“Os matos da Ilha dos
Marinheiros não são de tão pouca importância, pois que fornecem quase
exclusivamente a lenha que se consome na cidade do Rio Grande, e isto desde
longos anos, sem diminuição sensível: existe também nesta ilha uma fonte
natural de água límpida, que a classe abastada da mesma cidade prefere a água
das cacimbas, e que manda buscar diariamente para seu consumo, apesar da
distância; algumas chácaras, que lá estabeleceram os moradores da cidade,
produzem com abundância todas as hortaliças e legumes que lhes pedem: causa
certa pena ver um deserto no meio das liberalidades da natureza: a Ilha dos
Marinheiros, como a Ilha de Torotama, não tem quase população alguma, além dos
escravos empregados na manutenção das quintas, e de poucos pescadores, cujas
famílias se ocupam ao mesmo tempo da criação de algum gado.” DREYS, Nicolau.
Notícia Descritiva da Província do Rio Grande de São Pedro do Sul (1839).
UMA PONTE
PARA A ILHA
A
Ilha dos Marinheiros possui 3.980 hectares , área de prática agrícola de ...
hectares, a estrada que a circunda tem 32 quilômetros , a
menor proximidade com Rio Grande é de 1.500 metros . A
população da Ilha apresentou flutuações ascendentes e descendentes (em 1858 -
961 habitantes; 1863 – 1051 habitantes; 1885 – 1500 habitantes; 1911 – 1935
habitantes; 1940 – 7200 habitantes; 1974 – 2725 habitantes), atualmente possui
cerca de 1.300 moradores. Com o objetivo de escoar a produção agrícola e
facilitar o acesso da população da Ilha à cidade do Rio Grande, tiveram início
em 1977 os trabalhos de aterro (com pedras trazidas do Capão do Leão) ligando a
Ilha do Leonídio e a Ilha dos Marinheiros. Por fatores ambientais foi projetada
a construção de duas pontes para circulação do peixe e do camarão. A primeira
foi construída com 90
metros de extensão e a segunda possui 150 metros e teve a sua
construção iniciada em 1999. Atualmente, o acesso à ponte cedeu e obras deverão
ser realizadas no local, porém é possível passar provisoriamente pela ponte
consolidando a ligação terrestre entre a Ilha e a cidade. Isto representa a
conquista de uma reivindicação que foi oficializada a pelo menos 150 anos.
Há um século e meio atrás os debates ligados à construção
de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros chegaram à Câmara Municipal. Já
naquele momento, a importância econômica da Ilha na produção de
hortigranjeiros, de madeira e de água potável, associada a um espaço para o
lazer da população da cidade do Rio Grande, sinalizaram a um esforço no sentido
de consolidar a relação da Ilha com a cidade.
UMA PONTE DE 150 ANOS
No Relatório de 1853 da Câmara Municipal do Rio Grande a
Assembléia Provincial, foi ressaltada a importância da Ilha dos Marinheiros
como sendo “o lugar que abastece a cidade de lenhas, hortaliças etc, é também a
melhor distração e recreio que a natureza legou, nos subúrbios de uma cidade
como a do Rio Grande que tendo tanto de importante, como praça comercial,
quanto de pouco aprazível, ressente-se aos olhos de todos de uma necessidade
palpitante: uma ponte que facilite e desenvolva a comunicação da cidade com a
ilha, a comunicação tantas vezes interrompida pelos temporais que obstam, por
espaço de dias, a navegação, único veículo de que na atualidade dispõem; ao
passo que seria dotar a mesma cidade de uma beleza que a nela, contribuiria
para o aumento e prosperidade rápida de uma povoação nascente (a mesma Ilha)
que já uma vez ocupou a atenção da Assembléia legislativa provincial. A
construção desta ponte não apresenta dificuldades insuperáveis: se a Câmara for
autorizada por uma lei, a organizar uma companhia empresaria, debaixo da
inspeção da primeira autoridade da província, se por lei se conceder a
companhia uma vez organizada, o privilégio por 20 anos, e o imposto de
barreira, regulado pela presidência da Província; se oferecerem estas
vantagens, a Câmara crê, que com muita facilidade levará a efeito este tão útil
quanto importante melhoramento, sem o menor auxílio dos cofres provinciais”. A
Província autoriza em agosto de 1853 os estudos para construção de uma ponte e
a Câmara nomeia uma comissão constituída por Porfírio Ferreira Nunes, Antônio
Teixeira de Magalhães e Domingos Vieira de Castro para escolha do local mais
apropriado.
No relatório de 30 de agosto de 1854 repete-se o
discurso: “conhece-se perfeitamente a importância desse lugar e existindo nela
já um crescido número de habitantes (estando alguns habilitados para os cargos
públicos) a Câmara julga também que se fazia um serviço importante a Ilha dos
Marinheiros sendo ela elevada a categoria de distrito pois assim melhor seria administrado a justiça de que
tanto carece essa povoação.”
Porém o relatório de 1858 reconhece que “há tempos se
propôs o estabelecimento de uma para a Ilha dos Marinheiros e por falta de
meios e de autorização não se tem podido levar isso a efeito”. A Câmara pede ao
governo provincial que a “autorize a contratar a sua construção com qualquer
companhia nacional ou estrangeira, concedendo-se-lhe o competente privilégio e
o imposto de barreira que for regulado.” No ano seguinte, a Câmara considera de
reconhecimento público a construção de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros,
sendo levantada uma planta e nomeada, em sessão de 11 de janeiro de 1859, uma
comissão encarregada de promover a assinatura das ações “afim de depois, solicitar
a precisa aprovação, mas, até esta data, nenhuma conta deu a mesma comissão de
seus trabalhos”.
Em 1861
a situação parecia avançar no sentido de concretizar o
antigo projeto de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros, sendo encarregado o
sr. capitão Nabor Delfim Pereira “formando para isso uma companhia sob certas
condições. Sua proposta , planta e orçamento já a Câmara remeteu ao sr.
presidente da Província. Sendo esta uma obra que deve contribuir muito para o
desenvolvimento e progresso da Ilha dos Marinheiros já tão provada, e de bom
ofício para esta cidade, a Câmara não toma por ocioso pedir a Assembléia
Provincial que se sirva despender a esta empresa a proteção que for compatível
com os interesses da Província.”
Um desgaste com o assunto já se fazia sentir no relatório
de 1862: “Por intermédio da Câmara, o capitão Nabor Delfim Pereira propôs à
Assembléia Provincial, a incorporação de uma companhia para a construção de uma
ponte, desta cidade para a Ilha dos Marinheiros. A Câmara informou convenientemente
esta proposta acompanhada de competente planta e orçamento e S. Ex. respondeu
para se comunicar, como se comunicou, ao pretendente que aguardava a chegada de
um engenheiro hidráulico para examinar o projeto, e que brevemente daria
conhecimento do seu resultado. Isto passou-se creio que em novembro de 1860, e
de então a esta parte nada mais tem ocorrido a respeito”.
Ao final de dez anos de insistência a Câmara novamente
reiterou a solicitação à Assembléia Provincial para o apoio a uma empresa que
construísse uma ponte. (Relatório de 20 de janeiro de 1863). Conforme este
relatório, o projeto do capitão Nabor de uma ponte da cidade para a Ilha dos
Marinheiros, “ainda se acha no mesmo estado que disse no meu relatório
anterior”. Nos relatórios seguintes o assunto desapareceu de pauta. Constata-se
que a construção da ponte também possuiu uma dimensão histórica no contexto da
atuação e do silêncio do poder público.
Sou descendente do Cap. Nabor Delfim Pereira (nasceu em São Paulo). É meu trisavô. O seu filho, também com o mesmo nome, foi engenheiro agrimensor atuando em Rio Grande. Este, teve estúdio fotográfico em 1862 (dado em pesquisa da prof. Teresa Lenzi). Célia Pereira
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