Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

sábado, 15 de julho de 2017

A IRMANDADE DO CARMO

Desde 1780, a Ordem do Carmo está oficialmente presente em Rio Grande. A atual igreja do Carmo é a segunda igreja aqui erguida em devoção a N. S. do Carmo. Antes desta existiu a antiga Igreja do Carmo em estilo colonial espaço de grande afluência de fiéis, na esquina das ruas Marechal Floriano e Benjamin Constant, esta última se chamava Beco do Carmo. Ao fundo da igreja ficava o cemitério que se estendia até a esquina com a rua General Bacelar. A demolição ocorreu a partir de 1928, para abertura do trânsito, conforme Antenor Monteiro em seus rebuscos, publicados no jornal O Tempo em 1935. É de Monteiro o levantamento histórico a seguir transcrito.

N. SRA DO CARMO EM RIO GRANDE
         Frei Antonio das Chagas, geral do Convento do Carmo do Rio de Janeiro, por Provisão de 26 de janeiro de 1777, autorizou a criação de uma devoção com a denominação de Ordem 3ª de N. S. do Monte do Carmo, na Vila do Rio Grande de São Pedro. Para isto nomeou como comissário o reverendo Luiz de Medeiros Corrêa que delegou seus poderes ao vigário da Vara e Freguesia na mesma vila, padre José Gomes de Faria. A devoção se iniciou em um altar na igreja Matriz de S. Pedro no dia 15 de julho de 1780.
         A construção da igreja teve início em 1800 e conclusão em 1809, sendo Bispo Diocesano D. José Caetano da Silva Coutinho, que em agosto do mesmo ano, autorizou o padre Francisco Inácio da Silveira, a proceder à benção da Igreja, o que teve lugar a 6 de novembro de 1809, sob a invocação de Igreja da Venerável Ordem 3ª de N.S. do Monte do Carmo e que lhe foi confirmada pelo Breve Apostólico de D. Lourenço dos Condes de Calipso, Arcebispo de Nebice e Núncio de Sua Santidade junto ao Governo do Brasil. A 20 de outubro de 1847 lhe são concedidas todas as graças e privilégios que gozam os conventos dos Carmelitas da Côrte.
         A imagem do Senhor Morto, venerada nesta igreja foi feita em Rio Grande, por Serafim José Ribeiro, o ‘santeiro’, como era conhecido. Foi realizada em apenas seis meses. A imagem tem 8 palmos e os braços se movem de foram a prestar-se a cerimônia do descimento da cruz. Foi benta pelo Bispo no dia 25 de dezembro de 1872.
         Conforme Monteiro, nesta velha igreja passou-se um interessante acontecimento: a 16 de julho de 1865, dia de N. S. do Carmo, desembarcou de fronte à igreja, para onde se dirigiu, pois no templo se celebrava a festa da Virgem, Sua Majestade D. Pedro II, acompanhado de seu genro o Duque de Saxe, do Ministro da Guerra Ângelo Moniz da Silva Ferraz e seus ajudantes, generais Marques de Caxias e Francisco Xavier Calmon Cabral. A surpresa da chegada e o desconhecido fardamento da guarda de honra do Imperador que, antecipando a comitiva, se postara a porta, ocasionaram pânico no interior do templo, persuadindo o povo que o enchia, de que ali estivessem paraguaios. Ao meio do tumulto, o sacerdote conseguiu explicar o fato e a orquestra, no coro, executou o Hino Nacional, conseguindo-se assim restabelecer a calma. A comitiva entrou e foi fazer a sua oração no altar-mor.
         A Ordem do Carmo montara um hospital numa velha casa à praça 7 de Setembro, junto ao terreno pertencente à Irmandade de S. Francisco de Assis. Esta casa foi demolida e em 23 de março de 1873 se lançou ali a pedra fundamental de um novo edifício. Nesse dia, às 4 horas da tarde, os irmãos, incorporados e de cruz alçada, levando a imagem de S. Tereza, reformadora da Ordem e com grande acompanhamento de povo e autoridades, seguiram todos em procissão pela rua Pedro II e Andrade Neves até o referido local. O terreno estava todo embandeirado e num altar foi colocada a imagem de S. Tereza. Lavraram-se duas atas, uma em latim e outra em português, assinada pelos irmãos presentes, vigário e autoridades, e bem assim, jornais e moedas, tudo se encerrou em um cofre. Foram padrinhos na cerimônia à pedra fundamental os irmãos jubilados, Comendador João de Miranda Ribeiro e João Antonio Lopes e a irmã priora jubilada Maria Bento Primo e a ministra de S. Tereza Arminda da Cunha e Silva.
         Para a ereção desse hospital, não só concorreram a Ordem e os donativos do povo. A Assembléia Provincial consignou no orçamento 6.000$000 sendo paga a primeira prestação de um conto de réis em 25 de fevereiro de 1873. No dia 13 desse mesmo mês e ano, o então deputado, conselheiro Pinto Lima, apresentou a Câmara um projeto de lei, autorizando o Governo a mandar extrair quatro loterias pelo plano das da Santa Casa de Misericórdia, para auxílios da construção desse hospital. O edifício, ostentando bonitas linhas arquitetônicas, a rua Silva Paes, prestou valiosos serviços aos irmãos da Ordem até que, a mingua de recursos, o hospital deixou de funcionar. Ali funcionou depois um colégio e o Grêmio Colomy, mantidos a expensas do boníssimo padre Josué de Mattos. O edifico acabou por ser vendido ao dr. Caetano Annella, que nele manteve uma casa de saúde, e mais tarde o Estado o adquiriu, ali instalando o Colégio Juvenal Miller.
         O Marechal Francisco Soares de Andréa na Discrição das Emendas ou Adições feitas ao arruamento da Vila do Rio Grande de S. Pedro, que acompanhou a planta da vila, por ele feita em 1835, deixou esta informação: ‘Entre as ruas da Praia e Direita, precisa ir abaixo a Igreja e todas as suas dependências, a uma casa baixa e boa que há na esquina da rua Direita e do outro lado prejudica as frentes de todas as casas do Beco, mas poderão assim ficar, notificando-se os donos para lhes não mexer sem recuar as frentes. Esta demolição da Igreja é que me faz preferir antes a abertura da rua do Rosário mas se for possível que a Ordem do Carmo se conforme com esta demolição em que pouco se perde, porque a Igreja nada tem de boa e não passa de um grande armazém com alguns altares, e se assim for possível, como creio, dar à ordem terreno mais amplo em algum lugar desta rua, ou em algum outro lugar...’.
         Houve uma tentativa de demolição ainda no século 19. O Diário do Rio Grande de 17 de agosto de 1867 informava: ‘consta que a igreja do Carmo ia ser removida, mudando-se-lhe a frente para a rua 16 de Julho, lado oeste e os fundos a leste, para o que se pretende comprar os prédios que são imediatos a mesma igreja. Lucra com isso a Ordem que pode obter um outro com maiores proporções e mais elegância e a rua ganharia em embelezamento pois onde ela está edificada serve de obstáculo ao trânsito’.

         O juiz da Ordem, Sr. Francisco José da Cunha, contava com os donativos de Trinta contos do coronel Domingos Faustino Corrêa, dez contos do Coronel José Vitorino Rezende e cinco contos subscritos por ele Cunha. A obra fora orçada em 200.000$000. Cento e três anos depois da indicação do Marechal Andréa, realizava-se a inauguração do novo templo do Carmo, após dez anos decorridos da demolição do ‘armazém com alguns altares’, como irreverentemente denominou a velha igreja o Marechal Andréa, conclui Antenor Monteiro.

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