Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

domingo, 28 de outubro de 2018

MIRAGUAIA



        A miraguaia ou miragaia (Pogonis cromis; Linnaeus, 1766) é também chamada de burriquete, corvina negra e Black drum consistindo num peixe que deixou um legado de histórias para os pescadores da Barra do Rio Grande mas que atualmente, devido a captura excessiva realizada entre as décadas de 1950-1980 está quase desaparecida do litoral do Rio Grande do Sul. É um peixe de porte avantajado que pode atingir mais de 1,40 metros de comprimento, cerca de 40 kg de peso e pode viver por mais de 40 anos. Conforme o livro “Peixes Estuarinos e Costeiros” de autoria de Luciano Gomes Fischer, Luiz Eduardo Dias Pereira e João Paes Vieira (2. ed. – Rio Grande: Luciano Gomes Fischer, 2011), a miraguaia “ocorre de Massachusetts, EUA, ao longo das Antilhas e norte da América do Sul, até a Argentina. É uma espécie demersal encontrada em águas costeiras. No sul do Brasil ocorre até 40 m de profundidade”. É lembrada por ser um peixe que propicia uma briga demorada exigindo muita energia do pescador que utilizar molinete ou linha de mão. Algumas décadas atrás - comprovado por fotografias tiradas nos Molhes da Barra e no Clube de Regatas Rio Grande-, era um dos peixes mais procurados pelos pescadores e dos mais festejados quando retirado das águas, sendo cortado em postas ou em largos files para salgamento. Em 1885 a miraguaia já constava na lista dos peixes mais valorizados que chegavam ao Mercado Público para venda e exportação, conforme artigo do naturalista alemão Hermann Von Ihering.  
        Vou destacar um documento pouco conhecido (de 1798, final do século XVIII) que já apontava a Miraguaia como uma promissora e lucrativa atividade que era equiparada a pesca do bacalhau. A ocupação sistemática do atual município do Rio Grande só ocorreu cerca de 4 décadas depois da escrita deste documento, mas o potencial pesqueiro já se fazia divulgar em Portugal em relação à Barra do Rio Grande.
         O documento foi escrito por Hipólito José da Costa Pereira (publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: 1858, vol. 21) que foi encarregado pelo Príncipe Regente de Portugal (D. João de Bragança) para viajar a América Setentrional e enviar informações sobre as atividades econômicas realizadas por norte-americanos e ingleses, especialmente as atividades pesqueiras. Ele partiu de Lisboa aos 16 de outubro de 1798 e chegou na Filadélfia após 59 dias de viagem marítima.  
      Pereira deixou documentado um dos mais antigos registros sobre o potencial pesqueiro do litoral de Santa Catarina e junto a Barra do Rio Grande de São Pedro. 
         “Desde que os Holandeses deixaram as suas pescarias pelo risco que os navios estão expostos, de serem tomados pelos Ingleses, os Americanos suprem a Europa com azeite de peixe, espermacete, barba de baleia além da grande quantidade de peixe salgado que exportam para Portugal, Espanha e portos do Mediterrâneo. No artigo das baleias, se nos propusermos estabelecer os mesmos regulamentos e leis que eles têm, indubitável que este extenso ramo de comércio cairá exclusivamente em nossas mãos, por que nós temos sobre eles estas vantagens: 1. maior barateza nas soldadas dos marinheiros por que se achando entre nós bastante oito ou dez mil reis por mês, nos portos da América, precisam pagá-los dezesseis e vinte e quatro mil réis ainda as mais das vezes custa a encontrá-los; 2. Os Americanos tem de fazer sua viagem da América a costa do Brasil, onde fazem principalmente as pescas e depois à volta; a demora, despesa, risco e empate de dinheiro, que ha durante este tempo, é salva para nós, que fazemos pesca ao pé das nossas Costas. 3. Os nossos navios que pescam pelas costas do Brasil tem lá os nossos portos, onde podem facilmente acolher-se para se repararem, ou proverem do que houverem mister; comodidade que falta também aos Americanos, pois precisam estar sobre a vela desde que saem, até que acabam a pescaria. Os Americanos porém estão de tal modo experimentados neste tráfico, que meu plano seria convidar um número de famílias de pescadores na América, das que vivem principalmente em Nantuket, fazê-las estabelecer em dois pontos diferentes no Brasil, adir-lhes marinheiros Portugueses, associar-lhes nos fundos negociantes do país usando depois disto para com os pescadores das mesmas liberalidades e isenções que os Americanos tem; não pode haver a menor dúvida, que em dois anos, não mais, o comércio das baleias estará inteiramente nas mãos do Portugal. Quanto ao peixe salgado ha toda probabilidade, que o bacalhau se encontrará em abundancia nas costas do Sul, de S. Catarina para baixo mas ainda caso não se ache, temos miraguaia, um peixe de arribação de que Rio Grande de S. Pedro, e outros portos imediatos, abundam em tal quantidade, que podem suprir Portugal de peixe salgado, com toda fartura, mais barato do que importam os Ingleses e Americanos. Se V. Ex. supuser que este artigo merece alguma atenção, terei grande satisfação de reduzir ordem as minhas ideias sobre isto, de ter honra de às apresentar a V. Ex. ou a Real Junta do Comércio, ou mesmo de conferir, explanar circunstanciadamente com qualquer pessoa que V. Ex. queira encarregar com execução deste projeto”.


Miraguaia. In: http://ambientes.ambientebrasil.com.br

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