O filósofo Luiz Felipe Pondé se caracteriza
por instigar a reflexão a partir de enfáticas provocações. Em seu último livro
“A Era do Ressentimento, uma agenda para o contemporâneo” (São Paulo: LeYa,
2014), ele mais uma vez traz o conceitual filosófico para as questões
cotidianas. Ele caracteriza a Era do Ressentimento como um período fundado no individualismo
excessivo e narcisista que envolve a sociedade ocidental contemporânea trazendo
discussões sobre política, erotismo, beleza, felicidade e sentido.
Nesta
“filosofia da provocação” o mundo imperfeito e trágico em que vivemos
diariamente é abordado na busca de sentidos para a vida num caos de sentidos
possíveis.
Para Pondé a sociedade contemporânea é cada
vez mais disjuntiva (conflituosa, contraditória, sem nenhuma cura possível) em
sua operação, isto faz com que o movimento de nossa História tenda cada vez
mais ao conflito e jamais a um “mundo de paz e igualdade”. Estamos mais no
âmbito do agon grego (conflito,
agonia) do que do messianismo que sustenta o marxismo hegeliano. Ele enfatiza
que não há nenhuma metafísica nesse mundo, apenas homens e mulheres numa
batalha cotidiana para lidar com essa disjunção que atravessa a todos, do
trabalho ao amor, do consumo às crenças religiosas, dos sonhos noturnos aos
pesadelos da vigília diária.
O filósofo Friedrich Nietzsche desenvolveu o
conceito de ressentimento frente à indiferença e silêncio do universo em
relação a ação humana no planeta Terra. É da indiferença do universo que nasce
a mágoa, e para Nietzsche, as religiões, a metafísica, a moral são criações do
ressentimento. Para Pondé, os sintomas do ressentimento assumiram formas
infinitas: estética, política, ética e sexual.
Vejamos algumas passagens do filósofo que
dispara suas reflexões em tudo aquilo que comporta a condição humana:
Uma agenda para o contemporâneo é um ato de coragem. Sua missão é
nos fazer ver quem somos numa época afogada em narcisismo.
Nossa vida se dá, em grande parte, como a de um animal que vive
fora de seu lugar: sonhamos em ser imortais mas sempre acabamos por
experimentar o mundo finito e o limite de nossos sonhos.
O risco de as Ciências Humanas se tornarem alvo de ridículo no
futuro é enorme (confiarão mais nas revistas femininas e nas pesquisas
publicitárias), justamente porque elas perderam qualquer contato com a
realidade e afirmam seus delírios sobre homens e mulheres que não
existem.
Penso que a esquerda só atrapalha nosso esforço de compreensão das
contradições do capitalismo, justamente porque ela é infantil e mitológica em
sua visão de mundo.
O ressentimento faz de nós incapazes de ver algo simples: o
universo é indiferente aos nossos desejos.
Todos os direitos humanos e as democracias não resistiriam a dez
noites de escuridão.
Nunca haverá paz no mundo, só quando ele acabar e o silêncio do
universo nos cobrir com seu véu de indiferença.
O homem contemporâneo é, talvez, o mais covarde que já caminhou
sobre a Terra, sobre a qual deixará sua marca de incompetência em lidar com a
morte, a dor e o fracasso.
O narcisismo não é a marca de alguém que se ama muito, mas a marca
de alguém que vive lambendo suas feridas porque é um miserável afetivo.
A ideia de colocar no centro da sala de aula o “oprimido”
transformou-se numa das maiores marcas dos idiotas do bem, devastando, no caso
específico, a educação.
Se Hitler tivesse de enfrentar os jovens e adultos jovens de nossa
época, teria ganho a guerra. Primeiro que seus professores afirmariam que matar
é feio e opressor e que supor que os nazistas deveriam ser combatidos seria
pura manifestação de intolerância e preconceito com o “diferente”.
Deus me livre de ser feliz. Soa estranho, mas me parece essencial
nos afastarmos da neurose da felicidade.
Se você tem mais de trinta anos e se considera a pessoa mais
importante do mundo, já fracassou como adulto.
De alguma forma, a marca definitiva do contemporâneo é o
narcisismo estéril e o individualismo histérico. Muita gente sente um profundo
ressentimento por ter que sustentar (não só financeiramente) suas próprias
vidas sem nenhuma garantia de felicidade.
Nosso maior pecado foi acreditar que superamos as superstições
porque criamos outras novas, entre elas a crença em si mesmo.
O mundo contemporâneo inventou o impossível: a multiplicidade de
diferenças que não fazem nenhuma diferença.
A solução para o ressentimento não é negá-lo, mas nomeá-lo, ler
sobre ele, perceber que é impossível não o ter em nós em alguma medida porque
sempre conviveremos com pessoas melhores do que nós.
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