Porto do Rio Grande em 1908

Porto do Rio Grande em 1908

sábado, 4 de junho de 2022

O MENINO GUARANI

Auguste de Saint-Hilaire. 

 O botânico francês Auguste de Saint-Hilaire deixou registrado em seu diário a "adoção" de um menino guarani quando de sua passagem pelo Rio Grande do Sul no ano de 1821. 


O menino Pedro ficou perpetuado num registro do Diário de Saint-Hilaire (Viagem ao Rio Grande do Sul). Qual terá sido o seu destino futuro?


"Referi, neste diário, que o Conde Figueira se fazia servir por um pequeno índio que aprisionara em Taquarembó e que, anteriormente, era oriundo das tropas de Artigas. O conde achava que, como eu levava para a França um índio do Norte do Brasil, seria necessário também que, para comparação, eu levasse um do Sul, tendo a gentileza de me oferecer seu indiozinho. Sentindo que ele demonstrava grande afeição ao menino, recusei. No momento, a ideia do conde me alegrara e acabei aceitando uma carta sua para o Marechal Chagas, pela qual recomendara a este dar-me um pequeno guarani. Eu hesitava se faria uso dessa carta; no entanto, encontrando-me tão mal acompanha do, com pouca distração em viagem, vendo sempre fisionomias descontentes, decidi pedir um peão ao Coronel Paulette, na esperança de um menino corresponder a meus anseios, sorrir-me, testemunhar-me algum afeto e me servir de  distração. Disse ao coronel que desejava apenas um refugiado espanhol, órfão de pai e mãe. Ele encontrou em São Borja um menino bem como eu queria: com oito ou nove anos e uma figura agradável e espiritual; seus pais haviam morrido durante a guerra; atravessou o Uruguai com outro índio espanhol que dele se apiedara. O pobre pequeno estava inteiramente nu e como eu dera algum dinheiro à pessoa que dele cuidara até então, fiz, ao mesmo tempo, dois benefícios. Desde o primeiro momento, o pequeno Pedro demonstrou grande desejo de me agradar, interesse em servir-me e vontade de tudo fazer, mesmo o que estivesse acima de suas forças. Do segundo ou terceiro dia em diante, tenho-o levado comigo nas excursões ao campo. Ele me diverte por sua graça; ajuda-me a colher sementes; corre atrás dos insetos e me traz as flores que encontra. Esta criança demonstra a vivacidade e a curiosidade de um europeu, e soma a ternura e a docilidade característica de sua tribo. Chora todas as vezes que lhe dizem que se vai separar de mim, mas é raro verter lágrimas quando ofendido; deita sempre sobre uma de minhas caixas, enrolado numa simples coberta; come em geral muito, mas pouco se queixa quando nada lhe dão. Ensinei-o a recitar o Pater em francês; já entende tudo em português e começa a falar essa língua". In: Saint-Hilaire, Auguste de, 1779-1853. Viagem ao Rio Grande do Sul / Auguste de Saint-Hilaire ; tradução de Adroaldo Mesquita da Costa. -- Brasília : Senado Federal, Conselho Editorial, 2002.

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