Porto do Rio Grande em 1908

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sábado, 7 de novembro de 2020

SHARAZ-DE - HQ

 

TOPPI, Sérgio (roteiro e arte). Sharaz-de: contos de as Mil e uma Noites. Porto Alegre: Figura, capa dura, p&b e color, 21,5 x 29,7cm, p. 160, 2016. 


Resenha: 

"Foi nas páginas de Sharaz-De que Toppi consolidou um estilo no qual cada página ganha a dimensão de uma obra de arte, onde as ilustrações dão um ritmo fluído a narrativa. Sendo realmente difícil chamá-la de história “em quadrinhos”, o italiano possivelmente fundou alguns conceitos do que viria a se conhecer por “novela gráfica”. A trama de As mil e uma noites, um dos grandes clássicos da literatura mundial, mostra a princesa Sharaz-De que, refém de um rei tirano, busca postergar sua morte contando a cada noite, um novo relato cheio de fantasia. São contos povoados por reis poderosos, gigantes, demônios e mulheres encantadoras, elementos que marcam o fascínio pela cultura árabe. Esta edição – que traz Toppi de volta ao Brasil depois de uma ausência de 40 anos – ganhou dois prêmios no Troféu HQ Mix de 2017: "melhor adaptação em quadrinhos" e "melhor publicação de clássico".

A arte de Sérgio Toppi já vale a visita a esta HQ. O roteiro é uma adaptação de alguns contos populares do Médio Oriente e Sul da Ásia que foram compilados para formar As Mil e uma Noites. Estes contos foram reunidos em língua árabe no século IX e se tornaram conhecidos no Ocidente com a edição francesa de 1704 publicada por Antoine Gailland (com grandes deturpações na tradução). 

As Mil e uma Noite acabou ficando com três vertentes: persa, indiano e árabe. Toppi concentrou sua escolha de contos na vertente mais voltada ao folclore persa.  Todas as histórias tem um caráter moral referente a comportamentos desumanos ou egos excessivos. Fundamental é que o centro do processo onde as histórias derivam é o da fala feminina: ela constrói a expectativa, dota os personagens de palavras e ações, fecha a narrativa com a perspectiva de que muito fluxo de imaginação/realidade ainda estava por vir na noite seguinte ao relato. E Sharaz-De apostava resignadamente a sua vida no poder sedutor de sua imaginação. 

Estes contos foram escritos por autores anônimos e transmitidos oralmente por gerações. Isto foi feito, antes da primeira sistematização no século IX. Imagino que a mais de 1.200 anos, entre a Pérsia e a Índia, uma caravana está a volta do fogo, cercada pelas dunas do deserto, seus integrantes exercendo a oralidade e ampliando e modificando os contos transmitidos por seus pais e avós. Deste manancial criativo e mutável foi se construindo As Mil e uma Noite. Digo isto pois para a pressa atual na absorção textual e dos grafismos, a HQ poderá ser monótona, repetitiva, moralizante, pouco impactante...  

Construções e reconstruções de obras coletivas tão antigas é uma forma de viajar no tempo, para outras temporalidades e bucolismos. De curtir e dar voz a outras culturas. 

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