Porto do Rio Grande em 1908

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sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

A IMPRENSA LITERÁRIA E A ARCÁDIA II


         Entre a segunda metade da década de 1840 e o final da década de 1860, o jornalismo da cidade do Rio Grande sofreu transformações e aprimoramentos, superando a publicação de periódicos necessariamente voltados à defesa político-partidária. Com o crescimento do número de periódicos, aparecem grandes jornais diários que buscavam um caráter noticioso e informativo; os pasquins, numa linguagem informativa e com enfoque pessoal; e a imprensa voltada à divulgação da literatura.
A Arcádia congregou junto de si os primeiros críticos literários. Entre os colaboradores estão Apolinário Porto Alegre, Bernardo Taveira Júnior, Aquiles e Apeles Porto Alegre, Glodomiro Paredes e outros. O português Antônio Joaquim Dias foi o proprietário, responsável pelo lançamento de quatro séries, sendo as três primeiras publicadas em Rio Grande e a última em Pelotas.
         A publicação, lançada às segundas-feiras, estava voltada à veiculação de textos literários, especialmente autores rio-grandenses; ensaios de história e artigos de crítica literária; levantamentos biográficos de vultos da história pátria e do Rio Grande do Sul, com destaque ao espírito de liderança e o sentido de honra e dever de personagens privilegiados. A definição de temáticas, a busca de uma identidade regional frente ao nacional, o posicionamento antiescravista e sensibilizador do sofrimento promovido pela escravidão, o conflito liberal/ conservador/centralizador, já permeiam algumas preocupações sobre o futuro da Província e as alternativas de desenvolvimento para a cidade do Rio Grande. Porém, alternativas com enfoque nas especificidades da Província e a autonomia do regional frente ao nacional, tema tratado pela historiografia republicana a partir de 1882, não assumem este sentido. Entretanto, a reflexão da identidade regional começa a constituir uma busca intelectual sistemática.
         Os problemas financeiros para a manutenção do jornal tornam-se insuportáveis quando do lançamento da quarta e última série do periódico. O desabafo do seu proprietário sintetiza as dificuldades:
“Arcar com o indiferentismo de uma época de puro cálculo aritmético e conveniência monetária; passar incólume por essa imensa multidão de egoístas, invejosos e estúpidos; vencer esta turbamulta de agiotas e interesseiros, que cuidam da burra e do estômago, indivíduos que dispõem da inteligência por medida e da ilustração por grama, rir desses racionais e amilhados, desprezando-lhes a impostura e o dinheiro, é de certo modo, uma vitória”.
Fomentando a expressão literária e reflexões sobre a identidade rio-grandense, a contribuição do Jornal Arcádia representa um importante caminho desta construção de um procedimento intelectual para explicar a realidade, transferindo ao território sul-rio-grandense os parâmetros estéticos do romantismo.
Os estudos encaminhados na Arcádia terão continuidade nos escritos dos representantes da geração do Partenon Literário, até 1880. Mesmo com o esgotamento do romantismo de cunho liberal, essa primeira geração, deixará na tendência às temáticas regionalistas “um leito comum à literatura gaúcha” que sobreviveu ao longo das décadas.

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