A gripe chegou ao Brasil em setembro de 1918
a bordo do vapor inglês Demerara que atracou nos portos de Recife, Salvador e
Rio de Janeiro (em 14 de setembro). A propagação foi rápida atingindo até a
Amazônia onde fez desaparecer tribos indígenas. Nas primeiras semanas de
outubro, o Rio de Janeiro tornou-se um “vasto hospital”. Desembarcando nos
portos do litoral o vírus chegou até o Sul.
A cidade do Rio Grande no extremo sul do
Brasil é o espaço portuário que deu início ao processo industrial de grande
porte no Rio Grande do Sul. É pelo Porto Velho do Rio Grande que o vírus entrou
no Estado do Rio Grande do Sul e se difundiu pela Lagoa dos Patos, Lagoa Mirim
e rios da Bacia do Atlântico, posteriormente, tendo ampla circulação estadual.
Nas
vésperas da epidemia, em outubro de 1918, o discurso oficial do governo
estadual apresentava o estado sanitário do Rio Grande do Sul como satisfatório
buscando minimizar as precárias condições médico-higienista. Porém, o relatório
do Dr. Euclides de Castro Carvalho da Diretoria de Higiene do RS (1917) registrou:
“...não podemos ocultar que dia a dia aumentam as cifras da letalidade infantil
tanto em Porto Alegre como em outras cidades do Estado. (...) É uma dolorosa
evidência verificarmos que na cidade de Rio Grande o obituário infantil atinge
o máximo limite conhecido em todo o mundo”.
Até completarem dois anos de idade, metade das crianças falecia no
município, evidenciando as precárias condições alimentares, de infraestrutura e
de higiene. Com a gripe desembarcando na
cidade a situação de miséria endêmica assumiria um contorno de extrema
gravidade. E o vírus estava desembarcando no Porto Velho na primeira quinzena
de outubro...
A epidemia fez o seguinte
trajeto para entrar no Rio Grande do Sul. Na manhã do dia 9 de outubro, chegou
ao porto do Rio Grande o vapor Itajubá, da Companhia de Navegação Costeira.
Estavam a bordo 38 tripulantes convalescendo da Espanhola. O Inspetor de Saúde
do porto, Dr. Leonel Gomes Velho, afirmou que a “influenza é de caráter benigno
e não contaminou nenhum passageiro”. No dia 10 de outubro o jornal O Tempo, de Rio Grande noticiou:
“continua interdito em nosso porto o paquete Itajubá (...) O navio foi desinfetado
e os enfermos se acham todos em condições satisfatórias. A remoção destes para
o lazareto não se deu ainda hoje, devendo ser feita amanhã, quando aquele
estabelecimento, que há muito não funciona, ficar de todo preparado para
recebê-los”.
No dia 12 de outubro, o
vapor Itaquera atracou no porto com 32 tripulantes gripados que foram
encaminhados para o Lazareto da cidade. Após sair do Rio de Janeiro, os
primeiros casos começaram a aparecer e os portos do Paraná e Santa Catarina não
aceitaram que ele atracasse. O navio foi desinfetado em Rio Grande e seguiu
para Porto Alegre chegando a 14 de outubro. O vapor Mercedes do Lloyd
Brasileiro chegou a Porto Alegre em 16 de outubro vindo de Rio Grande com sete
tripulantes doentes. O Ministro da Justiça enviou correspondência a Borges de
Medeiros considerando inútil o isolamento de doentes afirmando que se a gripe
surgir no porto do Rio Grande invadiria a cidade como fez no Rio de Janeiro.
Em Rio Grande, passageiros
do paquete Itajubá, vagavam pelas ruas da cidade, pois eram recusados nos
hotéis. O primeiro óbito ocorreu em 14 de outubro. A faixa etária mais atingida
foi de 21 a 30 anos. O maior número de vítimas era operários, comerciários, jornalistas/jornaleiros,
foguistas, militares, agricultores. Comércio e indústria fecharam e até jornais
pararam de circular por falta de pessoal. Os remédios e alimentos subiram
desrespeitando o tabelamento de preços. Se a espanhola foi democrática na virulência
de sua transmissão, às precárias condições alimentares dos trabalhadores de
baixa renda e seus familiares poderia significar uma menor resistência às
patologias que sucediam à gripe. Para estes grupos, diaristas, não trabalhar
também significava falta de renda para aquisição de alimentos ou remédios. A
epidemia declinou em 15 de novembro de 1918 tendo matado mais de 500 pessoas na
cidade do Rio Grande.
Enfermaria no Rio de Janeiro, 1918. Biblioteca Nacional Digital. |
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