Porto do Rio Grande em 1908

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domingo, 17 de março de 2024

CONTRIBUIÇÃO ORAL À PISCICULTURA. PEIXE-CACHORRO

 

Alguns peixe-cachorro em aquário. https://housaqua.com/en/2644-acestrorhynchus-pantaneiro.html

Acestrorhynchus pantaneiro é o peixe-cachorro ou tambica. A ocorrência deste peixe se dá nas Bacias do Rio Uruguai, Paraná Inferior, Paraguai e Prata. 

É um peixe com corpo alongado, boca grande e dentes caniniformes, com mancha redonda umeral e tamanho de pequeno a médio (no máximo 35cm), ataca em cardume e com velocidade outros peixes menores (como os lambaris) e são nativos da água doce. 

É uma espécie alóctone, ou seja, nativa de bacia hidrográfica brasileira, porém, não nativo do local em que foi encontrado. É um peixe intruso entre os naturais daquele curso de água. 

Seu primeiro registro científico na Bacia da Laguna dos Patos foi feito em 2006 (Saccol-Pereira et al.).  

O que sempre me chama a atenção nestes dados é como se sua presença fosse mais recente nestes ecossistemas. Ou seja, 2006 ou posterior em outros locais anteriormente a estas datas. De fato, em algumas áreas, o seu convívio pode ser bem recuado.

E aí entra o meu depoimento! 

Recordo que pescava de caniço com o meu pai no Rio Jacuí (praia dos Ingazeiros) na cidade de Rio Pardo em 1986 (as pescarias tiveram continuidade pelos anos seguintes). Ao lado do lambari, o tambica era o peixe mais comum de ser pescado e com tamanho entre 8 a 15 cm. O tambica e os lambaris eram passados em farinha, temperados com sal e limão e fritos no óleo. O grande número de espinhas se tornavam flexíveis frente ao calor do óleo. Era um tira-gosto de final de tarde acompanhado de cerveja ou refrigerante. 

Um pescador que fornecia peixe para o meu pai, colocava espinhéis durante à noite (entre o Rio Jacuí e a boca de entrada do Rio Pardo) e pegava espécimes maiores com cerca de 35 cm para tirar um pequeno filé. Pela manhã ele aparecia com os peixes para vender. Certamente, foi a partir de 1986 que isto ocorreu sistematicamente. Meu pai participou em uma oportunidade de uma pescaria um pouco mais arrojada: pescar tambica no inverno na Barragem/Eclusa Anel de Dom Barcos nas proximidade da cidade de Rio Pardo. Os tambicas, tem uma característica de pularem da água para o ar, formando um belo espetáculo. Nesta barragem os peixes eram abundantes. Tenho quase certeza, mas não vou afirmar, que por volta de 1975, pesquei alguns tambicas no Rio Jacuí no Balneário Porto Ferreira (local que a família passou alguns veraneios). Porém, a memória é mais nebulosa. 

Já em Rio Grande, fiz a leitura de uma publicação recente (Ictiofauna da Ilha dos Marinheiros, estuário da Lagoa do Patos, sul do Brasil (2018) Inventário • Biota Neotrop. 18 (1) • 2018 •https://doi.org/10.1590/1676-0611-BN-2017-043). Nas amplas coletas realizadas foram encontrados dois peixe-cachorro (Acestrorhynchus pantaneiro) com destaque a sua condição de uma espécie invasora na Ilha dos Marinheiros que deveria ser monitorada. Recomendo aos interessados a leitura do artigo e as pertinentes preocupações com a interação com a ictiofauna nativa. A publicação indica uma introdução recente desta espécie na Ilha dos Marinheiros. 

Apenas como contribuição, posso afirmar, que numa pescaria de caniço na Ilha, peguei vários indivíduos desta espécie em 1993. O que chamou a atenção era o tamanho superior na casa de 15 a 20 cm (é difícil esquecer quanto a linha estica subitamente e o caniço fica pesado para puxar). Isto ocorreu na Lagoa das Noivas, na Ilha dos Marinheiros, em várias oportunidades a partir de 1993. O peixe-cachorro já estava por lá e estava bem criado de tamanho. No comparativo com os vários locais na região, lá eram os espécimes que observei de maior dimensão. 

Também estava presente no Arroio das Cabeças (Vila da Quinta) na mesma época. Na Ponte que liga a Vila da Quinta com a Ilha do Leonidio, é um lugar abundante, até o presente, desta espécie de peixe. 

Indo em direção ao Taim, os canais de irrigação para o arroz na BR-471, ocorreu a disseminação o que deve indicar que a Lagoa Caiubá deve ser uma de suas casas. Um exemplo da presença na BR-471 é o canal de irrigação na entrada para Santa Isabel.  Nos cursos d'água junto ao Canal da Corsan eles também são encontrados. A difusão é ampla aqui na região do município do Rio Grande. 

Esta memória oral foi feita para registrar a minha experiência com "piscicultura do caniço", hábito herdado na infância por influência de meu pai e mantido até o presente. Empiricamente, conheço o peixe-cachorro ou tambica, entre o Rio Pardo e Rio Grande, a no mínimo 38 anos. Para mim, neste curto espaço temporal de vida comparativamente a temporalidade da evolução dos ecossistemas aquáticos, ele já é um personagem perene nestas paisagens físicas e das memórias. 

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