Um dos palestrantes era de Porto Alegre e se chamava Ricardo Holmer Hodara. A figura perfeita para quem procurava um gênio: inteligente ao extremo, com linguagem técnica de físico e químico, delírios de fenomenologista husserliano, expressão facial de gênio matemático. Era o cara...
E era um ótimo palestrante que falava com extrema simplicidade dando explicações fundamentadas em que ao final não decifrava uma palavra. Era tudo o que se esperava! Ele entendia e dialogava sobre objetos e fenômenos que os leigos da platéia (olha eu aí) não tinha a minha noção de existir... Mas delirar era bom demais para tirar a cabeça da mesmice.
No mesmo ano de 1982 fiz amizade com um estagiário responsável pelo Observatório Astronômico da UFSM. Na época ele cursava Geografia e na sequência fez Mestrado em Sensoriamento Remoto no INPE. Grandes descobertas e conhecimentos despontaram a partir da Astrometria. Passei a dormir com o Atlas de Astronomia do Ronaldo de Freitas Mouras na cabeceira e o frenesi foi crescendo. Quando crescer quero ser astrônomo!
Ou seja, com os pensamentos "no mundo da Lua" fiz concurso para Física no Vestibular de 1983. O incrível é que passei: das 30 vagas fiquei em décimo oitavo, mesmo sem ter estudado nada. Beleza seria correr para o abraço juntando História e Física. Realmente, em apenas um ano, corri... só que na direção do trancamento do Curso tamanha a surra que levei das disciplinas de Física, Matemática e Química.
O meu Tico e Teco não foi feito para a linguagem matemática. O resultado do esforço concentrado foi acabar no hospital com uma junta médica querendo colocar um marcapasso no lado esquerdo do peito. Felizmente, desistiram da ideia... Mas o "boletim" com as notas das disciplinas do Curso de Física foi trágico, para não dizer, congelante. Reconheci que "quando Deus me desenhou ele não estava pensando nos segredos químicos, físicos e cosmológicos do Universo...".
Enquanto estou esticando a história até o esgotamento, está na hora de trazer o personagem principal para este relato/lembrança: o brilhante palestrante Ricardo Hodara veio para Santa Maria e começou a cursar Física. Era colega na minha turma. Já imaginava um diploma na parede da posteridade: a turma histórica que se formou com o Hodara. Imaginem, o que aprenderia neste convívio até o final do Curso... A "Escola Cosmológica do Hodara e a Inteligência Artificial no Terceiro Milênio". Palestras em Harvard e Cambridge. Pappers publicados no MIT.
Diga-me com quem andas e saberás o nível da tua ignorância. Estaria iluminando minhas fraquezas intelectuais com a fonte inesgotável da sapiência.
E a lenda só aumentou durante uma aula de Química Orgânica. A professora havia colocado uma questão no quadro e estava respondendo a equação que já ocupava quase todo o gigantesco quadro. Atentamente Hodara olhou para o quadro e disse: a senhora poderia inverter os fatores tais e tais e poderá chegar ao resultado economizando 80% das equações (do seu tempo e da nossa paciência, pensei eu)? Ela parou de psicografar e achou que era uma pegadinha e pediu que ele repetisse. Sem sair do lugar, apenas esticando sua barba alguns centímetros para a frente, pediu que ela apagasse tal equação, aplicasse outra fórmula, invertesse os fatores tal e tal (desse 3 pulinhos, pensei eu): o resultado foi chegar ao resultado correto enquanto a docente retomava o cálculo dizendo que era inviável aplicar aquelas fórmulas. Relutou, mas, teve que aceitar os fatos matemáticos são os inúmeros inquestionáveis na face do planeta. Naquele momento no fã clube do Hodara haviam ingressado mais uns 60 alunos da Física e das Engenharias que cursavam a disciplina e lotavam o recinto. Por educação à docente, ele não foi carregado nos ombros dos ululantes acadêmicos das ciências exatas. Mas o desejo era esse como se fosse o prólogo de um filme slasher dos anos 1980.
O problema se tornou a lotação em volta do objeto do desejo, pois, alugavam o gênio 24 horas por dia e as aproximações se tornaram muito difíceis para escutar as palestras espontâneas do novo "Platão com pitadas de Kant" enquanto caminhava pelos corredores e os pensamentos eclodiam enfaticamente.
O texto reproduzido do Boletim da Sociedade Astronômica Rio-Grandense foi escrito pelo Ricardo Hodara no mesmo ano, 1982, em que ele palestrou em Santa Maria. A forma da escrita permite uma ideia do estilo e temáticas de suas palestras.
Agora o mais inusitado: o potencial formando em Física desistiu do Curso. Pesquisando no Currículo Lattes a sua área de formação foi a "Psicologia - Licenciatura" (UFRGS), o Mestrado foi em "Linguística e Letras" (PUCRS) e o Doutorado em "Ciências Cognitivas" (UFRGS). Ele também tem formação como "Psicólogo Clínico" e Especialização "Clínica em Genética e Psicologia".
Literalmente, era alguém diferenciado e completamente surpreendente que migrou das ciências exatas para as ciências da mente. Para ser mais preciso e não distorcer, acredito que ele dialeticamente não migrou mas viaja entre as fronteiras dos saberes das diferentes áreas do conhecimento.
Personagem lendário que continua na ativa produzindo e criando. Grande satisfação ter feito esta descoberta da riqueza da caminhada deste breve colega da UFSM cuja memória não ficou perdida.
Quem necessita de um psicólogo clínico especializado em transtornos de aprendizagem de base genética e de como o conhecimento se organiza no cérebro humano pode contactar o especialista: psicologohodara@yahoo.com.br
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