Porto do Rio Grande em 1908

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terça-feira, 15 de setembro de 2020

D. MANUEL E O CAPELÃO

Alfredo Taunay em desenho de Angelo Agostini na Vida Fluminense de janeiro de 1870. 

Outra preciosidade do Visconde de Taunay no livro "Recordações de Guerra e de Viagem" (Brasília, Senado Federal, 2008, p. 95) diz respeito a uma discussão entre um oficial mal intencionado e um capelão durante a Guerra do Paraguai. 

Taunay relata que uma das historietas que mais o fez rir ele ouviu "do General Catão Roxo, logo que cheguei ao Paraguai, e rir, sobretudo, porque conhecia perfeitamente os personagens a que dia se referia, entre os quais um capelão muito colérico, arrebatado e soldadescamente “desbocado”.

 Com ele embirrava muito o X..., indivíduo, aliás, antipático como raros implicante,escarninho, malévolo, fútil e segundo muitos, perigosamente intrigante. Poucas pessoas conheceu, de tão desagradável contacto como este oficial, a quem, aliás, todos nós consagrávamos a mais acentuada ojeriza. E a mais justificada[...] força é convir. 

Vamos, porém, ao caso do nosso capelão... Pregava ele certo domingo um daqueles sermões “eloqüentes” cuja autoria com certeza gostosamente subscreveria o famoso Cônego Filipe, porque estava dentro dos moldes do seu estilo sacro-oratório.

 Para maior gáudio dos rapazes que piscavam os olhos uns para os outros, começara o bom do frei... o seu sermão por legítima bernardice: “Reinava em França Dom Manuel III...” Finda a missa, incorporara-se o padre a uma grande roda pondo-se a discutir sobre a homilia edificante e, sobretudo, rigorosamente histórica que acabava de proferir, quando apareceu o tal oficial implicante que, aliás, vivia a atormentá-lo com os seus contínuos remoques insolentes. 

“Padre, como é isto? Se em França nunca houve D. Manuel I, como que o senhor descobriu este D. Manuel III?”.

 Apesar de já a ira lhe subir às faces, mal disposto como estava pelas contínuas provocações e grosserias do interpelador, ainda contemporizou o frade: “Ora esta! Pouco importa a questão do nome do rei, o que vale é a filosofia, a essência do caso: Se não era D. Manuel, seria D. Antônio ou D. José...”. 

– Também nunca os houve em França, redargüiu ainda, num tom melífluo e perverso, o pouco amável reparador. 

Aí perdeu o bom do capelão as estribeiras e dando largas ao insopitável caráter respondeu-lhe com uma veemência de palavras cujos termos soldadescos preciso parafrasear: 

“– Olhe, quer saber de uma coisa? Se não era D. Manuel, D. Antônio ou D. José seria ou D. vá... plantar batatas ou D. vá para o diabo que o carregue!”.

 Contava o catão que o enérgico encerramento do incidente tal explosão de gargalhadas, e demonstrações de aplauso, ao valente clérigo trouxera que o chasqueador aturdido, se retirara desnorteado e confundido. Boa lição!".

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