Porto do Rio Grande em 1908

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domingo, 10 de novembro de 2019

O EUCALIPTO DA IGREJA DE SÃO PEDRO


Eucalipto após a poda. Autor. 

A poda (em 2016) de um dos símbolos da cidade do Rio Grande, o eucalipto em frente à Igreja de São Pedro, possibilita um momento de reflexão e também trazer a luz novas informações sobre o tema.
Muitas gerações conviveram com o eucalipto que faz parte da paisagem urbana e que necessitou de uma radical intervenção para buscar o salvamento da árvore e também garantir a segurança da população no local mais movimentado da cidade.
Apesar de o momento ser de decepção popular frente à mudança da visão da bela árvore que ficou muito reduzida em volume, podemos aproveitar para relembrar as antigas iniciativas ligadas ao plantio dos eucaliptos em Rio Grande.
O prof. Titular do Dep. de Ciências Florestais da Universidade Federal de Santa Maria José Marchiore escreveu um artigo, a partir de pesquisas realizadas na Biblioteca Rio-grandense, que são muito esclarecedores (Primórdios da Silvicultura no Rio Grande do Sul - nota sobre a introdução do gênero Eucalyptus L’Her. Revista Balduinia. Santa Maria: UFSM, n. 44, p. 21-31, 2014).
Marchiore destacou que a introdução de espécies do gênero Eucalyptus L'Her no Rio Grande do Sul é objeto de controvérsia na literatura científica. Apesar de reconhecer a dificuldade de uma definição segura sobre a data de introdução no país, o pesquisador Navarro de Andrade (1911 – autor que propôs o cultivo do eucalipto para utilização em madeireiras) foi o primeiro a apontar o pioneirismo do Rio Grande do Sul, atribuindo a iniciativa ao rio-grandino Frederico de Albuquerque, em 1868. Outras fontes afirmam que desde a década de 1830 iniciara o plantio, mas sem fontes confiáveis de confirmação. O que podemos afirmar é que o jornal Diário do Rio Grande nos meses de janeiro e fevereiro de 1873 anunciava a venda de mudas de "Eucalyptus e Acácias da Austrália", entre outras árvores ornamentais, na rua General Osório n° 33. Ou seja, não é uma nota sobre a introdução das espécies, mas sim da utilização comercial destas árvores, fortalecendo a perspectiva de que a introdução está relacionada a Frederico de Albuquerque.
Em termos de Brasil as duas primeiras mudas de eucalipto foram plantadas no Brasil em 1824, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro as quais foram trazidas de Portugal. O cultivo no século 19 era voltado à ornamentação e arborização urbana. De acordo com Navarro de Andrade, a primeira plantação foi realizada em ruas e no Jardim Público da cidade fluminense de Vassouras, em 1871, porém, um fato pitoresco ocorre: as árvores acabaram cortadas pelo povo, que lhes atribuía a culpa pelo aparecimento da febre amarela na cidade. Enquanto Andrade é o "pai da eucaliptocultura" no Brasil, no Rio Grande do Sul, esse papel é atribuído a Joaquim Francisco de Assis Brasil na Granja de Pedras Altas.
O Eucalipto do Largo Dr. Pio, antes da poda, possuía 26 metros de altura e 740 cm de circunferência a altura do peito. A igreja mais antiga do Rio Grande do Sul ostenta em sua frente o eucalipto mais antigo do estado. Conforme Marchiore a placa de informação junto à árvore apresenta incorreções de data e espécie botânica. A placa indica Eucalyptus globulus, mas trata-se um “Eucalyptus camaldulensis Dehnh., espécie com ampla distribuição geográfica em sua pátria de origem (Austrália). Espécie vinculada a margens de cursos de água, Eucalyptus camaldulensis requer fácil acesso ao lençol freático, peculiaridade ecológica que ajuda a entender o bom desenvolvimento da árvore e sua longevidade no ambiente inóspito em que se encontra, haja vista o calçamento realizado em toda a praça, com exceção de um anel de mais ou menos um metro de largura, em torno da base do tronco. Não custa lembrar que o lençol freático se encontra a pouca profundidade na planície litorânea, de modo que nunca falta água para a árvore, independentemente da intensidade do período de seca. O nome específico (camaldulensis) remete ao Monastério de Camaldoli, nas proximidades de Nápoles (Itália), de onde foi colhido, por Friedrich Dennhardt (1787-1870), jardineiro chefe do Jardim Botânico de Nápoles, o material utilizado na descrição original, de 1832”, conclui Marchiore.
A data de plantio também apresenta uma incorreção. Conforme pesquisa do autor na coleção de jornais da Biblioteca Rio-grandense, uma pequena nota, constante no número 8.885 do jornal Diário do Rio Grande, publicado em 20 de Setembro de 1878, uma sexta-feira, esclarece sobre a datação: "A Praça da Matriz acaba de ser arborizada com Eucaliptos globulos, em substituição aos salsos que ali existiam. O Eucalipto é a árvore adotada em toda a parte, por considerar-se uma das plantas mais higiênicas". Apesar de concisa, a matéria jornalística esclarece sobre a data aproximada de plantio e que a arborização anterior era feita com indivíduos de Salix humboldtiana Willd (salsos), espécie nativa e de fácil propagação por estacas. O Diário do Rio Grande, em edição anterior, destacou que "os dois salsos que se achavam colocados bem na frente da porta principal da Igreja Matriz haviam sido serrados".
Dos eucaliptos plantados na praça em 1878, restou apenas o atual, pois na década de 1940, quando da construção do prédio dos Correios e Telégrafos, eles foram cortados e a então praça da Matriz é reduzida e vai se tornar o Largo Dr. Pio hoje conhecido.

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