Tudo, 15-10-1919. Acervo: Biblioteca Rio-Grandense. |
Quem conhece?
Eu conheço muito bem! Claro, não neste tempo da fotografia ou seria Matusalém que está escrevendo. Conheci foi a Praça Saldanha Marinho dos anos 1970-1980. É um dos cartões-postais do centro de Santa Maria, o "coração do Rio Grande".
Com surpresa encontrei esta fotografia de Santa Maria e que foi publicada na revista Tudo (editada em Rio Grande) no dia 15 de outubro de 1919. É a praça há um século atrás e ela se manteve preservada e intocada pelo tempo: na fotografia...
Até que me provem o contrário, fotografias antigas são portais para viagens mentais e para reflexões sobre as modificações espaciais, civilizatórias e para frear a marcha do tempo que vai inclusive apagando as memórias pessoais. Olhar para um momento congelado do tempo traz de volta os fragmentos de experiências de vida que foram preservados aleatoriamente no HD cerebral.
Lembro desta praça nos anos 1970, com outras árvores, bancos, lajedos, iluminação e ajardinamento. Seus frequentadores em 1919 se inserem em outras modas, tecnologias, relações sociais e construções culturais. Aquilo que vi e guardei na memória, já deve ter se modificado no presente pois, transcorreu quatro décadas e meia em que construí as memórias.
O tempo transcorre inclemente e as experiências de vida registram um pouco desta passagem. Além da espacialidade dos lugares mudar frente as técnicas e decisões políticas, as pessoas fazem releituras dos espaços e edificam memórias a partir da importância das experiências que foram vividas.
O cérebro é um depositário da ilusão de ruptura do fluxo do tempo ao preservar a nitidez de certas experiências passadas como se fossem no presente. Infelizmente, desde que algum insano inventou o espelho, o tempo assumiu sua verdadeira face de transitoriedade e de fragilização biológica do passante: diga-se que a transitoriedade não é a do tempo o qual não tem início, meio e fim; os marcos da passagem estão na fisiologia que construiu nossos corpos que se desintegram lenta ou apressadamente.
Desculpem-me os budistas, mas agradeçamos ao nosso cérebro que nos possibilita esta ilusão da perenidade, da preservação dos fragmentos do que vivemos, que garante que mantenhamos uma identidade que nos distingue da massa bruta da natureza silenciosa. Talvez, a indissociabilidade da natureza silenciosa fosse menos dolorosa, mas, no fundo, como viver sem as dores do mundo?
O cérebro, trabalhado pela linguagem, nos possibilitou que a extensão dos dedos transpusesse o silêncio da palavras que morrem nas vozes que se esvaem. A forma de preservar, mesmo que ilusória, estão nos escritos que foram trabalhados geneticamente por inúmeras gerações de antepassados muito distantes.
As vozes do presente, preservadas em fontes escritas, em materialidades, em imagens pictóricas como as fotografias e em produtos orais digitalizados, é o que permite a existência fecunda dos investigadores. Se nada tivesse sobrevivido das civilizações e trajetórias passadas, os historiadores não passariam de literatos em estado de liberdade completa e irrestrita para a criação ficcional. Precisamos de documentos para "inventar" histórias e "recriar" vidas.
A transitoriedade é a marca das civilizações e das vidas individuais. A fragmentação das experiências da transitoriedade é a linguagem intrínseca da vida em sociedade ou no recanto solitário dos sujeitos. São gradações de historicidades que reside na mesma lógica/ilógica da busca de completude e de perenidade.
Há... Voltando para Santa Maria! "Depois que a Pandemia se transforme em Endemia e vire resfriado", só depois disto (qual será a eternidade deste tempo?), quero voltar àquela terra e rever estes espaços de memórias.
Amplio este convite a todos que já conhecem ou que gostariam de conhecer Santa Maria!
Nenhum comentário:
Postar um comentário