Gravura da tragédia (1755). Acervo: The Earthquake Engineering Online Archive. |
O dia 1° de novembro de 1755,
a partir das nove horas e trinta minutos da manhã, ficou
marcado na história de Portugal e produziu importantes reflexos no Brasil que
era colônia portuguesa. Foi no mês de agosto de 1755 que a atual Catedral de
São Pedro tinha sido edificada em
Rio Grande sendo o prédio em uso de maior longevidade do Rio
Grande do Sul. Rio Grande tinha então, aproximadamente, 3.000 habitantes.
Poucos meses depois, no início de novembro, milhares de prédios em Lisboa
estavam destruídos, contando entre eles, com inúmeras igrejas. Foi necessário
reconstruir a cidade que virara escombros numa tríplice onda de catástrofes: o
grande terremoto, o maremoto (tsunami) e os incêndios. Estima-se que até 90 mil
pessoas morreram de uma população de 275 mil habitantes. Nem o Palácio Real, que se
situava na margem do rio Tejo escapou da destruíção do terremoto e do tsunami.
Na Biblioteca do Palácio haviam 70 mil volumes e centenas de obras de arte que
foram destruídas. No Arquivo Real documentos sobre a exploração ultramarina e
muitos documentos medievais foram danificados. O tsumani criado pelo abalo
sísmico alcançou trinta metros de altura causando prejuízos no norte da África
e na Europa, tendo provocado 10.000 mortes somente no Marrocos. As ondas ao
chegarem ao porto de Lisboa ainda tinham 6 metros de altura
conseguindo avançar cerca de 250
metros dentro da cidade.
A repercussão da catástrofe foi tão devastadora em
Portugal e na Europa que teve início os estudos científicos de sismologia. O
tremor de quase 9 graus na escala Richter teve seu epicentro no Oceano
Atlântico a mais de 200 km
a sudoeste de Lisboa. Ao tremor seguiu-se as águas e depois o fogo, que durou
cinco dias. “Os incêncios tiveram principalmente duas origens: por um lado os
lustres, candelabros e eventualmente archotes que estavam acesos no interior
das igrejas; por outro os fogões das casas e dos palácios”, afirma Rui Tavares
no livro O Pequeno Livro do Grande
Terramoto editado em Lisboa (Edição Tinta da China) no ano de 2009. Este
autor faz um exercício de imaginação sobre Portugal antes do Terremoto (ou
Terramoto como escrito pelos portugueses) e o impacto deste no imaginário do
século 18.
Viajemos com o autor até o horror daquele fatídico dia: “Aparentemente os edifícios começaram a ruir a
partir do segundo minuto do sismo. O vaivém das paredes tinha deixado os
telhados sem sustentação. As telhas caíam, e depois delas os travejamentos e
tudo o que neles estava suspenso, incluindo os candelabros acesos das igrejas.
A queda dos telhados matou, feriu ou imobilizou imediatamente grande parte dos
fiéis que se encontravam nas igrejas – alem de por vezes lhes ter tapado as
saídas – enquanto as chamas dos candelabros se propagavam rapidamente às
madeiras. Nas ruas, as pessoas eram atingidas por pedaços de revestimento,
telhas soltas, até varandas e paredes inteiras. (...) A derrocada dos edifícios
levantava ondas de poeira em seu redor. Essas nuvens tapavam o sol, tornavam o
ar irrespirável, e cobriam já uma grande parte do centro da cidade, uma
cerração tão forte que parecia querer sufocar todos os viventes. Quando o abalo
se suspendeu, os lisboetas ficaram atarantados pela cidade, perdidos, uns dos
outros. Alguns procuravam os seus parentes ou haveres, outros ainda não tinham
compreendido completamente o que havia sucedido. As nuvens de poeira
continuavam a dificultar a visibilidade. O grande pânico dos incêndios
ocorreria umas horas depois. Para já, os lisboetas parecem ter pensado que o
pior tinha passado – se é que conseguiam pensar em alguma coisa. Muitos
desceram até a ribeira, ao Tejo e às suas praias. O nível do mar estava abaixo
do normal na maré baixa. Houve até quem escrevesse, mais tarde, que se tinha
visto o fundo do rio. [A onda gigante] arrastou consigo um grande número de
embarcações. Recordemos que num dia comum o porto de Lisboa contava com entre a
meia centena e a centena de navios de grande porte, aos quais se deveriam
juntar embarcações menores, botes, etc. Toda essa madeira, inteira ou
despedaçada, deve ter entrado pelas ruas da cidade, principalmente nas
freguesias de São Paulo, mais baixas e expostas ao rio, rangendo e estalando à passagem.
Quando a onda regrediu deixou estes desperdícios que mais tarde serviriam de
combustível para as chamas. Segundo alguns testemunhos, a maré subiu e desceu
por três vezes em pouco mais de cinco minutos, e o mar continuou alterado
depois disso. Não se sabe quanta gente morreu, em Lisboa, por ação das ondas
tsunami...”.
O
Marquês de Pombal foi um nome central na reconstrução de Lisboa ao mesmo tempo
em que se redobra a necessidade de arrecadação no Brasil e a restrição a
gastos, inclusive o apoio material aos açorianos recém-chegados a Vila do Rio
Grande. As notícias da tragédia correram pela Europa e América e deixaram
traumas no próprio rei de Portugal D. José I que criou uma fobia a edifícios
sólidos e passou a morar em luxuosas tendas. A maioria dos sobreviventes não
teve pressa em voltar às suas casas preferindo ficar pelos campos, com o medo
de que os novos tremores que ocorreram nos anos seguintes em Lisboa, fossem
porta-vozes de uma nova fatalidade.
As ruínas de Lisboa (1755). Acervo: The Earthquake Engineering Online Archive. |
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