A atual onda
de calor de 2014 propicia uma reflexão sobre o aquecimento global. Fique claro
que não estou relacionando a atual onda de calor com a teoria do aquecimento
global (tema com muitas polêmicas e poucas certezas dos desdobramentos) mas
apenas fazendo uma reflexão sobre o que seria viver num planeta com
temperaturas tão altas. A experiência destas últimas semanas no Rio Grande do
Sul - com temperaturas persistentes mais elevadas desde o início da série
histórica de registro em 1910 – nos lega algumas reflexões que num futuro não
tão distante pode se tornar parte do cotidiano.
O efeito do
forte calor pode trazer transformações civilizatórias radicais e inclusive a
extinção de muitas culturas! Isto ocorreu no passado quando de mudanças
ambientais de forte impacto no modo-de-vida de civilizações como pode ter
ocorrido com os Maias.
E o assunto é espinhoso! Enquanto cientistas
defendem a teoria do aquecimento global outros, poucos, negam completamente.
Enquanto alguns consideram que o aquecimento se deve a ação antrópica (poluição
industrial ou emissão de dióxido de carbono na atmosfera), outros consideram
que a temperatura sobe devido ao ciclo solar de maior emissão e a alteração
climática não é antrópica.
Cientistas da Fundação Nacional de Ciências
dos EUA publicaram no periódico ‘Nature Geoscience’ que o resfriamento de longo
prazo do planeta encerrou-se no final do século 19. Nos últimos 1.400 anos, o
período global mais quente ocorreu a partir da década de 1970. Segundo os
pesquisadores, desde o século 20 está ocorrendo um aquecimento global. Em que
medida isto é um ciclo ‘natural’ do planeta ou a intensificação da Revolução
Industrial e a emissão de gases de efeito estufa (ou seja, a ação humana), pode
estar interferindo na temperatura global?
Estando em
andamento um processo de aquecimento global isto poderá promover um declínio da
biodiversidade e alteração de ecossistemas pelo planeta. O impacto na ação
humana também pode ser dramático com crises econômicas advindas de perdas na agropecuária,
intensificação de eventos climáticos extremos e elevação do nível dos
oceanos.
Conforme o
Ministério do Meio Ambiente “embora o clima tenha apresentado mudanças ao longo
da história da Terra, em todas as escalas de tempo, percebe-se que a mudança
atual apresenta alguns aspectos distintos. Por exemplo, a concentração de
dióxido de carbono na atmosfera observada em 2005 excedeu, e muito, a variação
natural dos últimos 650 mil anos, atingindo o valor recorde de 379 partes por
milhão em volume (ppmv) - isto é, um aumento de quase 100 ppmv desde a era
pré-industrial. Outro aspecto distinto da mudança atual do clima é a sua
origem: ao passo que as mudanças do clima no passado decorreram de fenômenos
naturais, a maior parte da atual mudança do clima, particularmente nos
últimos 50 anos, é atribuída às atividades humanas” (www.mma.gov.br).
Numa recente
e polêmica entrevista a Jeff Goodell da ‘Revista Rolling Stone’, o cientista
James Lovelock entende que o aquecimento global é irreversível e o futuro será
cataclismático. Lovelock, o edificador da teoria de Gaia (a Terra como um
organismo vivo que se auto-regula), defende que nos próximos cem anos os
desastres naturais e a destruição de ecossistemas vão se intensificar levando
ao extermínio de mais de 90% da população do planeta. Os sobreviventes buscarão
terras frias nas altas latitudes - Canadá, Islândia, Escandinávia e Bacia
Ártica. A chegada dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse - guerra, fome,
pestilência e morte é o horizonte futuro que aguarda os terráqueos.
Na visão de
Lovelock publicada na ‘Revista Rolling Stone’, até 2020, secas e outros
extremos climáticos serão lugar-comum. Até 2040, o Saara vai invadir a Europa,
e Berlim será tão quente quanto Bagdá. Atlanta acabará se transformando em uma
selva de trepadeiras kudzu. Phoenix se tornará um lugar inabitável, assim como
partes de Beijing (deserto), Miami (elevação do nível do mar) e Londres
(enchentes). A falta de alimentos fará com que milhões de pessoas se dirijam
para o norte, elevando as tensões políticas. "Os chineses não terão para
onde ir além da Sibéria", sentencia Lovelock. "O que os russos vão
achar disso? Sinto que uma guerra entre a Rússia e a China seja inevitável."
Com as dificuldades de sobrevivência e as migrações em massa, virão as
epidemias. Até 2100, a população da Terra encolherá dos atuais 6,6 bilhões de
habitantes para cerca de 500 milhões.
Conforme Jeff Goodell, em sua essência
supersimplificada, é o seguinte o cenário pessimista de Lovelock: o aumento da
temperatura significa que mais gelo derreterá nos pólos, e isso significa mais
água e terra. Isso, por sua vez, faz aumentar o calor (o gelo reflete o sol, a
terra e a água o absorvem), fazendo com que mais gelo derreta. O nível do mar
sobe. Mais calor faz com que a intensidade das chuvas aumente em alguns lugares
e com que as secas se intensifiquem em outros. As florestas tropicais
amazônicas e as grandes florestas boreais do norte - o cinturão de pinheiros e
píceas que cobre o Alasca, o Canadá e a Sibéria - passarão por um estirão de
crescimento, depois murcharão até desaparecer. O solo permanentemente congelado
das latitudes do norte derrete, liberando metano, um gás que contribui para o
efeito estufa e que é 20 vezes mais potente do que o CO2... e assim por diante.
Em um mundo de Gaia funcional, essas respostas positivas seriam moduladas por
respostas negativas, sendo que a maior de todas é a capacidade da Terra de
irradiar calor para o espaço. Mas, a certa altura, o sistema de regulagem pára
de funcionar e o clima dá um salto - como já aconteceu muitas vezes no passado
- para uma nova situação, mais quente. Não é o fim do mundo, mas certamente é o
fim do mundo como o conhecemos.
Frente às
previsões apocalípticas que devem ser filtradas com uma forte dose de
racionalidade, podemos fazer algumas reflexões: O futuro é o incerto mas um
incerto que é construído a partir das ações no presente. Como as sociedades se
organizarão para o século 21 numa era consumista sem precedentes no planeta? Como
gerenciar 7 bilhões de habitantes que estarão em expressivo crescimento
demográfico nas próximas décadas? Devemos ter um pessimismo excessivo frente ao
cenário futuro ou buscar um reduto alienado ignorando as mudanças climáticas?
Este verão
escaldante de 2014 é um bom momento para pensarmos um cenário futuro de
soluções que poderão ser cruciais para a continuidade do homo sapiens no
planeta.
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