O tráfico de escravos
era uma atividade sistemática desde o século XVI no Brasil. Em Rio Grande, o
jornal O Noticiador (1832-35) publicava matérias denunciando que o tráfico
continuava ativo, apesar das proibições que ocorrem a partir de 1831 com a
pressão diplomática da Inglaterra. O argumento dos traficantes é que os
escravos já haviam chegado ao Brasil antes desta data, não fazendo parte de um
comércio pelo Atlântico cuja origem era o continente africano.
No ano de 1839
ocorreu um episódio que teve grande repercussão envolvendo o tráfico oriundo da
África. Em 27 de junho de 1839, a embarcação espanhola La Amistad partiu de
Havana (Cuba) para Porto Príncipe. Cinqüenta e três escravos africanos da Serra
Leoa estavam a bordo e foram comprados por dois fazendeiros espanhóis, numa
atividade ilícita frente à legislação da época. No dia 2 de julho tem início um
motim em que o cozinheiro e o capitão da embarcação são mortos. Os outros
tripulantes são feitos prisioneiros e forçados pelos escravos amotinados de levados
de volta a África. De fato, os tripulantes rumam para a costa dos Estados
Unidos onde lançaram âncora na costa de Long Island em 26 de agosto. Sem água e
suprimentos alguns africanos tentaram chegar a terra e foram presos pela Guarda
Costeira. O tenente Gedney os levou a Connecticut para lucrar com a venda dos escravos
(nesta localidade ainda era questionada a legislação anti-tráfico da
África).
Sendo acusados de
assassinato teve início um processo judicial que teve desdobramentos
surpreendentes. A Corte Federal dos EUA, em 1840, considerou ilegal o tráfico
de escravos pelo Atlântico e eles deveriam ser considerados como homens livres,
podendo recorrer a força para se libertarem dos algozes (inclusive cometendo os
assassinatos). As discussões prolongaram-se e o ex-presidente John Quincy Adams
defendeu os africanos da acusação de motim e assassinato pois eles não poderiam
ser considerados como escravos e na condição de homens livres deveriam lutar
por sua liberdade. A Suprema Corte dos EUA, apesar das pressões políticas, deu
ganho aos africanos em março de 1841. Apesar de vários morreram na prisão ou
durante a viagem de retorno, trinta e cinco deles retornaram a África e
buscaram retomar as suas vidas após chegarem a Serra Leoa em janeiro de 1842. O
tema foi tratado num magistral filme de Steven Spielberg ‘Amistad’.
Dos milhões de
africanos tirados daquele continente, poucos retornaram ao longo dos séculos, porém
tinha sido formalizada uma brecha jurídica que alimentaria os questionamentos
sobre o suposto estatuto natural da escravidão. As lutas abolicionistas se
intensificariam e no Brasil teriam incremento na segunda metade do século XIX.
Porém, a escravidão no Brasil seria abolida somente em 1888, ou seja, quase
meio século após os acontecimentos do Amistad.
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