História e Historiografia do RS

sexta-feira, 10 de abril de 2020

GRIPE ESPANHOLA NO RIO DE JANEIRO

Revista Careta, 2 de novembro de 1918. Cemitério do Cajú (Rio de Janeiro) não tinha coveiros
 suficientes para os enterramentos. Acervo: Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. 

      O governo do Rio de Janeiro impôs censura a imprensa, proibindo notícias sobre mortes ou críticas aos serviços de saúde, decretando feriados para evitar aglomerações e divulgando que a epidemia declinava quando na verdade a mortalidade crescia. Com a intensificação da epidemia, a cidade do Rio de Janeiro (a que os efeitos foram mais devastadores e que apresenta uma ampla documentação para análise) foi paralisando e as ruas ficando vazias devido ao medo. Cerca de 600.000 pessoas ficaram doentes. Entre outubro e novembro de 1918, a Espanhola matou quase 13.000 pessoas no Rio de Janeiro. Procissões eram organizadas facilitando ainda mais o contágio dos fiéis desesperados. Muitas cidades passaram a viver uma onda de saques, depredações, roubos e destruição de bens públicos. Ocorreu uma crise no abastecimento de alimentos no Rio de Janeiro, com especulação e aumento exorbitante dos gêneros.


       A falta de alimentos e remédios fazia a situação tornar-se mais apavorante, ficando a população desorientada. Grande foi o impacto emocional causado tanto pela violência da moléstia quanto pelas limitações ao seu combate. As fontes e os relatos analisados apresentam descrições da fome e dos saques às padarias, armazéns e quitandas por uma turba de convalescentes esquálidos (GOULART, Adriana. Um cenário mefistofélico: gripe espanhola no Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado em História – Departamento de História, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2003).

   Nas cidades tradicionais, mesmo em período de normalidade, já se convivia com taxas de mortalidade muito altas devido à insalubridade e concentração excessiva de pessoas pobres em pequenos espaços. O crescimento urbano é promissor para a difusão de epidemias. Com o desenrolar dos fatos, as transformações deteriorando a vida urbana, atormentando os habitantes, aumentava ainda mais o temor coletivo. 

      A divulgação pela imprensa do número de óbitos, da falta de assistência médica e das atrocidades cometidas durante a epidemia intensificava o clima de medo. Além disso, em época de epidemia, o não cumprimento dos rituais fúnebres aumenta o temor em relação aos mortos. 

   Historicamente, o médico tem um papel social de respostas às doenças que acometem a sociedade. A explicação médica tem grande importância social e emocional, uma vez que permite ao doente compreender seu infortúnio. Um dos aspectos essenciais do papel e do poder social do médico está em sua capacidade de nomear o sofrimento do paciente. Dentro desse quadro, pode-se entender o valor do diagnóstico e do prognóstico de uma doença. Mesmo se tratando de uma doença perigosa, esses mecanismos possibilitam torná-la compreensível e emocionalmente mais aceitável que uma doença incompreensível (GOULART, Adriana. Revisitando a espanhola: a gripe pandêmica de 1918 no Rio de Janeiro. In: História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Rio de Janeiro: Casa de Osvaldo Cruz, Fiocruz, janeiro 2005).

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