A imprensa literária em Rio Grande esteve
entre as de maior destaque no Rio Grande do Sul na segunda metade do século 19.
Porém, a presença de escritos literários em jornais ou em publicações,
especialmente poemas, já se fazia desde a primeira metade daquele século. A pesquisa
da profa. Maria Eunice Moreira (PUCRS) aprofundou a pesquisa (já reconhecida
pela Academia Rio-Grandina de Letras) de que a primeira publicação de poesias
de uma mulher no Rio Grande do Sul, foi escrita por uma moradora da Vila do Rio
Grande de São Pedro. Sua autora foi Maria Clemência da Silveira Sampaio nascida
na Freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Estreito em 17 de dezembro de
1789, quando esta área pertencia a Rio Grande e hoje faz parte do município de
São José do Norte. Quando da invasão espanhola em 1763, a população
luso-açoriana da Vila do Rio Grande em parte se fixou nesta localidade que tem
teve um grande surto de crescimento econômico fundado na cultura do trigo.
Posteriormente, Maria Clemência teve três poemas publicados em jornais “Elogio”
(1845), “Saudosa expressão da Pátria” (1847) e “Um sítio de Porto Alegre”
(1857).
Dada a relevância do tema, faço a divulgação
do artigo “Os versos (quase)desconhecidos de Maria Clemência da Silveira
Sampaio” escrito pela profa. Maria Eunice e publicado na revista Letras de
Hoje, PUCRS, v.41, n.4, 2006. Trechos são reproduzidos a seguir:
“Instituída pela crítica e pela historiografia literária
como a primeira poetisa do Rio Grande do Sul e, ao mesmo tempo, como autora da
obra que inaugura a literatura escrita no Rio Grande do Sul, com Poesias às
senhoras rio-grandenses (1834), Delfina Benigna da Cunha foi, no entanto,
antecedida por outra poetisa riograndina a quem cabe o papel pioneiro na historiografia
sulina. Maria Clemência da Silveira Sampaio e seus Versos heróicos, publicados
em 1823, no Rio de Janeiro, antecederam em onze anos a obra da autora até então
tida como iniciadora da atividade literária na Província sulina. Maria
Clemência da Silveira Sampaio, filha de Maurício Inácio da Silveira, um piloto
de sesmarias natural da cidade do Rio Grande (RS), e que, em 1814, fora
responsável pela execução do Mapa da Real Medição e Demarcação, procedido por
Provisão Régia do Tribunal de Desembargo do Passo para limites da guarda e
povoação do Serrito, na margem setentrional do rio Jaguarão. Em Porto Alegre, o
jovem casou-se com Mariana Joaquina Sam Payo, natural da freguesia de Desterro,
da ilha de Santa Catarina, filha de Manuel Marques de Sampaio e Clemência Maria
de Jesus. Dessa união, o casal teve dois filhos: Maurício, que nasceu em Porto
Alegre, em 22 de abril de 1785, e foi batizado nesse mesmo ano, em 2 de julho
de 1789, e Maria Clemência. Com o falecimento do primogênito, e a sucessiva
morte dos pais, a menina tornou-se a única descendente e herdeira da família.
Foi também em Rio Grande que essa (quase) desconhecida poetisa morreu, em 2 de
fevereiro de 1862, não tendo deixado
herdeiros naturais, pois não casou e nem teve filhos.
Uma consulta aos registros de batismo do século
XVIII, na Mitra Diocesana do Rio Grande, possibilitou a leitura e a transcrição
da certidão de batismo de Maria Clamência. O documento está lavrado nos
seguintes termos: Aos vinte e oito dias do mês de dezembro do ano de mil
setecentos e oitenta e nove nesta Matriz de Nossa Senhora da Conceição do
Estreito eu o vigário encomendado da mesma Francisco Inácio da Silveira batizei
e pus os Santos Óleos a Maria filha legítima de Maurício Inácio da Silveira
natural e batizado na Matriz de São Pedro do Rio Grande e de Mariana Joaquina
de Sam Payo natural e batizada na Matriz de Santo Antônio dos Anjos da vila da
Laguna, neta por parte paterna de Mateus Inácio da Silveira e de Maria Antônia
da Silveira, naturais da Ilha do Faial e pela materna do cirurgião mor Manoel
Marques de Sam Payo, natural do Alentejo, e de Clemência Maria de Jesus,
natural e batizada na Matriz de Nossa Senhora do Desterro da Ilha de Santa
Catarina nasceu aos dezessete dias do dito mês. Foram padrinhos o dito
cirurgião mor Manoel Marques de Sam Payo por procuração que apresentou o
Capitão mor Mateus Inácio da Silveira e eu o sobredito vigário. Per verdade fiz
este assento. Vigário Francisco Inácio da Silveira.
Versos
heróicos, a primeira obra de Maria Clemência, foi
publicada em 1823, como um opúsculo de apenas oito páginas, que, pelo motivo
da gloriosa aclamação do Primeiro Imperador Constitucional do Brasil, compôs e
recitou Maria Clemência da Silveira Sampaio, no baile público, que o comércio
do Rio Grande deu na noite do dia da mesma Aclamação.Em 12 de outubro de
1822, D. Pedro foi aclamado imperador constitucional do Brasil9, e, na vila de
São Pedro do Rio Grande, na mais extrema Província brasileira, realizou-se uma
festividade de aclamação do primeiro soberano brasileiro. A festa é promovida pela
classe comerciante do Rio Grande, constituída principalmente por portugueses
vindos dos Açores. Entre o grupo feminino, destaca-se uma mulher de trinta e
três anos, oriunda de uma família de origem lusitana, que declama uma
composição poética de sua autoria, na qual expressa o apoio e o reconhecimento
do povo rio-grandense ao jovem monarca. O texto, apresentado sob o título de Versos
heróicos, receberá o beneplácito do Império e será publicado no ano
seguinte pela Imprensa Nacional, no Rio de Janeiro. O fato tem características
especiais: os versos não só registram a contribuição pioneira de um autor do
Continente do Rio Grande para a literatura pátria, como são de autoria de uma
mulher jovem e culta. Maria Clemência da Silveira Sampaio, a autora do singelo
poema dedicado ao Imperador, não poderia supor que os versos declamados nessa
ocasião ocupariam um lugar pioneiro na história da literatura de sua Província”.
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