Desde o
surgimento do balneário Cassino em 1890, os anúncios de trajes de banho se
fazem presente em sintonia com a moda das mais famosas praias européias.
Inicialmente, os trajes buscavam garantir o banho de mar medicinal e “esconder
ao máximo o corpo dos banhistas”. A estética do corpo deveria ser subordinada a
utilização de roupas que apenas permitissem o exercício da imaginação dos
olhares, mas sem a exposição da epiderme e da morfologia. O banho de mar era
feito com uma calça até os tornozelos (calção bufante) e uma túnica comprida
que cobria todo o corpo. A nadadora australiana Annette Kellerman foi presa nos
Estados Unidos em 1907 por usar um maiô de uma peça que ficava colado ao
corpo.
Na década de 1920,
o comportamento feminino passa a apresentar novas facetas com o movimento
feminista, a busca pelo sufrágio universal e o questionamento do padrão de
vestir do Belle Époque e do paradigma “rainha do lar”. O cabelo curto, a
redução do tecido usado para os vestidos levou a diminuição do seu peso e
volume, surgem influências de vestir do orientalismo árabe e se consagra o
ícone da moda “Chanel”, com uma forte dose de elegância e às vezes de
mascunilinização no vestuário. Na praia surgem os macaquinhos de malha e as
sapatilhas e meias compridas para uso na beira-mar.
A partir da década
de 1930 os trajes se encurtam mais um pouco, ficando mais colados e curtos nas
pernas surgindo um saiote para cobrir os quadris. Já na década seguinte,
durante a Segunda Guerra Mundial, o maiô se emancipa do saiote que restringia
os olhares e expõe as curvas femininas. Na
década de 1950 preponderam as duas peças para o traje de banho, porém pouco
cavadas como se observa em filmes desta década estrelados por Marylin Monroe.
Porém, em 1946 surgiu o famoso biquíni, um apelido dado devido ao teste nuclear
no Atol de Biquíni e numa analogia de que pouca roupa sobraria após uma
explosão atômica. Este “monumento cultural brasileiro”, foi criado na França
por Louis Réarde e como nenhuma atriz queria fazer a sua divulgação pública,
Réarde contratou a stripper Micheline Bernardini para desfilar o novo modelo.
Até para ela era uma exposição escandalosa demais (pois o umbigo ainda não
poderia ser mostrado) e somente no início dos anos 1960 é que o biquíni se
popularizou com atrizes como Ursula Andress (no filme 007 “O Satânico Dr. No”)
e na extrovertida atriz Brigitte Bardot. As imagens de pin-ups que preenchiam o
imaginário masculino desde a década de 1940, abandonam o maiô e passam a usar o
biquíni!
É o biquíni que começa a comandar os anos 1960 (ainda tentando romper o
pudor como no música americana “Biquíni de Bolinha Amerilinho” adaptado por
Cely Campelo), década da contracultura e da libertação sexual com a difusão da
pílula anticoncepcional e o “equilíbrio do terror entre procriação e desejo”.
Mostrar o corpo vai se tornando obrigatório e não escandaloso! Dos trajes que
ocupavam uma mala inteira em 1900 agora o traje de banho poderia se levado na
palma da mão e isto se manteve nos anos 1970 quando surge o modelo tanga, com
cintura baixa e amarrado dos lados.
Porém, se a França criou o biquíni, foi o Brasil que o saboreou
culturalmente, pois americanas e européias até hoje são mais discretas na
utilização das peças demasiadamente pequenas na cintura. Aceitam com
naturalidade até o topless, mas os glúteos ainda são fator de pudor. No Brasil,
no final dos anos 1970 formas de reduzir a peça continuam a ser pensadas
diuturnamente e se enrola as laterais do biquíni para ficarem mais cavados, o
famoso “enroladinho”. A imaginação das cariocas que desfilavam seus corpos
ávidos de sol pelas praias do Rio de Janeiro e criavam a “matriz disciplinar de
quanto mais bronzeado melhor” (com direito a bronzeadores como “raíto del sol”
e produtos caseiros – óleo de amêndoas, urucum, margarina etc -, para produzir
a cor tropical) difundiu a estética da torração epidérmica até nos confins do
Brasil Meridional. Na década de 1980 surge o idolatrado traje do biquíni
asa-delta, que buscava alongar a cintura e aumentar a dimensão dos glúteos,
evidenciando a anatomia privilegiada tupiniquim. Ainda nos anos 80, a criatividade
avançou para a criação do modelo fio dental que exige curvas arrojadas e pele
firme. Esses modelos são basicamente banidos em praias da Europa.
No Brasil, o último passo previsto desta caminhada seria o abandono
completo das roupas de banho e o nudismo. Porém, os anos 1990 fizeram, num
caminho inverso, a peça ser ampliada e surge o sunquíni (sunga por baixo, top e
camiseta por cima), num retorno as duas peças da década de 1950 e na ampliação
da cobertura do corpo. As perspectivas da elegância e com a preocupação dos
resultados de um excesso de miniaturização do biquíni passam a se ampliar e a
praia passa a conviver com os mais diferentes estilos e tamanhos. A certeza é
que ainda não chegou à hora da completa abolição dos trajes de banho, apesar da
atual selvageria pós-moderna funk e a crise de valores ético e morais, que
cobre da grande política até a beira-mar, seja ainda a moeda circulante na
terra brasilis.
Atualmente,
entre estéticas para todos os gostos a praia conta com tudo: morfologias diferenciadas
sendo torradas pelo Astro Rei, cujos raios ultravioletas tem projetado Rio
Grande como uma das capitais mundiais do câncer de pele. Na praia se encontra
um espaço democrático num flash de olhos e avaliações subjetivas, num atrair e
repulsar na informação dos neurônios. A nudez total ainda chamaria a atenção,
mas os outros limites de tamanho das indumentárias já foram superados num
universo em que a sedução dos trajes muitas vezes está voltada ao explícito
excessivo e de gosto duvidoso. Numa comparação com os primórdios dos banhos de
mar, as vestimentas atuais são incomunicáveis com os padrões da Belle Époque
dos anos 1900, quando o Balneário Cassino completava apenas 10 anos de idade.
Trajes de banho no século XIX. |
Annette Kellerman com o primeiro maio em 1907. Foi presa no ano seguinte pois a peça foi proibida. |
Praia dos Estados Unidos em 1922. |
Primeiro biquini (1946) |
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