Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

A CRIATURA DO BANHADO DO TAIM

 

Trecho do Banhado do Taim. Acervo: Autor. 


Estamos em 2020 e uma história continua a ser repetida, com casos novos e esporádicos, algumas vezes aumentados e outros inventados, mas, sua persistência indica que algo estranho vive no banhado do Taim! Como historiador, já li nos documentos dos séculos XVIII, XIX e XX tantos registros sobre este assunto, que não posso ignorar que algo ainda inexplicável tem ocorrido a mais de trezentos anos no que hoje é atual Reserva Ecológica do Taim!

Como não tenho explicação faço apenas o relato de um mínimo destas fontes que tratam deste assunto insólito.

Lá pelos idos de 1690, os primeiros tropeiros que cruzaram pela área do Taim ficavam apreensivos ao passar pelos alagadiços com o gado. O caminho utilizado desviava do alagadiço cruzando por uma pequena faixa de terra entre a Lagoa Mirim e o início dos banhados, na altura da atual capela do Taim.

Porém, sempre havia o gado desgarrado que exigia uma saída da rota para buscá-lo.   

E este era o temor: adentrar nos alagadiços da atual reserva ecológica do Taim!

Anoitecer no Taim. Acervo: Autor. 

Os tropeiros que passaram pela região relatavam sons estranhos e vultos não identificáveis que vagavam durante a noite. Muito pior que estas estranhezas era quando o tropeiro adentrava o banhado e não retornava. Normalmente não era mais visto, pois, não faltava jacarés para desaparecer com um corpo no fundo das águas. Às vezes que o tropeiro foi encontrado ele estava virado num punhado de ossos e esvaziado de seu conteúdo líquido: fora drenado por algum animal! Mas que animal seria este que vivia naqueles amplos banhados que faziam com que o olhar se estendesse até o horizonte do Oceano Atlântico?

No Taim, algo chamava a atenção destes condutores do gado chimarrão da Vacaria del Mar: este gigantesco viveiro de gado selvagem  que não se restringia ao extremo sul do Brasil, mas, que adentrava na atual Província de Rocha e se estendia até a fortaleza lusitana da Colônia do Sacramento do Rio da Prata.

Este algo era escabroso: capivaras mortas e cujo corpo parecia ter sido sugado, desaparecendo a sua tradicional gordura e o seu líquido vital. Isto era assombroso, pois lembrava muito a aparência que ficavam os míseros tropeiros que também foram encontrados neste estado. Que animal fazia isto com humanos e capivaras? Deveria ser muito forte, pois o óleo de capivara era um fortificante já conhecido da gauderiada. Imagine, sugar uma capivara inteira?

Os primeiros comentários sobre estas ocorrências chegam a São Paulo por volta de 1700 e era uma conversa distante em quilômetros, mas, que deixava tensa às horas do jantar a beira do fogo de chão. Seriam apenas histórias tocadas a goles compassados de cachaça, porém, tinham algo em comum: estavam se repetindo de forma desagradavelmente persistente por décadas a fio, de pai para filho. O garoto paulista que com 15 anos faz sua primeira incursão no mundo das tropas, aos 45, já um ancião, continuava a escutar estas histórias e a ver coisas estranhas demais até para serem ditas em voz alta.

 Inclusive, os soldados dos Dragões do Rio Grande que tinham uma bateria no Taim, faziam de tudo para não irem servir neste local. Mais de um soldado que adentrou o banhado foi encontrado morto, ou, para ser mais exato, foi encontrada uma farda portadora de ossos que reluziam quando expostos ao sol.

Jacaré nadando lentamente num canal do Taim. Acervo: Autor. 

Aos poucos, se tornou um lugar comum conversar sobre as últimas aparições de corpos naquele estado esvaziado de conteúdo, ou, falar em quem desapareceu para nunca mais ou foi encontrado morto. E sempre havia alguém que conhecia o defunto para acrescentar mais alguns detalhes mórbidos à ocorrência insólita.

Um fato não explicado pode gerar uma lenda que será alimentada com novos fatos não explicados, com a inclusão de novos elementos imaginativos e ficcionais. Mas como explicar estes fatos tão persistentes por mais de dois séculos?

Mantenha-se distante dos banhados do Taim! Este era o conselho sempre dado pelos mais experientes nestas perigosas andanças tropeiras. Melhor perder algumas cabeças de gado do que a vida naqueles pântanos onde algo sobrenatural habita.

Este ser desconhecido sugava o líquido de quem adentrava no seu mundo: o banhado. Seria algum bicho que ao sentir fome se acostumou a se alimentar desta forma? Afinal, tantos bichos estranhos foram encontrados neste Novo Mundo que o português foi descobrindo neste infindável Brasil: o que impediria de existir um animal desconhecido e canibal? Até algumas tribos de índios consumiam a carne de seus inimigos!

 Porque não matar para sugar o sangue e a gordura? Depois de 1780 era exatamente o que se fazia com o gado numa charqueada: se drenava até o tutano do pobre vacum! Seria alguma tribo desconhecida que no passado vivera naqueles montículos, ou cerritos, que ainda são visíveis nestes banhados?

Que ser estranho era este que vivia da drenagem das capivaras e que usava os parcos humanos que aí cruzavam como um complemento ou uma sobremesa em sua dieta? Seria só um ou seriam muitos?

O que a natureza terá produzido no banhado do Taim que conseguiu ser ainda mais agressivo do que os seres humanos?

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