Francisco Riopardense de Macedo é o autor do livro Ingleses no Rio Grande do Sul (Porto Alegre: A Nação, 1975), onde elaborou um panorama geral da presença inglesa, especialmente nos séculos 18 e 19, no extremo sul do Brasil.
Com referência neste livro será destacado apenas alguns, dentro de um universo maior, personagens e projetos relativos a experiências históricas envolvendo ingleses na cidade do Rio Grande.
Talvez a referência mais antiga da presença de ingleses em Rio Grande remonte aos tempos da Comandância Militar do Rio Grande, em fevereiro de 1742, quando os náufragos do navio Wager conseguem entrar na barra do Rio Grande ficando sob a proteção do comandante coronel Diogo Osório Cardoso. De suas malogradas experiências com o naufrágio do navio em que estava, John Cummins elaborou posteriormente um livro relatando diversos acontecimentos, entre os quais, a Revolta dos Dragões que eles presenciaram logo após a sua chegada a Rio Grande.
Uma das referências mais antigas a participação de súditos ingleses em Rio Grande remonta ao oficial da Marinha Britânica George Hardcastle, que fora contratado por Portugal para operações navais na operação do Exército do Sul de reconquista da Vila do Rio Grande de São Pedro sob domínio espanhol desde 1763. Não teve sucesso em sua atuação de 1775. Já o nome de William Robert Macdonall, comandante das naus de guerra portuguesas na América, participou das operações navais que garantiram a retomada da Vila do Rio Grande no dia 1º de abril de 1776.
O armador inglês James Harrison elaborou trabalhos em 1836 e 1838 trazendo detalhes sobre o funcionamento da Barra do Rio Grande para os navegantes, destacando os bancos de areia que levavam a constituição de cemitérios de navios. A relevância do seu trabalho para a segurança da navegação na barra diabólica foi destacada até a metade do século 19.
Conforme expresso por Riopardense de Macedo, na verdade os ingleses que primeiro chegaram ao Rio Grande do Sul para se radicarem, estavam na condição de empresários, fosse de empresas públicas, fosse de empreendimentos particulares. A cidade do Rio Grande chegou a ser um centro de navegação sul-americana. Os passageiros da Inglaterra vinham tratar dos seus interesses pelos ‘transatlânticos da Lamport and Holt’s Line que permaneciam trinta horas ali, para depois seguirem a Montevideo. Além desta linha, que também fazia escala no Rio de Janeiro, outras havia entre Rio Grande e Porto Alegre. Estas faziam escalas em povoações de significação no conjunto da economia rio-grandense: Pelotas, Jaguarão e alguns portos da Lagoa dos Patos e Mirim. O mais importante dos vapores lacustres em tráfego pela Lagoa dos Patos era o Guaíba, construído em Clyde pelos Proudfoot & Co., a grande empresa identificada com o comércio e o progresso do Rio Grande da segunda metade do século 19.
A cidade do Rio Grande, na margem sul do canal que liga a Lagoa dos Patos com o Oceano Atlântico, por sua posição e centro de área econômica de grande importância, concentraria no começo do século 19 o maior número de estrangeiros interessados no comércio e na navegação. É o caso do comerciante John Luccock que esteve na cidade no ano de 1809 e deixou um precioso registro de suas observações da localidade. Apesar de pequena, a comunidade de comerciantes ingleses começava a se formar a ponto de ser criado um pequeno clube inglês, como relata Luccock. No ano de 1844, quando da criação da Câmara de Comércio, a firma Proudfoot, Meira e Moffat assinava a primeira ata. Essa associação comercial criada em 30 de setembro de 1844 lutava pela melhoria das condições que facilitassem o comércio, desde a barra e o canal da barca até a melhoria dos meios de comunicação e depósitos. Três anos após a fundação, nome das firmas inglesas Thomas Pacy Aveline, Holland Davies Co. e G. T. Wigg constavam na lista de exportação de produtos oriundos da pecuária. A consolidação do comércio de exportação e importação cresceria com o final da Revolução Farroupilha.
Dentre os comerciantes mais destacados está John Proudfoot, nascido em Glasgow, que fez fortuna no Rio Grande do Sul. Em 1862 teve a ideia de fazer do Rio Grande e do litoral gaúcho uma grande fazenda de plantação de algodão. Tentou implementar o projeto em São José do Norte, com experiência inicial no Cocuruto. O projeto não teve continuidade. Outro projeto foi a da construção de uma fábrica de tijolos de areia a qual só ocorreu no início do século 20, em São José do Norte. Este tipo de tijolo teria sido empregado na construção da Swift, não sendo usado reboco e mantendo por décadas um bom estado de conservação. A casa comercial de Proudfoot ficava na rua Pedro II, na cidade do Rio Grande, atual rua Marechal Floriano e era dos prédios mais ricos daquela zona, avaliado em 30.000 libras esterlinas. Proudfoot, tinha empresas de telégrafo, companhia de gás, estradas de ferro. Em 1873, fundou as linhas de barco a vapor entre Rio Grande e Porto Alegre, cujos navios foram construídos em seus estaleiros em Glasgow. Dois anos depois, morreu solteiro e milionário, deixando sua fortuna para um sobrinho.
Enquanto um inglês Henry Law elaborou ha 150 anos atrás (agosto de 1861) um projeto para construção de dois molhes curvos e um porto na atual cidade de Torres, o eng. Sir John Hawskshaw, em 1875, propôs uma solução para o pequeno calado da Barra do Rio Grande: a construção de quebra-mares partindo do litoral para o oceano e dispostos de um lado e outro da barra. Estava lançada a ideia que levou a construção dos Molhes da Barra que viabilizou a estrutura portuária que a cidade possui no presente.
O fornecimento de iluminação a gás para a cidade também foi obra de ingleses no ano de 1871, com a criação da São Pedro Brasil Gás Company. O gás dependia do carvão e tinha em James Johnson, um pioneiro da mineração no Rio Grande do Sul, o qual viabilizou a exploração do carvão em São Jerônimo e Arroio dos Ratos.
Várias empresas de exportação e importação atuaram na cidade e inclusive o Banco de Londres esteve estabelecido em certo período no prédio do Sobrado dos Azulejos. Conforme Riopardense de Macedo, Rio Grande, na segunda metade do século 19, aumentava sua importância como centro de quase toda área sul da Província. Esta situação conferia-lhe posição privilegiada entre as demais povoações naquele fim de século, sendo sede de consulados que em Porto Alegre apenas mantinham vice-consulados e recebendo serviços públicos antes ou quase ao mesmo tempo em que a capital da Província.
A imagem de arte cemiterial aqui destacada é de John Proudfoot enterrado no cemitério de Dumbarton em cuja lápide está escrito: Sacred to the memory of John Proudfoot, Merchant, Liverpool, Rio Grande do Sul, and Monte Vídeo, who died at Liverpool on the 7th of March 1875, Aged 64 years.
Acervo: http://www.geograph.org.uk |
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