História e Historiografia do RS

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

O GRANDE TERREMOTO DE LISBOA

Gravura da tragédia (1755). Acervo: The Earthquake Engineering Online Archive.  


         O dia 1° de novembro de 1755, a partir das nove horas e trinta minutos da manhã, ficou marcado na história de Portugal e produziu importantes reflexos no Brasil que era colônia portuguesa. Foi no mês de agosto de 1755 que a atual Catedral de São Pedro tinha sido edificada em Rio Grande sendo o prédio em uso de maior longevidade do Rio Grande do Sul. Rio Grande tinha então, aproximadamente, 3.000 habitantes. Poucos meses depois, no início de novembro, milhares de prédios em Lisboa estavam destruídos, contando entre eles, com inúmeras igrejas. Foi necessário reconstruir a cidade que virara escombros numa tríplice onda de catástrofes: o grande terremoto, o maremoto (tsunami) e os incêndios. Estima-se que até 90 mil pessoas morreram de uma população de 275 mil habitantes. Nem o Palácio Real, que se situava na margem do rio Tejo escapou da destruíção do terremoto e do tsunami. Na Biblioteca do Palácio haviam 70 mil volumes e centenas de obras de arte que foram destruídas. No Arquivo Real documentos sobre a exploração ultramarina e muitos documentos medievais foram danificados. O tsumani criado pelo abalo sísmico alcançou trinta metros de altura causando prejuízos no norte da África e na Europa, tendo provocado 10.000 mortes somente no Marrocos. As ondas ao chegarem ao porto de Lisboa ainda tinham 6 metros de altura conseguindo avançar cerca de 250 metros dentro da cidade.
A repercussão da catástrofe foi tão devastadora em Portugal e na Europa que teve início os estudos científicos de sismologia. O tremor de quase 9 graus na escala Richter teve seu epicentro no Oceano Atlântico a mais de 200 km a sudoeste de Lisboa. Ao tremor seguiu-se as águas e depois o fogo, que durou cinco dias. “Os incêncios tiveram principalmente duas origens: por um lado os lustres, candelabros e eventualmente archotes que estavam acesos no interior das igrejas; por outro os fogões das casas e dos palácios”, afirma Rui Tavares no livro O Pequeno Livro do Grande Terramoto editado em Lisboa (Edição Tinta da China) no ano de 2009. Este autor faz um exercício de imaginação sobre Portugal antes do Terremoto (ou Terramoto como escrito pelos portugueses) e o impacto deste no imaginário do século 18.
         Viajemos com o autor até o horror daquele fatídico dia: “Aparentemente os edifícios começaram a ruir a partir do segundo minuto do sismo. O vaivém das paredes tinha deixado os telhados sem sustentação. As telhas caíam, e depois delas os travejamentos e tudo o que neles estava suspenso, incluindo os candelabros acesos das igrejas. A queda dos telhados matou, feriu ou imobilizou imediatamente grande parte dos fiéis que se encontravam nas igrejas – alem de por vezes lhes ter tapado as saídas – enquanto as chamas dos candelabros se propagavam rapidamente às madeiras. Nas ruas, as pessoas eram atingidas por pedaços de revestimento, telhas soltas, até varandas e paredes inteiras. (...) A derrocada dos edifícios levantava ondas de poeira em seu redor. Essas nuvens tapavam o sol, tornavam o ar irrespirável, e cobriam já uma grande parte do centro da cidade, uma cerração tão forte que parecia querer sufocar todos os viventes. Quando o abalo se suspendeu, os lisboetas ficaram atarantados pela cidade, perdidos, uns dos outros. Alguns procuravam os seus parentes ou haveres, outros ainda não tinham compreendido completamente o que havia sucedido. As nuvens de poeira continuavam a dificultar a visibilidade. O grande pânico dos incêndios ocorreria umas horas depois. Para já, os lisboetas parecem ter pensado que o pior tinha passado – se é que conseguiam pensar em alguma coisa. Muitos desceram até a ribeira, ao Tejo e às suas praias. O nível do mar estava abaixo do normal na maré baixa. Houve até quem escrevesse, mais tarde, que se tinha visto o fundo do rio. [A onda gigante] arrastou consigo um grande número de embarcações. Recordemos que num dia comum o porto de Lisboa contava com entre a meia centena e a centena de navios de grande porte, aos quais se deveriam juntar embarcações menores, botes, etc. Toda essa madeira, inteira ou despedaçada, deve ter entrado pelas ruas da cidade, principalmente nas freguesias de São Paulo, mais baixas e expostas ao rio, rangendo e estalando à passagem. Quando a onda regrediu deixou estes desperdícios que mais tarde serviriam de combustível para as chamas. Segundo alguns testemunhos, a maré subiu e desceu por três vezes em pouco mais de cinco minutos, e o mar continuou alterado depois disso. Não se sabe quanta gente morreu, em Lisboa, por ação das ondas tsunami...”.
         O Marquês de Pombal foi um nome central na reconstrução de Lisboa ao mesmo tempo em que se redobra a necessidade de arrecadação no Brasil e a restrição a gastos, inclusive o apoio material aos açorianos recém-chegados a Vila do Rio Grande. As notícias da tragédia correram pela Europa e América e deixaram traumas no próprio rei de Portugal D. José I que criou uma fobia a edifícios sólidos e passou a morar em luxuosas tendas. A maioria dos sobreviventes não teve pressa em voltar às suas casas preferindo ficar pelos campos, com o medo de que os novos tremores que ocorreram nos anos seguintes em Lisboa, fossem porta-vozes de uma nova fatalidade. 

As ruínas de Lisboa (1755). Acervo: The Earthquake Engineering Online Archive.   

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