Porto do Rio Grande em 1908

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quinta-feira, 31 de outubro de 2019

DARWIN E A ÁRVORE DA VIDA - 160 ANOS DA ORIGEM DAS ESPÉCIES

Darwin em pintura de 1830 de G. Richmon.


 Beagle em pintura de 1841, autor Owen Stanley.
 Em 1920, ao escrever sobre o impacto das idéias de Charles Darwin, Sigmund Freud afirmou: "Ao longo do tempo, a humanidade teve de suportar dois grandes golpes em sua autoestima. O primeiro foi constatar que a Terra não é o centro do universo. O segundo ocorreu quando a biologia desmentiu a natureza especial do homem e o relegou à posição de mero descendente do mundo animal".
O naturalista inglês Darwin é um dos cientistas de maior destaque dos dois últimos dois séculos. A biologia e a genética contemporânea fundamenta suas interpretações na teoria da evolução.  Darwin mostrou que todas as espécies descendem de um ancestral comum, uma forma de vida simples e primitiva. Este processo foi batizado de seleção natural, as espécies evoluem ao longo das eras, sofrendo mutações aleatórias que são transmitidas para seus descendentes. Essas mutações podem determinar a permanência da espécie na Terra ou sua extinção – dependendo da capacidade de adaptação ao ambiente. É o que consta no longo estudo publicado em 1859 A Origem das Espécies.
Para Darwin o mundo não foi criado por ninguém nem é imutável; os organismos descendem de um ancestral comum que em última instância é uma bactéria unicelular; as populações vão se diferenciando de geração em geração, até que a espécie não mais pertence ao mesmo galho da árvore da vida; os seres humanos sofrem mutações genéticas e podem passá-las aos seus descendentes; as espécies tendem a se diferenciar, criando novas espécies; homens e macacos descendem de um ancestral comum que viveu milhões de anos atrás e que deu origem as diferentes espécies.
            Darwin pesquisou durante 21 anos para publicar o livro revolucionário. Nasceu na Inglaterra em 1809 e aos 22 anos, embarcou no navio Beagle em 1832 para pesquisar e coletar espécies em quatro continentes, numa viagem de quase 5 anos. Esteve no Brasil, fazendo pesquisas em Fernando de Noronha, Bahia e Rio de Janeiro. Infelizmente não fez escalas no Porto Velho do Rio Grande quando de sua passagem para Montevidéu e Terra do Fogo. Se tivesse visitado a então Vila do Rio Grande de São Pedro, possivelmente, teria deixado escritos de sua impressão. Durante a estadia do naturalista francês Auguste Saint-Hilaire, em 1820, ele deixou a seguinte descrição da entrada da Barra do Rio Grande: “Nada se iguala à tristeza desses lugares. De um lado, o bramir do oceano; e do outro, o rio. O terreno, extremamente plano e quase ao nível do mar, é todo areal esbranquiçado, onde crescem plantas esparsas, especialmente o senecio. As choupanas, mal conservadas, só anunciam miséria: destroços de embarcações semi-enterradas na areia recordam pungentes desgraças e nossa alma se enche, pouco a pouco, de melancolia e terror”.
         Em 1832, quando o Beagle passou ao largo da Barra do Rio Grande rumo ao Prata, o Porto Velho estava dinamizado pela economia do charque e o comércio de exportação, num período de expansão, antes da retração econômica promovida pela Revolução Farroupilha (1835-45) com a desestruturação das atividades pecuário-charqueadoras. Teria visto escravos negros entrando por Rio Grande e em grande parte seguindo para outras regiões da Província do Rio Grande do Sul, o que lhe causaria repugnância como deixou atestado em escritos sobre a escravidão e corrupção no Brasil: “É algo aterrador ouvir os crimes monstruosos que se cometem diariamente e escapam sem punição. Se um escravo mata o seu senhor, depois de ficar confinado algum tempo, ele se torna propriedade do governo. Não importa o tamanho das acusações que possam existir contra um homem de posses, é seguro que em pouco tempo ele estará livre. Todos aqui podem ser subornados”.
Darwin poderia visitar o recentemente fundado jornal O Noticiador, editado por Francisco Xavier Ferreira e pelo padre Bernardo Viegas (que foi assassinado no ano seguinte). Assistiria alguma apresentação no requintado Teatro Sete de Setembro que fora inaugurado naquele ano. Se aqui ficasse hospedado em período de carnaval, teria contato com o entrudo, atividade que ele considerava perigosa e que ele “queria distância” como deixou relatado: “Esse perigo consiste em ser alvejado sem misericórdia por bolas de cera cheias de água e sair encharcado por grandes seringas de lata. Achamos muito difícil manter a nossa dignidade enquanto caminhávamos nas ruas”.  Possivelmente, teria as mesmas queixas de Saint-Hilaire em relação às ruas sem calçamento e as areias que entravam nos olhos e eram consumidas durante as refeições. Se teria despertado interesse botânico e faunístico pelo estuário da Lagoa dos Patos é uma incógnita que jamais saberemos. A recente formação geológica local não traria elementos para reconstituir o elo perdido dos hominídeos, mas a diversidade de aves e peixes poderia ter sido objeto de análise.  
         A expedição do Beagle mudou a compreensão do surgimento e do sentido da vida no planeta Terra. O somatório de informações obtidas nas viagens, com destaque às atividades na Argentina, Chile e Ilhas Galápagos, constituíram uma construção intelectual arrojada que buscou explicar o surgimento e evolução das formas de vida. O evolucionismo biológico fundamentou-se como um paradigma utilizado por diversos campos do conhecimento.

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