No mês de fevereiro de 1937, Rio Grande desenvolveu uma ampla programação comemorativa aos 200 anos de sua fundação. Uma das atividades realizadas foi o descerramento de uma placa que buscava eternizar o local onde foi edificada a Casa dos Governadores.
A denominação ‘Casa dos Governadores’ existe na
documentação desde o século XVIII e refere-se ao espaço físico onde surgiu o
poder administrativo público que
comandava todo o Rio Grande do Sul português e não apenas o que hoje constitui
o município do Rio Grande. Quando, a partir das orientações do Conselho
Ultramarino português, o brigadeiro José da Silva Paes efetiva a fundação do
Rio Grande teve início a Comandância Militar (1737). O aviso de 13 de agosto de
1760 do Conde de Oeiras ao general Gomes Freire de Andrade comunica a criação
da Capitania do Rio Grande de São Pedro e a nomeação de Ignácio Elói de
Madureira para primeiro governador. Encerrava a Comandância Militar iniciada
por Silva Paes e cujo último comandante foi o Tenente-Coronel Pascoal de
Azevedo que havia sido encarregado do comando pelo Vice-Rei em 28 de junho de
1752 (fonte: Revista do IHGB, volume 23, 1860). Com a invasão espanhola em 1763
a Casa dos Governadores é utilizada pelas tropas castelhanas e consta enquanto
espaço edificado no Plano da Vila do R. Grande de autoria de José Custódio de
Sá e Faria, 1767 (Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro). Quando da retomada da
Vila pelos portugueses em abril de 1776, o diário do Ten-General Heinrich Bohn (Mémories Rélatifs
à l’Expédition au Rio Grande) registra a existência desta edificação.
O prédio ocupado pela Câmara Municipal dos Vereadores (a
primeira do Rio Grande do Sul) ficava ao lado da Casa dos Governadores (que
estava em ruínas em 1851). A rua Comendador Pinto Lima era chamada de rua do
Palácio e posteriormente rua da Câmara. Com a mudança da Câmara Municipal para
o prédio construído a partir de 1847 e ocupado em 1850 (no local onde hoje está
edificada a Biblioteca Rio-grandense), a rua passou a ser chamada de rua da
Câmara Velha. Esta rua foi calçada no ano de 1874.
Matéria publicada na segunda página do Jornal Rio Grande
no dia 24 de fevereiro de 1937 (acervo da Biblioteca Rio-grandense), evidencia
a importância que a comunidade local dava para este local onde surgiu o poder
público no Rio Grande do Sul.
“Inauguração da placa da Casa dos Governadores. Trata-se
de uma placa de bronze, de feliz inspiração, nos símbolos que a integram e no
conjunto de desenho, devido ao lápis hábil do sr. Procópio Netto, e aprecível
ainda pela correção da modelagem e cunhagem, tudo feito nesta cidade. Tem a
placa os seguintes dizeres: ‘A cidade, em seu bicentenário, memora foi aqui a
Casa dos Governadores, primeira sede do Governo da Capitania do Rio Grande do
Sul, 19 de fevereiro de 1737-1937’. Foi a mesma colocada a face a rua General
Bacellar do prédio da mesma rua esquina do Conselheiro Pinto Lima, lugar exato
em que se levantava a Casa dos Governadores. O ato inaugural deu-se às 16
horas, perante muito povo e com a assistência do mundo oficial, no qual se
notavam os seus comandantes Cerqueira e Souza, repesentante de S. Ex. o sr.
Presidente da República, da Prefeitura Municipal, presidente e vereadores da
Câmara Municipal, dr. Promotor Público da Comarca, presidente e membros da
Comissão Central dos Festejos etc. O orador oficial foi o sr. Álvaro Prates de
Lima que expôs à assistência os fundamentos históricos que serviram para
identificar o local da primeira Casa de Governo do Rio Grande do Sul capitania,
e exaltou as conquistas do progresso da nossa cidade, nas suas indústrias e no
seu comércio sob os aspectos da instrução, da higiene e da assistência social,
recebendo, ao finalizar o seu patriótico discurso, muitos aplausos. O sr dr.
Meirelles Leite, a seguir, declarou que se tratando de uma memoração a primeira
Casa de Governo do Rio Grande do Sul passado, aquela casa, portanto, onde
primeiro se praticaram os atos administrativos, conforme as leis, ao direito e
a justiça, convidava a descerrar a placa, que se achava encoberta com a
bandeira nacional da histórica Matriz de S. Pedro, da mesma época da Casa dos
Governadores ao sr. dr. Paula Cardoso, como presidente da sub-secção local da
Ordem dos Advogados do Brasil, o que aquele ilustre patrício fez sob calorosos
aplausos da multidão. Durante a cerimônia tocou a banda do 9° RI”.
Esta placa em bronze hoje é fator de litígio entre o
interesse público e o interesse comercial mas evidencia a necessidade de
ampliarmos a consciência da importância em pensarmos a cultura material –
inclusive esta placa -, como vestígios do passado que expressam a caminhada de
uma comunidade. Num período em que o patrimônio material tem sido alvo de
depredações e desaparecimentos (bustos, esculturas, placas somem dos espaços
públicos...), frente a esta morte premeditada de uma materialidade legada por
gerações anteriores ao somatório de imaginários que constitui a memória de uma
sociedade, não podemos silenciar e esperar que o fato se consuma. Afinal, o
conhecimento da história e a educação patrimonial são ferramentas essenciais
para a definição de identidades no presente.
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