O
desenvolvimento histórico em Rio Grande está fundado na localização geopolítica
em relação ao Prata e na estruturação de um amplo espaço portuário que
possibilitou a expansão do comércio marítimo em nível internacional. A
importância da cidade para o comércio de exportação e importação é fator
explicativo para eclosão de uma forte imprensa local que buscou se conectar com
as discussões econômicas, políticas e sociais do seu tempo. Sem entender a relação
porto-comerciantes, não é possível entender a destacada atuação da imprensa que
foi se tornou multifacetada em temáticas ao longo do século XIX.
Artigo de Francisco das Neves Alves,
especialista em história da imprensa, contribui para a compreensão do jornalismo
local. “A cidade do Rio Grande e o seu jornalismo: brevíssimo bosquejo
histórico acerca do século XIX”. ALVES, F. N. (Org.) In: História e Imprensa no
Rio Grande do Sul. Rio Grande: FURG, 2001.
Conforme
Alves a cidade do Rio Grande teve suas origens ligadas ao projeto expansionista
português na região platina, com a fundação, em 1737, do Presídio
Jesus-Maria-José. Esta povoação, pioneira da ocupação portuguesa nas terras
sul-rio-grandenses, viria a ser fundamental à ocupação desse território, nas
disputas luso-hispânicas, ao longo dos séculos XVIII e XIX, até a legitimação
definitiva da posse da Coroa Portuguesa. Elevada à Vila em 1747, condição só
consolidada em 1751, devido aos trabalhos de demarcação do Tratado de Madri, a
localidade foi o primeiro núcleo administrativo do Rio Grande do Sul.
Rio
Grande foi elevada à categoria de cidade em 1835 e, durante o século XIX,
continuou com significativa importância político-administrativa no contexto
sul-rio-grandense, constituindo-se num núcleo eleitoral que abrangia ampla
região provincial. Em 1860, quando o Rio Grande do Sul foi dividido em dois
distritos eleitorais, enquanto Porto Alegre sediava o primeiro, Rio Grande era
a sede do segundo.
O
progresso rio-grandino ao longo do século XIX deveu-se à sua estratégica
posição de escoadouro à produção derivada da atividade pecuária que se
desenvolvia de modo crescente no Rio Grande do Sul. O Porto do Rio Grande
exercia então o papel de “principal porta da Província”, onde se realizava
importante comércio de importação de produtos europeus, notadamente ingleses,
além de negócios com a região platina e “o comércio interior, de além das
fronteiras, o mais lucrativo de que São Pedro gozava” e que se “achava em
franco progresso”. Desta maneira, a maior parte da produção
pecuário-charqueadora rio-grandense, com destaque para os couros de boi, o charque, os chifres, a
graxa, a carne em barris, o sebo e o tutano em bexigas, foi comercializada
através do Rio Grande. O avanço econômico
trouxe consigo um crescimento da área urbana da cidade e a busca de um
aprimoramento desse sítio urbano, no objetivo de vencer as “dificuldades
naturais” impostas pelo ambiente, resultando numa completa transformação do
espaço original ocupado pela localidade. Neste sentido, as autoridades
municipais tiveram a constante preocupação de “embelezar” e “aformosear” o
município, de modo a dar-lhe um “agradável aspecto” e uma “forma elegante,
proveitosa e saudável.
Ao
lado do desenvolvimento da economia e do crescimento urbano ocorreu também um
incremento de natureza demográfica no Rio Grande do século XIX. No início da
centúria, a população era da ordem de duas mil pessoas e, já nos anos trinta, o
número de habitantes havia duplicado. Na década de cinqüenta, a população era
de aproximadamente treze mil pessoas; e de quatorze mil na década seguinte. E,
na virada do século XIX para o XX, havia cerca de trinta mil habitantes na
comunidade rio-grandina. Em linhas gerais, a sociedade rio-grandina era
constituída, no seu ápice, por uma elite, representada por elementos ligados ao
comércio e às atividades pecuário-charqueadoras (proprietários dos grandes
estabelecimentos), ou ainda pelos militares de alta patente. As posições dentro
desse estrato social algumas vezes tornavam-se difusas e pouco definidas, tendo
em vista que poderia ocorrer uma multiplicidade de atividades dentre seus
representantes. Já na base da estrutura social estavam os escravos, empregados
no trabalho urbano, nas atividades pastoris e na produção do charque.
Desenvolveu-se também um estrato social intermediário, o qual não apresentava
uma homogeneidade interna, representando setores profissionais diversos,
ficando as possibilidades de ascenso social cada vez mais restritas quanto mais
primária fosse a atividade desempenhada. Já ao final do século, iniciavam-se os
primeiros passos em direção à industrialização, acompanhados, conseqüentemente,
pelo surgimento de um incipiente operariado.
A
elite rio-grandina, à proporção do crescimento de seu poder econômico, buscava
sofisticar seus hábitos, importando usos, costumes e utensílios europeus. As
viagens a Europa eram motivo de orgulho, bem como o envio de filhos para
estudar naquele continente, ou pelo menos permitindo-lhes o aprendizado de
alguma língua estrangeira. As práticas desse segmento social, na busca de um
verniz civilizador, contribuíram de forma direta ou indireta com o
aprimoramento de um arcabouço cultural na cidade. Já para uma parcela mais
limitada de representantes dos setores intermediários, de acordo com as
condições financeiras, foi viável também constituir-se em consumidora de
cultura, lendo livros, jornais e revistas, freqüentando teatro ou investindo no
aprimoramento cultural-educacional dos filhos. Neste quadro, funcionaram no Rio
Grande vários teatros, livrarias e gabinetes de leitura, com destaque para a
Biblioteca Rio-Grandense, fundada em 1846, que viria a tornar-se uma das mais
importantes instituições culturais gaúchas na propagação da leitura. A educação
foi praticada em diversas escolas particulares, bem como houve uma razoável
preocupação com o desenvolvimento da instrução pública, apesar dos constantes
problemas por ela enfrentados, como a falta de professores, a carência de salas
de aula e utensílios utilizados no ensino e a má remuneração dos docentes.
Este
campo de significativo crescimento econômico, avanço urbano, expansão
populacional e relativo progresso cultural tornou-se fértil às práticas
jornalísticas que evoluíram consideravelmente junto à comunidade rio-grandina,
durante o século XIX, e o próprio desenvolvimento da imprensa também serviu a
caracterização da cidade como um dos mananciais de civilização na sociedade
rio-grandense. Acompanhando o fato que a cidade do Rio Grande desempenhou papel primordial no contexto sul-rio-grandense, a imprensa rio-grandina foi uma das mais destacadas do Rio Grande do Sul e mesmo do Brasil, tanto pela quantidade, quanto pela qualidade de seus periódicos. Assim, além de ter sido uma das primeiras localidades gaúchas a possuir jornais, o Rio Grande teve algumas das mais perenes folhas em termos provinciais/estaduais, as quais chegaram a circular por mais de seis décadas. Neste sentido, o jornalismo praticado na cidade portuária acompanhou, passo a passo, de modo muito próximo, a evolução do conjunto da imprensa brasileira do século XIX.
rio-grandense. Acompanhando o fato que a cidade do Rio Grande desempenhou papel primordial no contexto sul-rio-grandense, a imprensa rio-grandina foi uma das mais destacadas do Rio Grande do Sul e mesmo do Brasil, tanto pela quantidade, quanto pela qualidade de seus periódicos. Assim, além de ter sido uma das primeiras localidades gaúchas a possuir jornais, o Rio Grande teve algumas das mais perenes folhas em termos provinciais/estaduais, as quais chegaram a circular por mais de seis décadas. Neste sentido, o jornalismo praticado na cidade portuária acompanhou, passo a passo, de modo muito próximo, a evolução do conjunto da imprensa brasileira do século XIX.
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