No ano de 1686, Francisco de Brito Peixoto
fundou Laguna (Santa Catarina), posição voltada à defesa e apoio a Colônia do
Santíssimo Sacramento do Rio da Prata. A viagem marítima da Colônia de
Sacramento até o Rio de Janeiro durava cerca de quatro meses, surgindo
entrepostos, como Laguna e posteriormente Rio Grande (1737), encurtar esta
distância até o centro de suprimento, de tropas e de material bélico.
No final de outubro de 1725 João de
Magalhães, genro de Francisco de Brito Peixoto partiu com mais 30 homens da
Vila da Laguna, com o objetivo de edificar uma povoação no canal do Rio Grande
de São Pedro. Em um local situado ao norte do canal fundou a povoação que
serviria de entreposto para controle do gado extraído do Pampa gaúcho-uruguaio
e que ao mesmo tempo, demarcou a primeira ocupação luso-brasileira no Rio
Grande do Sul.
A expedição
Em correspondência datada de 1726, Francisco
de Brito Peixoto relata ao tenente general Davi Marques Pereira, que já estava
na margem norte, das motivações que o levaram a enviar a frota terrestre que
chegou a região em novembro de 1725: “Mandei
no serviço de S. Majestade que Deus guarde, para o Rio Grande de São
Pedro 31 homens à minha custa e por capitão deles o meu genro João de Magalhães
a quem ordenei que chegando à paragem do Rio Grande escolhesse algum lugar que
fosse mais conveniente para formarem as suas casas em forma de povoação e logo
façam canoas de pau, suficientes para serventia de passagens de gado,
encomendando-lhe também aquele zelo e diligência de passarem gado para estas
partes da nossa campanha para a multiplicação, pois é um grande serviço que se
faz a El-Rei Nosso Senhor, enxotando-o para o meio da campanha para o dito gado
tomar posse e hão de encurralar na povoação, e todas as vezes que tiverem
necessidade ou carecerem de alguma coisa me mandará o dito capitão avisar por
algum homem que tem em sua companhia. Também se me oferece dizer a Vossa Mercê
que já desta bando do Rio Grande se acham 800 reses de gado vacum que mandei
buscar das campanhas à minha custa, do tempo do governo do Sr. Francisco de
Távora a esta parte, por entender que nisso fazia serviço a Sua Majestade que
Deus guarde, para a multiplicação na
campanha desta parte, e por não haver nela gado algum e ter capacidade
para nela estarem milhões de gado, e na diligência de conduzir mais estou
sempre. Também digo a Vossa Mercê que tenho adquirido a boa amizade dos índios
Minuanos à custa da minha fazenda por mimos que daqui lhes tenho remetido, e
como já não podia com tanto gasto, pelo estado em que me acho, e ser
conveniente ao real serviço a amizade destes gentios, por estarem às campanhas
francas para delas se tirar quanto gado quiserem, recorri ao Sr. General
mandasse alguns mimos por conta da Fazenda real os quais o dito Sr. mandou, e
eu lhes remeti; e no que respeita ao que ordenei ao cabo que foi não tenho
aviso; e no que respeita ao que diz Vossa Mercê se acham casais ou pessoas que
eu possa nomear e queiram ir para o dito Rio Grande, respondo a Vossa Mercê que
nesta povoação não há gente nenhuma que possa ir, porque aqui não há a
necessária para esta vila, e se daqui se tirar algumas ficará outra vez
deserta; mas o que posso assegurar a Vossa Mercê é que as campanhas do Rio
Grande de São Pedro estão facilitadas. E como tudo o que digo a Vossa Mercê é
verdade, nada mais tenho que informar. Deus guarde a Vossa Mercê por muitos
anos (...)”. Carta de Francisco de Brito Peixoto ao tenente-general Davi
Marques Pereira em 1726. In: MONTEIRO, Jônatas da Costa Rego. A Colônia do
Sacramento. Vol. II, p. 177.
A primeira povoação
Segundo o
historiador Moacyr Domingues, o primeiro desbravador a estabelecer uma ocupação
sistemática do canal do Rio Grande, João de Magalhães, era português do reino tendo casado com uma
filha do Francisco de Brito Peixoto entrando para a História por ter conseguido
estabelecer esta povoação na Barra norte do Rio Grande, ou seja, no atual
município de São José do Norte. Nos escritos deixados por Cristóvão Pereira de
Abreu, as notícias práticas, é feita referência ao padre Diogo Soares, um
jesuíta português, que foi mandado ao Brasil para fazer levantamentos
cartográficos. Conforme Domingues, “este padre passou pela Colônia do
Sacramento em 1730 e o Cristóvão Pereira estava lá. Então, nesta ocasião, o
Cristóvão Pereira deu a primeira notícia prática para o padre. Uma coisa muito
bem escrita, descrevendo a Colônia do Sacramento, a parte do Uruguai etc. (...)
Bom, o interessante é o seguinte: o Cristóvão Pereira escreveu isto aqui em
1738, e ele diz que em frente à cidade de Rio Grande há uma parte alta a que
deram o nome de cidade. Agora eu pergunto aos senhores o seguinte: porque se
daria o nome de cidade se ali não existisse nada? Como geralmente se supõe. Eu
não tenho dúvida, até prova em contrário, que são remanescentes daquela
expedição do João de Magalhães, que ali tiveram que construir curral para o
gado, abrigo, porque eles ficaram lá muito tempo e naturalmente ali outras
pessoas, que a História não registra, porque eram anônimas, mas que ali viveram
e formaram uma meia dúzia de casas, ou seja lá o que for e que, em 1738, o
Cristóvão Pereira diz que deram o nome de cidade. Para dar o nome de cidade me
parece que não há outro motivo, salvo o de ter pessoas que viveram ali antes da
fundação do Rio Grande em 1737. Isto eu acho que é uma novidade e eu lanço
aqui, aos meus confrades, uma espécie de um desafio para que nós possamos
esclarecer esta questão”.
Domingues, prosseguindo em suas observações,
concluiu: “Corroborando isto, que o Cristóvão Pereira escreveu, há uma carta,
um mapa feito pelo Padre Diogo Soares, este um geógrafo, de quem eu falei há
pouco, ele fez várias cartas, uma delas eu tenho, eu trouxe de Portugal a
fotocópia dela. Pega do Guaíba para cima, vamos dizer do Guaíba para o norte.
Mas existe uma outra do trecho anterior que pega do Rio Grande até, mais ou
menos, o Tramandaí. Na obra do nosso saudoso confrade Abeillard Barreto, quando
ele fala no Padre Diogo Soares, o Abeillard Barreto viu esta carta, esta que eu
não tenho, esta da parte do Rio Grande. E o Abeillard Barreto cita a
nomenclatura que aparece naquela carta. E la na carta do Padre Diogo Soares
aparece um lugar assim: cidade, defronte ao Rio Grande. Exatamente isto que o
Cristóvão Pereira escreveu. Então, realmente, quando o Padre Diogo Soares
esteve lá em 1738 dava-se o nome de cidade, até talvez a título jocoso, uma
brincadeira, chamar aquilo de cidade. Então isto vem confirma que, realmente,
antes da fundação do Rio Grande, provavelmente existiu ali, defronte, em São
José do Norte, um agrupamento de casas”. (Moacyr Domingues, O Rio Grande do Sul
antes do Brigadeiro José da Silva Paes-Revista do IHGRS1988, n.133, p.
169-170).
Portanto, antes da ocupação oficial do canal
do Rio Grande nos quadros geopolíticos do Conselho Ultramarino Português
(ocupação militar e povoamento), a partir de 1725, ocorreu à ocupação
luso-brasileira na margem norte do canal nos quadros da economia fundada na
circulação do gado e cujos atores foram os tropeiros que serão os agentes das
estâncias e das delimitações de sesmarias que se definem a partir de 1732.
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