Cine Glória cerca do final dos anos 1950. Esquina das ruas Benjamin Constant com Dr. Nascimento. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense. |
“Ir ao cinema era quase uma obrigação, a gente nos fins de semana já sabia que o programa era aquele, era ir ao cinema não é? É porque vinham filmes muito bons, tanto europeus como americanos. Então a gente gostava de assistir a esses filmes. Antes da sessão, ficávamos reunidos na ante-sala conversando e trocando ideias, contando as novidades, fazendo as fofocas (risos)”. Walter Albrecht
Como
participei recentemente da banca de monografia de conclusão do Curso de
História Bacharelado (FURG) defendida por Fernando Marrera com o tema “Circuito
Cinematográfico Glória”, farei uma breve abordagem das informações trazidas por
esta monografia em relação, especificamente, ao Cine Glória.
O surgimento
da Empresa Francisco Cupello & Cia. Ltda que passou a ser mais conhecida
como Circuito Cinematográfico Glória, estendeu sua atuação por várias cidades
do Rio Grande do Sul e de outros estados brasileiros.
O Cine Glória
foi inaugurado no mesmo ano em que o Cine-Teatro Politeama foi demolido: 1955.
O antigo prédio do Politeama localizado na rua Duque de Caxias esquina com
General Câmara, marcou a cultura local durante décadas mas não correspondia
mais a nova visão ‘modernizadora’ que o Circuito Glória implementava. O jornal
Rio Grande de 26 de outubro de 1955 deixou este registro: “Silencioso e vazio,
o velho Politeama-Riograndense, de tantas glórias passadas, aguarda, agora, que
os demolidores ponham abaixo as suas paredes. Grandes atores do passado,
cantores que brilharam sob as luzes da sua ribalta, jovens e velhos artistas
que no seu palco vislumbraram a gloria e conheceram as urzes do fracasso,
levantam-se hoje, como fantasmas redivivos, e sacudindo a poeira do tempo, dão
a velha casa de espetáculos o seu adeus, que é o adeus de todos nós a uma época
perdida no cemitério da história”.
No Cine Sete
de Setembro e no Glória, o padrão arquitetônico art-déco foi utilizado para
atender as exigências modernas das construções, trazendo um aspecto limpo e
sóbrio. As principais alterações da Empresa no aspecto estrutural se faziam no
âmbito da fachada do edifício, na instalação de luzes indiretas, na aquisição
de poltronas anatômicas e na instalação de acessórios de decoração que
garantissem elegância às novas salas.
Em 5 de julho de 1955, o jornal Rio Grande
noticiava: “O povo riograndino terá, dentro em breve, a maior sala de
espetáculos cinematográficos à sua disposição. Empresa progressista, Cinema
Cupello S.A., tomando a si o comércio da projeção cinematográfica em nossa
cidade, não estacionou sobre as salas existentes e, poucos anos depois do
início de sua atividade entre nós, já apresentava o novo 7 de setembro, dotado
com todos os requisitos de um cinema moderno. Surgiu então, o projeto do Cine
Teatro Glória, a ser erguido na rua Dr. Nascimento, defronte ao C.E. Lemos
Junior. E, daí a execução, um curto período”.
Nascia a maior
sala de cinema que a cidade já teve! A inauguração do Glória, apesar do prédio
não estar completamente pronto, ocorreu em 3 de dezembro de 1955 com a exibição
do filme ‘Um Fio de Esperança’. A sala também era chamada de Palácio do
Cinemascope, um sistema de projeção criado em 1953 e que proporcionava maior
fidelidade na imagem e no som. O Cine Glória comportava 2.500 lugares e contava
com um amplo hall de entrada. As poltronas eram anatômicas e distribuídas em
plateia alta e plateia baixa, sendo o cinema com maior capacidade na zona sul
do Estado. Conforme a revista Cinelândia (circulava nos cinemas a partir de
1950), o Cine Glória possuía projetores que custavam 600 mil cruzeiros cada um,
além de ‘som estereofônico perspecta, direcional, de alta fidelidade e que é
servido por 17 alto falantes’ (Cinelândia, 04-12-1955).
O croqui para
a construção do Cine Glória exibe a fachada com a presença de vitrines e lojas
nas laterais, com ênfase na aglomeração do público ao redor desses espaços. As
vitrines eram destinadas principalmente a confeitarias, cafés, lojas de
vestuário, evidenciando as atividades comerciais associadas a sétima arte e
também a articulação entre consumo e sociabilidade. Na sala de espera também
estava a bomboniere como mais um
espaço de sociabilidade. É preciso ressaltar, como fez Fernando Marrera que “num
momento em que a televisão ainda não existia ou ainda era um privilégio de
poucos, o cinema era um ponto difusor das notícias ao redor do mundo e o local
de encontro para o público assistir aos primeiros seriados semanais, aos
últimos filmes do momento e prestigiar a vida social ativa que se criava no
entorno das salas”.
Diga-se que
esta forte relação entre a população da cidade e a arte cinematográfica foi
sendo construída na primeira metade do século XX. Este espaço de sociabilidade
e cultura já estava amadurecido quando da inauguração do Cine Glória em 1955.
*Esta matéria foi publicada no dia 23 de abril de 2013 no caderno cultural O Peixeiro do Jornal Agora.
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