Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

segunda-feira, 17 de julho de 2017

IN MEMORIAM

Amanhã, 19 de fevereiro de 2014, a cidade do Rio Grande completa 277 anos de fundação. É uma data propícia para  ressaltar a atuação de alguém que muito fez em seu tempo de vida para projetar sadiamente o município mais antigo do Rio Grande do Sul.
Foi um grande amigo da memória histórica de nossa cidade que faleceu na semana passada: Walter Albrecht. Nascido em 1918 - nos momentos dramáticos da maior epidemia da história da humanidade, a Gripe Espanhola -, seu Walter entrou para a história num momento marcante e fez história em inúmeros momentos também essenciais para a história local.
Ligado as atividades comerciais e administrativas, atuação esportiva e diplomática, Walter Albrecht teve uma vida intensa e marcada pela atuação comunitária acreditando no potencial da cidade do Rio Grande.
Ele me contou inúmeras histórias sobre acontecimentos por ele vivenciados ou que escutou de terceiros. E sempre enfatizava que era preciso preservar as memórias como forma de não apagar o passado. O corpo é um transitório passageiro do tempo mas as memórias poderiam ser preservadas eternamente, argumentava ele. Inúmeros objetos familiares que ele guardou viraram conhecimento histórico nestas páginas do Peixeiro: fotografias, cartões-postais, atas, etc.
Foram tantas histórias e ao mesmo tempo havia tantas outras para serem escutadas faltando  tempo na correria cotidiana. Certa vez ele me relatou com pesar sobre as fotografias antigas em vidro, tiradas por seu pai, e que estavam dentro de uma caixa no carro que estava sendo descarregado em frente a sua casa. Prédios e ruas da cidade nas décadas de 1920-30 estavam nestas fotografias, cuja caixa foi roubada e certamente destruídas, por não terem nenhum valor para o ladrão.
Nunca é demais relembrar que a aviação comercial no Brasil nasceu entre Rio Grande e Porto Alegre na chamada linha da Lagoa dos Patos. Seu pai, Albrecht era o responsável pela Condor Syndicat/Varig em Rio Grande desde 1927 (histórias já contadas aqui no Peixeiro). Uma das histórias mais marcantes contadas por seu Walter, foi quando ele, com cerca de 10 anos de idade, se escondeu no interior do avião antes da decolagem e pode ter se  tornado a primeira criança a voar no Rio Grande do Sul.  Uma aventura inesquecível pois la do alto deve ter visto a Barra do Rio Grande, a cidade edificada entre o mar, a lagoa e as dunas de areia...
Ideias compartilhadas com seu Walter ficaram em suspenso: elaborar um livro sobre a presença alemã em Rio Grande e sobre as relações comerciais e sociais da comunidade teuto-brasileira com outras cidades brasileiras. Muitas coisas ainda precisam ser pesquisadas mas é cada vez mais difícil escutar a oralidade de quem viveu estes períodos.
Seu passamento instiga uma reflexão histórica sobre o desaparecimento de toda uma forma de atuação social fundada na ação comunitária e na visão ética. Num período de perda de referenciais culturais e sentidos existenciais, numa cidade em transição econômica e social, com problemas fundados na urbanidade e que são de longa duração temporal, não há como não lamentar o passamento e colocar uma interrogação no futuro.
Este depositório de memórias agora se cala! A morte deste amigo parece encerrar um ciclo das memórias desde a década de 1920. E o silencio da memória é o mais desconcertante e sem sentido que pode marcar a existência humana...
Afinal, somos seres históricos que produzem história. Tudo o que fazemos cultural/historicamente ao longo da vida se transforma em memória de nossa existência. Dissipando a memória, nossa trajetória perde o sentido e se esvai no curso inexorável do tempo.

O cartão aqui reproduzido faz parte do acervo de Walter Albrecht e retrata alguns cenários que gerações de munícipes conhecem muito bem. O recorte da fotografia mostra seu Walter atuando no tradicional Clube de Regatas Rio Grande: a eterna juventude se eterniza na imagem. 

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