em que retornou ao Rio de Janeiro e foi obrigado a abandonar o magistério na Escola de Engenharia de Porto Alegre. Em 1905 foi eleito intendente da cidade do Rio Grande, tornando-se uma liderança emergente dentro do PRR. Quando Carlos Barbosa Gonçalves foi eleito presidente do estado, no final de 1907, em substituição a Borges de Medeiros, este indicou Juvenal Miller para ser o vice-presidente. No princípio de 1909, Miller foi reeleito intendente de Rio Grande, acumulando tal função com a vice-presidência do estado. Porém, não exerceu tais mandatos até o final. Doente, seguiu para o Rio de janeiro no final de junho de 1909, em busca de melhores condições de tratamento. Não resistindo, morreu com apenas 42 anos de idade, em 9 de setembro de 1909, sendo sepultado no cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro. Entre os condutores de seu caixão estava Teixeira Mendes, que proferiu um breve discurso na ocasião.
         Apesar da proximidade que manteve com a Igreja Positivista do Brasil, Juvenal Miller jamais ingressou formalmente em seus quadros, pois esta instituição não tolerava que seus integrantes participassem da política partidária. Mesmo assim, exerceu um papel importante na difusão do positivismo no Rio Grande do Sul e na aproximação entre a Igreja Positivista do Brasil e o Partido Republicano Rio-grandense, seja através de seus escritos, seja através de sua ação política.
         Ressalte-se que Juvenal Miller faleceu alguns dias antes da inauguração do monumento-túmulo a Bento Gonçalves da Silva, ocorrido em 20 de setembro de 1909, uma obra que ele deu grande apoio e que representava uma homenagem ao pensamento republicano no Rio Grande do Sul.

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