Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

quinta-feira, 17 de maio de 2018

CAFÉ BRASILEIRO

No livro publicado em 1905, O Brasil de Hoje, o Barão Francisco Homem de Melo discute assuntos de cultura e política de seu tempo. Um tema que ele tratou foi sobre o “preconceito” que o café brasileiro sofria na Europa. Isto parece ficção, pois, desde 1840, o café era o principal produto da balança comercial brasileira e foi responsável pela formação de uma sólida aristocracia cafeeira que defendeu a Monarquia, mas abandonou o navio à deriva quando da Proclamação da República (1889). Na República Velha o café continuou a mandar na economia brasileira e propiciar, através dos capitais oriundos da cafeicultura, a supremacia paulista na industrialização brasileira.  
A desvalorização ou até desconhecimento do café brasileiro foi narrado por Homem de Melo: “O certo é que o nosso café continua, em Paris, Londres, Berlim, Roma, Nápoles, a ser exposto à venda, com letreiros bem visíveis que o dão como originário de Moka, Java, Guadalupe, México e até Mont Pellé! Em diversas localidades, constatando a falsa designação dada ao nosso café, a pretexto de comprar, pedíamos nos servissem gênero de procedência brasileira. Ninguém o conhecia, e algum negociante que dele tinha notícia não o vendia no seu estabelecimento, porque não era... bon marché. No mostrador de uma loja de Genebra, vi anunciado à venda Café Santos. Entrei e pedi - café brasileiro. O proprietário da casa respondeu-me que não tinha, nem conhecia essa marca. - Mas, este Café Santos de onde procede? - Ora, da República da Argentina”.
Atualmente, um dos orgulhos dos brasileiros é a qualidade do seu café! Terão fundamento estas afirmações do descrédito do nosso café?
Conforme Eduardo César no artigo “Do Café Rio aos Microlotes Especiais - Uma breve história da qualidade dos grãos brasileiros” (https://coffeeinsight.com.br) a reputação do Brasil como produtor de cafés de baixa qualidade remonta ao século XIX. Para César, “diversos fatores contribuíram para que essa imagem se formasse, e alguns ainda estão presentes na cafeicultura moderna. A fama dos concorrentes como produtores de qualidade também teve origem naquela época. Por volta de 1840, o Brasil já era o maior exportador de café do mundo. Até o final do século sua participação nas exportações globais chegou a 80%. O domínio do mercado cafeeiro pelo nosso país foi, sem dúvidas, um grande feito, mas isso ocorreu por meio da venda de grãos inferiores”. Os cafés eram classificados em Brazils (café amargo ou Café Rio) e milds (suaves). No Brasil não havia colheita seletiva e os grãos eram colhidos e misturados com diferentes tipos de café. “A secagem e o beneficiamento eram muito rudimentares. O clima e a altitude das lavouras brasileiras também contribuíram para a imagem negativa. Logo se percebeu que o café nacional tinha menos corpo e acidez que os de outras regiões”. A produção de café era volumosa, mas não se buscou a produção da cafés superiores visando um mercado mais refinado de paladar.
Não devemos confundir a busca de qualidade diferenciada no mercado internacional com o ato do consumo de café no Brasil e a satisfação em degustar marcas consagradas industrializadas ou torrefações e moagens artesanais que se espalhavam pelas cidades (formando um mercado local): gerações foram marcadas pelo odor emanado de uma xícara de café saboreado em casa ou numa cafeteria lotada de consumidores. Sociabilidades familiares e públicas se constituíram em torno do café...
A busca foi outra: somente nos anos 1990 é que a pesquisa brasileira voltada a cafés de qualidade superior foram sendo implementadas de forma positiva. “Novas práticas e tecnologias foram criadas e disseminadas nas regiões produtoras”. As exportações de cafés diferenciados crescem continuamente e os grãos brasileiros são “sinônimo de qualidade. O país é o principal fornecedor de grandes torrefadoras internacionais, conhecidas por exigirem padrões específicos”.

Mais de um século após as afirmações de Homem de Melo sobre o desconhecimento e preconceito ao café brasileiro (o mesmo café que era consumido acreditando ser de outras procedências...), o nome “Brazil” estampa não apenas sacas (60 kg) mas também as embalagens de edições especiais que são vendidas no planeta. 



Pé-de-café, Marc Ferrez, final do século XIX. 

Pintura de Portinari, café, 1934.

Propaganda de café brasileiro em Portugal.



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