Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

terça-feira, 18 de julho de 2017

A PONTE DA ILHA DOS MARINHEIROS

“Os matos da Ilha dos Marinheiros não são de tão pouca importância, pois que fornecem quase exclusivamente a lenha que se consome na cidade do Rio Grande, e isto desde longos anos, sem diminuição sensível: existe também nesta ilha uma fonte natural de água límpida, que a classe abastada da mesma cidade prefere a água das cacimbas, e que manda buscar diariamente para seu consumo, apesar da distância; algumas chácaras, que lá estabeleceram os moradores da cidade, produzem com abundância todas as hortaliças e legumes que lhes pedem: causa certa pena ver um deserto no meio das liberalidades da natureza: a Ilha dos Marinheiros, como a Ilha de Torotama, não tem quase população alguma, além dos escravos empregados na manutenção das quintas, e de poucos pescadores, cujas famílias se ocupam ao mesmo tempo da criação de algum gado.” DREYS, Nicolau. Notícia Descritiva da Província do Rio Grande de São Pedro do Sul (1839). 


UMA PONTE PARA A ILHA
A Ilha dos Marinheiros possui 3.980 hectares, área de prática agrícola de ... hectares, a estrada que a circunda tem 32 quilômetros, a menor proximidade com Rio Grande é de 1.500 metros. A população da Ilha apresentou flutuações ascendentes e descendentes (em 1858 - 961 habitantes; 1863 – 1051 habitantes; 1885 – 1500 habitantes; 1911 – 1935 habitantes; 1940 – 7200 habitantes; 1974 – 2725 habitantes), atualmente possui cerca de 1.300 moradores. Com o objetivo de escoar a produção agrícola e facilitar o acesso da população da Ilha à cidade do Rio Grande, tiveram início em 1977 os trabalhos de aterro (com pedras trazidas do Capão do Leão) ligando a Ilha do Leonídio e a Ilha dos Marinheiros. Por fatores ambientais foi projetada a construção de duas pontes para circulação do peixe e do camarão. A primeira foi construída com 90 metros de extensão e a segunda possui 150 metros e teve a sua construção iniciada em 1999. Atualmente, o acesso à ponte cedeu e obras deverão ser realizadas no local, porém é possível passar provisoriamente pela ponte consolidando a ligação terrestre entre a Ilha e a cidade. Isto representa a conquista de uma reivindicação que foi oficializada a pelo menos 150 anos.
Há um século e meio atrás os debates ligados à construção de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros chegaram à Câmara Municipal. Já naquele momento, a importância econômica da Ilha na produção de hortigranjeiros, de madeira e de água potável, associada a um espaço para o lazer da população da cidade do Rio Grande, sinalizaram a um esforço no sentido de consolidar a relação da Ilha com a cidade.

UMA PONTE DE 150 ANOS 

No Relatório de 1853 da Câmara Municipal do Rio Grande a Assembléia Provincial, foi ressaltada a importância da Ilha dos Marinheiros como sendo “o lugar que abastece a cidade de lenhas, hortaliças etc, é também a melhor distração e recreio que a natureza legou, nos subúrbios de uma cidade como a do Rio Grande que tendo tanto de importante, como praça comercial, quanto de pouco aprazível, ressente-se aos olhos de todos de uma necessidade palpitante: uma ponte que facilite e desenvolva a comunicação da cidade com a ilha, a comunicação tantas vezes interrompida pelos temporais que obstam, por espaço de dias, a navegação, único veículo de que na atualidade dispõem; ao passo que seria dotar a mesma cidade de uma beleza que a nela, contribuiria para o aumento e prosperidade rápida de uma povoação nascente (a mesma Ilha) que já uma vez ocupou a atenção da Assembléia legislativa provincial. A construção desta ponte não apresenta dificuldades insuperáveis: se a Câmara for autorizada por uma lei, a organizar uma companhia empresaria, debaixo da inspeção da primeira autoridade da província, se por lei se conceder a companhia uma vez organizada, o privilégio por 20 anos, e o imposto de barreira, regulado pela presidência da Província; se oferecerem estas vantagens, a Câmara crê, que com muita facilidade levará a efeito este tão útil quanto importante melhoramento, sem o menor auxílio dos cofres provinciais”. A Província autoriza em agosto de 1853 os estudos para construção de uma ponte e a Câmara nomeia uma comissão constituída por Porfírio Ferreira Nunes, Antônio Teixeira de Magalhães e Domingos Vieira de Castro para escolha do local mais apropriado.
No relatório de 30 de agosto de 1854 repete-se o discurso: “conhece-se perfeitamente a importância desse lugar e existindo nela já um crescido número de habitantes (estando alguns habilitados para os cargos públicos) a Câmara julga também que se fazia um serviço importante a Ilha dos Marinheiros sendo ela elevada a categoria de distrito pois assim  melhor seria administrado a justiça de que tanto carece essa povoação.”
Porém o relatório de 1858 reconhece que “há tempos se propôs o estabelecimento de uma para a Ilha dos Marinheiros e por falta de meios e de autorização não se tem podido levar isso a efeito”. A Câmara pede ao governo provincial que a “autorize a contratar a sua construção com qualquer companhia nacional ou estrangeira, concedendo-se-lhe o competente privilégio e o imposto de barreira que for regulado.” No ano seguinte, a Câmara considera de reconhecimento público a construção de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros, sendo levantada uma planta e nomeada, em sessão de 11 de janeiro de 1859, uma comissão encarregada de promover a assinatura das ações “afim de depois, solicitar a precisa aprovação, mas, até esta data, nenhuma conta deu a mesma comissão de seus trabalhos”.
Em 1861 a situação parecia avançar no sentido de concretizar o antigo projeto de uma ponte para a Ilha dos Marinheiros, sendo encarregado o sr. capitão Nabor Delfim Pereira “formando para isso uma companhia sob certas condições. Sua proposta , planta e orçamento já a Câmara remeteu ao sr. presidente da Província. Sendo esta uma obra que deve contribuir muito para o desenvolvimento e progresso da Ilha dos Marinheiros já tão provada, e de bom ofício para esta cidade, a Câmara não toma por ocioso pedir a Assembléia Provincial que se sirva despender a esta empresa a proteção que for compatível com os interesses da Província.”  
Um desgaste com o assunto já se fazia sentir no relatório de 1862: “Por intermédio da Câmara, o capitão Nabor Delfim Pereira propôs à Assembléia Provincial, a incorporação de uma companhia para a construção de uma ponte, desta cidade para a Ilha dos Marinheiros. A Câmara informou convenientemente esta proposta acompanhada de competente planta e orçamento e S. Ex. respondeu para se comunicar, como se comunicou, ao pretendente que aguardava a chegada de um engenheiro hidráulico para examinar o projeto, e que brevemente daria conhecimento do seu resultado. Isto passou-se creio que em novembro de 1860, e de então a esta parte nada mais tem ocorrido a respeito”.
Ao final de dez anos de insistência a Câmara novamente reiterou a solicitação à Assembléia Provincial para o apoio a uma empresa que construísse uma ponte. (Relatório de 20 de janeiro de 1863). Conforme este relatório, o projeto do capitão Nabor de uma ponte da cidade para a Ilha dos Marinheiros, “ainda se acha no mesmo estado que disse no meu relatório anterior”. Nos relatórios seguintes o assunto desapareceu de pauta. Constata-se que a construção da ponte também possuiu uma dimensão histórica no contexto da atuação e do silêncio do poder público. 

Um comentário:

  1. Sou descendente do Cap. Nabor Delfim Pereira (nasceu em São Paulo). É meu trisavô. O seu filho, também com o mesmo nome, foi engenheiro agrimensor atuando em Rio Grande. Este, teve estúdio fotográfico em 1862 (dado em pesquisa da prof. Teresa Lenzi). Célia Pereira

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