O desdobramento das tensões e enfrentamentos
entre países europeus na década de 1930 assumiu um contorno de gradual
globalização com a invasão da Polônia pelo exército e pela força aérea alemã (Luftwaffe) em 1º de setembro de 1939.
Tinha início a segunda grande guerra mundial, o maior conflito militar da
história da humanidade e da qual o Brasil e os países americanos não ficaram à
margem dos reflexos militares, políticos, econômicos e culturais.
Após
a declaração de guerra, a marinha alemã (Kriegsmarine)
iniciou suas atividades voltadas ao combate de navios mercantes e militares da
Inglaterra. Apesar de contar com forças navais inferiores às inglesas, conforme
decisão de tratados relacionados à contenção da corrida armamentista, fixados
após a 1ª grande guerra mundial, os alemães desenvolveram tecnologias
sofisticadas para uso em submarinos e em encouraçados de bolso. A opção
estratégica da Kriegsmarine foi o
afundamento de navios mercantes, abalando a economia britânica e gerando
insegurança na navegação oceânica.
Os
países americanos, frente à tensa situação européia, iniciaram discussões sobre
um possível conflito militar e a posição a ser assumida. Comandados pelos
Estados Unidos, a partir de 1936 foi estabelecida uma política voltada à
neutralidade frente a um provável conflito europeu. Porém, o primeiro grande
confronto naval da guerra, aconteceu no espaço
platino, que oficialmente era uma zona americana de segurança: a Batalha
do Rio da Prata.
Nesta
Batalha, estiveram presentes três navios de guerra britânicos e o encouraçado
de bolso Almirante Graf von Spee, uma
nave de 180 metros
de comprimento, deslocando 10 mil toneladas e desenvolvendo uma velocidade
máxima de 26 nós. Lançada ao mar em junho de 1934, em 30 de setembro de 1939,
ao largo da costa de Pernambuco, afundou o vapor inglês Clement. A partir de
então, especializou-se em ações mercenárias de afundamento de navios mercantes
no Oceano Atlântico, sendo implacavelmente cassado pelo Almirantado inglês que
organizou nove grupos de caça. A força G,
formada pelos cruzadores Cumberland, Exeter, Ajax e Achilles estava
responsável pela proteção da navegação inglesa entre o Rio de Janeiro e o Rio
da Prata, esta última, uma zona de intenso tráfego comercial.
O
encontro entre o navio alemão e os cruzadores ingleses ocorreu no dia 13 de
dezembro de 1939, a
250 milhas
a norte/nordeste de Punta del Este. O resultado foi um violento confronto, com
os projéteis provocando avarias múltiplas nos navios envolvidos. O Graf Spee foi seriamente atingido
fugindo para o porto de Montevidéu para evitar o afundamento e onde poderia
realizar reparos, abastecimento e desembarque dos feridos. O navio permaneceu
até o dia 17 no porto, enquanto o Ajax e o Achilles ficaram ao largo, esperando
ansiosamente sua saída. Inconformado com a exigência das autoridades uruguaias
em zarpar, o comandante do Graf Spee,
Capitão Hans Langsdorff, provoca a
explosão do navio, retirando-se para Buenos Aires com cerca de mil tripulantes.
No dia 19, o capitão suicida-se com um tiro na cabeça, deixando uma carta onde
afirma: “só com a minha morte posso provar que os combatentes do Terceiro Reich
estão prontos para morrer em honra de sua bandeira”. Nos dias seguintes, as
repercussões pró e antinazistas ou inglesas, circularam nos jornais
norte-americanos, europeus, platinos e brasileiros, promovendo uma aproximação
dramática da América com a guerra e com as dificuldades na preservação de uma
política de neutralidade frente aos acontecimentos na Europa.
Em
1996, Nelson Pereira Theodosio, elaborou uma monografia de bacharelado no Curso
de História da Fundação Universidade do Rio Grande, com o título "A Batalha do Rio da Prata: informação e
repercussão nos jornais Rio Grande e O Tempo - 1939". O autor analisou as repercussões deste confronto
naval entre Alemanha e Inglaterra, na imprensa da cidade do Rio Grande.
Conforme Theodosio, “esta batalha foi o momento em que a guerra se encontrou
próxima à população (...) foi o momento em que a guerra deixou de ser uma
figura européia, estilizada, estampada nas páginas dos jornais. Foi o momento
de tomada de consciência. Havia uma guerra e ela estava acontecendo ali, bem
próxima, no Rio da Prata”. (p.VI)
Dois
jornais rio-grandinos foram pesquisados: O
Tempo e Rio Grande. Estes jornais,
não estiveram alheios à crise diplomática que envolveu os acontecimentos no
Prata, buscando informar os leitores dos acontecimentos a partir de um
tratamento diferenciado de informações que provinham da mesma fonte oficiosa
controlada pela censura estadonovista. O jornal Rio Grande, conforme Theodosio, dedicava a primeira página ao caso Graf Spee, reproduzindo, literalmente,
as informações repassadas pela Agência Nacional. Já o jornal O Tempo preparava um resumo das notícias
e publicava nas páginas internas, com a manchete exposta na capa, perdendo em quantidade e
ganhando em qualidade da informação, pois no Rio Grande, muitas notícias
contraditórias eram repassadas. No dia 14 de dezembro, O Tempo noticiou que o objetivo do Graf Spee era dirigir-se ao porto do Rio Grande para abastecimento,
e, realizar o comboio até Hamburgo do vapor alemão Rio Grande que estava
atracado no porto. A informação não foi confirmada, porém um tripulante do
vapor alemão foi preso com um rádio transmissor no porto do Rio Grande sob
suspeita de espionagem nazista. Uma conexão com o Graf Spee?
De
acordo com o bacharel em História, os relatos presentes nos dois periódicos
fixaram algumas representações que estavam sendo construídas frente à adesão ao
conflito europeu: “Os britânicos sempre são apresentados como corajosos, bravos
e cheios de iniciativa. Os germânicos sempre são apresentados como covardes,
traidores e traiçoeiros. A situação só irá mudar quando do suicídio do Capitão
Langsdorff. Neste momento, os dois jornais, mas, principalmente, o jornal Rio Grande, apresentará outro quadro do
marinheiro alemão: bravo, honrado, destemido. No entanto, podemos creditar tal
mudança ao sentimento compartilhado por toda a humanidade, a de sentir
condescendência diante de uma tragédia”. (p.XII)
A
segunda grande guerra passava a fazer parte do cotidiano dos rio-grandinos e
canalizaria uma grande parte do universo informativo nos seis anos seguintes.
Entrar na guerra ou permanecer neutro frente a referenciais europeus que estão se
esfacelando no conflito? As apreensões em relação ao futuro certamente
canalizaram a atenção da população nos meses que se seguiram à Batalha do Rio
da Prata.
Graf Spee em 1939. Acervo: U.S. Naval Historical Center Photograph. |
Olá. Sou jornalista, pesquisador, bacharelando em História e autor de alguns livros. Busco mais informações sobre essa possível ligação do Graf Spee e o vapor Rio Grande. Em especial a tentativa de instalação de um rádio transmissor no Rio Grande (tentativa frustrada relata por Aurélio Py e Alexandre Fortes em seus livros). Meu foco é a instalação de rádios transmissores ao longo da costa gaúcha e a presença dos submarinos alemães também nessa região (Florianópolis - Rio Grande - Buenos Aires). Em minhas pesquisas publicadas em meu último livro, agora em novembro 2018, relato o afundamento de um u boot em Araranguá - SC em agosto de 1942. Fato desconhecido pela historiografia (só consta nos documentos da FAB) e que comprova a presença de submarinos alemães nessa região (incluindo Rio Grande). Grato e aguardo retorno. Nelson Adams Filho
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