Porto do Rio Grande em 1908

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sexta-feira, 18 de maio de 2018

GARIBALDI E DUMAS NA BATALHA DE SÃO JOSÉ DO NORTE

“Na mão de um homem de coragem, qualquer arma serve – uma foice, um mosquete, um machado, ou até um prego na ponta de um pau”. Giuseppe Garibaldi (1807-1882)

GIUSEPPE GARIBALDI

Segundo Hermann Viola, apesar da precariedade dos conhecimentos de Garibaldi sobre estratégia militar, este tinha uma capacidade instintiva de avaliar corretamente uma situação de confronto com o inimigo e de reagir a ela da melhor forma possível. A aura de humildade que o cercava e sua falta de ambições pessoais também contribuiu para seu sucesso. Teria direito a honrarias e recompensas, mas elas não lhe interessavam. Morreu tão pobre e humilde como sempre viveu. Apoiando-se apenas na coragem dos seus homens, sem sequer tentar descobrir as fraquezas do inimigo, Garibaldi recorria com freqüência a ataques frontais e suicidas de pequenos destacamentos pouco armados contra batalhões de soldados de carreira, mais numerosos, bem treinados e portadores de armas modernas e farta munição. Como resultado, perdeu alguns dos seus melhores oficiais e ele próprio poderia ter morrido em combate, caso a providência e a sorte não fossem suas companheiras constantes.
Quaisquer que tenham sido seus erros, porém, não há dúvida de que Garibaldi foi um brilhante guerreiro e um patriota sincero. Seu infatigável e revolucionário espírito de justiça explicam sua preocupação pelas questões sociais até o fim da vida. Opôs-se ativamente contra a pena de morte e apoiou o socialismo. “O futuro da Itália pertence às classes operárias”, declarou pouco antes de morrer.

A BATALHA DE SÃO JOSÉ DO NORTE

       Esta Batalha foi um dos confrontos decisivos da Revolução Farroupilha e representou uma derrota para os revolucionários. A tentativa de tomada de São José do Norte no dia 16 de julho de 1840, um confronto entre 600 imperiais contra 1200 farroupilhas resultou em 72 mortos, 87 feridos e 84 prisioneiros do lado do Império e em 181 mortos, 150 feridos e 18 prisioneiros do lado Farroupilha. Que o combate foi tenaz e encarniçado o mostram as perdas recíprocas, sendo este um dos mais sanguinolentos confrontos desta guerra. Na visão do monarquista Tristão Alencar Araripe o “tempo era frio e tempestuoso, e os assaltantes encobertos pelos cômoros de areia que cercam a vila, puderam aproximar-se sem serem pressentidos pelas sentinelas da guarnição legal. Pela uma hora da madrugada começa o assalto: os rebeldes penetram nas trincheiras e dominam a praça. A guarnição dela, sob o comando do Coronel de legião Antonio Soares de Paiva, pôde ser socorrida por gente da vizinha cidade do Rio Grande, e conseguiu expulsar os rebeldes. O conflito durou nove horas. O socorro foi escasso em conseqüência do temporal, que então agitava às águas, que separam os dois lugares; bastou, porém para animar a guarnição agredida. A resistência das forças legalistas valeu a São José do Norte o título outorgado por D. Pedro II de mui heróica Vila.

 O DIÁRIO 

         Conforme Garibaldi em seu diário redigido por Alexandre Dumas (1802-1870), as forças do Império, a fim de realizarem incursões na campanha, foram forçadas a desguarnecer de infantaria as cidades fortificadas, como é o caso de São José do Norte que se apresentava vulnerável frente a um ataque fulminante. Segundo ele, esta cidade situada na margem setentrional da embocadura da Lagoa dos Patos era uma das chaves da Província, tanto no aspecto político quanto no comercial. Seu controle significaria a conquista de uma saída para o mar num momento difícil para as forças farroupilhas. “Sua tomada, mais do que útil, tornava-se imprescindível”. Na cidade encontravam-se produtos de todo o gênero, necessários à indumentária de combate que era de “qualidade lastimável do lado farroupilha”, além disso, seria o controle do único porto marítimo da Província.
         Porém, a desventura perseguiu a ação militar, a qual foi “conduzida com uma admirável sabedoria e em absoluto segredo, os seus frutos foram inteiramente perdidos por ter-se hesitado a desfechar o golpe final. Uma marcha obstinada de oito dias e de vinte e cinco milhas diárias conduzira-nos até os muros da praça-forte”.
         Conforme Garibaldi tudo aconteceu numa “daquelas noites de inverno, no curso das quais abrigo e fogo são como favores da Providência. Nossos pobres soldados da liberdade, famintos e esfarrapados, com os membros entorpecidos pelo frio, o corpo regélido sob a cordoada de uma terrível tempestade – nossa companheira durante a maior parte do percurso – avançavam silenciosos contra fortes e trincheiras ocupadas por sentinelas. Os cavalos dos chefes foram deixados sob a guarda de um esquadrão de cavalaria comandado pelo coronel Amaral a uma pequena distância das muralhas, e cada homem, reunindo o resto das suas forças, preparou-se para o combate.
O alerta dado por um sentinela serviu como toque de atacar. A resistência das muralhas foi fraca e fugaz, malgrado o fogo arrojado pelos canhões do forte. À uma e meia da madrugada começáramos o assalto e, às duas horas, apossávamo-nos dos redutos imperiais e de três ou quatro fortificações que as guarneciam, todas tomadas pelo assédio das baionetas.
Senhores de todo o baluarte, senhores dos bastiões, consumada a incursão na cidade, parecia impossível que ela nos escapasse. Pois bem! Ainda uma vez, o aparentemente irrealizável cumpria a sua sina. Tendo ganho as ruas no intramuros de São José, nossos soldados presumiram que tudo estava liquidado: a maior parte deles dispersou-se, atraído pelo engodo da pilhagem.
Enquanto isso, refeitos da surpresa, os homens do Império reuniram-se numa zona protegida da cidade. Nós a atacamos. Eles nos rechaçaram. Os chefes procuraram por toda parte os soldados que multiplicariam os ataques, mas a procura foi inútil: quando alguns eram encontrados, via-se que estavam entretidos com os seus espólios, ou bêbados, ou então com os seus fuzis quebrados ou avariados de tanto que haviam violado e rompido as portas daquelas casas.
Quanto ao inimigo, ele não perdia o seu tempo. Vários navios de guerra que se achavam atracados no porto tomaram posição atravessando as suas baterias de tiro pelas ruas onde nos encontrávamos. Enviamos chamados de auxílio a Rio Grande, cidade localizada na margem oposta da embocadura dos Patos. Um único forte, cuja ocupação havíamos negligenciado, servia de refúgio ao inimigo, e o maior de todos, o Forte do Imperador – que tomáramos durante o morticínio de um glorioso assalto -, acabou sendo devastado por uma terrível explosão do paiol, que dizimou um bom número de homens. Em suma, o mais retumbante dos triunfos havia-se transformado, por volta do meio-dia, na mais humilhante das retiradas.
Os bons choravam, irados e desesperados. Diante da nossa situação e face aos esforços que empenháramos o nosso fracasso fora colossal. A partir daquele momento, a nossa infantaria não seria mais que um esqueleto. Quanto à diminuta cavalaria que fizera a expedição, ela empregou-se a proteger a retirada. A divisão retornou a seus aboletamentos de Bela Vista. Eu fiz estação, com a marinha, em São Simão. Toda a minha tropa resumia-se a cerca de quarenta homens entre oficiais e soldados”. 

Garibaldi em Nápoles (1861), Library of Congress.



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