Porto do Rio Grande em 1908

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quinta-feira, 24 de outubro de 2019

O COSMOS DE CARL SAGAN

Carl Sagan na série Cosmos. 

          Ao refletir sobre o que é espírito científico o nome de Carl Sagan vem à tona. Inúmeras passagens de seus livros trazem frases elucidativas sobre a longa caminha da história da ciência no planeta Terra. O escritor e bioquímico Isaac Asimov afirmou que Sagan e Marvin Minsky (especialista em inteligência artificial) eram os homens mais inteligentes que ele conheceu. Mas quem foi Carl Sagan?
         Sagan nasceu em Nova Iorque em 9 de novembro de 1934 e faleceu em Seatle no dia 20 de dezembro de 1996. A morte ocorreu por pneumonia tendo por quadro mais amplo um câncer na medula óssea contra o qual ele lutou durante dois anos. Ao longo de sua vida escreveu mais de 600 artigos e livros além de documentários. Parte do imaginário científico dos anos 1980 está fundamentado na série Cosmos (1980) que foi exibida em 60 países e foi assistida por mais de 500 milhões de pessoas. Esta série de treze episódios tendo por trilha sonora a música de Vangelis e outras preciosidades acústicas, analisou a história da Astronomia, do surgimento da vida no planeta, das ideias cosmológicas e das possibilidades da exploração espacial. No Brasil, a estréia da série ocorreu há trinta anos atrás.
Doutor pela Universidade de Chicago, Sagan, atuou como professor de Astronomia e Ciências Espaciais na Universidade de Cornell e participou de projetos em outras instituições como a NASA, onde foi consultor e conselheiro desde os anos 1950, atuando no programa espacial americano. Trabalhou no Projeto Apollo que culminou com a chegada do homem a Lua em 1969 e chefiou o Mariner e Viking, projetos pioneiros na exploração do sistema solar. Participou das missões Voyager e da sonda Galileu. A sonda Voyager (lançada em 1977) ainda está viajando em direção aos limites do sistema solar, encontrando-se a mais de 20 bilhões de quilômetros da Terra. Na Voyager foram colocados discos com informações sobre a civilização no planeta Terra. Temas ligados à formação química e biológica de planetas do sistema solar foram abordados por ele. Na década de 1980, Sagan idealiza e assina um documento em conjunto com outros cientistas como Stephen Hawking e Linnus Pauling, defendendo a continuidade do Projeto SETI (busca por vida inteligente extraterrestre através do uso de radiotelescópios) que teve início com Frank Drake, em 1960. Sagan desenvolveu em seus estudos muitas reflexões no campo da embrionária Exobiologia. 
No livro ‘Cosmos’, o autor faz a seguinte reflexão: “Nosso adorável planeta azul, a Terra, é o único lar que conhecemos. Vênus é muito quente; Marte, muito frio. A Terra é a medida certa, o paraíso para os seres humanos. Além do mais, evoluímos aqui. Mas o nosso clima pode ser instável. Estamos perturbando nosso pobre planeta de maneiras sérias e contraditórias. Haverá algum perigo em dirigir o ambiente da Terra para o inferno planetário de Vênus ou para a era glacial global de Marte? A resposta é: ninguém sabe. O estudo do clima global, a comparação da Terra com outros mundos são assuntos que se encontram nos estágios iniciais de desenvolvimento. São campos pobres onde impera a má vontade. Em nossa ignorância, continuamos a empurrar e puxar, poluir a atmosfera e a poluir a Terra, esquecendo o fato de que as conseqüências a longo prazo são amplamente desconhecidas. (...) Nossa inteligência e tecnologia deram-nos poder de afetar o clima. Como usaremos este poder? Desejaremos tolerar a ignorância e a complacência afetando toda a família humana?”.  O livro é de 1980 e três décadas depois a emissão de CO2, proveniente da queima de combustíveis fósseis, só tem crescido frente a um processo de produção industrial cada vez mais intenso.
Somente de 1990 a 2012 as emissões aumentaram em 50% e continuam em elevação. A indústria chinesa, modesta em 1980, atualmente é a maior emissora de CO2 do planeta seguida pelos EUA, Índia, Rússia, Japão e Alemanha. Tem sido infrutíferos os esforços da ONU para limitar a emissão de CO2 evitando o aquecimento global superior a 2°C em relação ao início da era industrial (na segunda metade do século XVIII). Sagan já levantava o problema do aquecimento global e suas conseqüências para a sobrevivência da espécie humana. Também começou a questionar um país que cresce em ritmo vertiginoso e ameaça a geopolítica e a sustentabilidade do planeta: a China. 
Em seu último livro ‘Bilhões e Bilhões’, foi feito um relato dos diálogos finais  travados entre Sagan e sua esposa, a pesquisadora Ann Druyan. Foram dois anos de luta contra o câncer que encerraram no dia 20 de dezembro, há 16 anos atrás: ‘É uma vigília da morte’, Carl me disse calmamente: ‘Vou morrer’. ‘Não, protestei’. ‘Você vai vencer desta vez, assim como já venceu antes, quando tudo parecia sem esperança’. Com uma mistura de fino bom humor e ceticismo, mas, como sempre, sem nenhum vestígio de autopiedade, disse ironicamente: ‘Bem, vamos ver quem tem razão desta vez’. (...) Ao contrário das fantasias dos fundamentalistas, não houve conversão no leito de morte, nenhum refúgio de última hora numa visão consoladora do céu ou de uma visão após a morte. Para Carl, o que mais importava era a verdade, e não apenas aquilo que poderia fazer com que nos sentíssemos melhor, afirma Druyan. Em outro texto ela faz outro comentário reflexivo sobre a obra do esposo: “Em minha estimativa parcial, ele era uma figura histórica mundial que nos incentivou a deixar a espiritualidade geocêntrica, narcisista, ‘sobrenatural’ de nossa infância e abraçar a vastidão — amadurecer ao tomar as revelações da revolução científica moderna de coração”.   

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