História e Historiografia do RS

domingo, 2 de fevereiro de 2020

CRIAÇÃO E RECRIAÇÃO ARTÍSTICA NOS CARTÕES-POSTAIS

     A produção de cartões-postais é uma atividade fascinante! Eu deliro buscando detalhes arquitetônicos, de roupas, existência de automóveis, tecnologias, infraestrutura, ou qualquer detalhe que possa conduzir a datação da imagem: a espacialidade (as técnicas, estéticas, materialidades várias) deve ser coerente com a temporalidade em que são gestadas.  
         Partindo de uma fotografia, se fazia uma colorização "mais fidedigna" ou "mais artística" de determinado objeto que estava sendo retratado. Em alguns casos, cartões já haviam sido anteriormente editados e receberam nova versão com exclusão ou inclusão de detalhes. 
      Um exemplo pode ser observado abaixo, em dois cartões que retratam a mesma fotografia "base" para sua produção e que chegaram a diferentes resultados. 
          O cenário é o atual Quartel do Sexto GAC construído em 1878 e que permanece íntegro no conjunto urbano contemporâneo. 
       Acredito, mesmo não tendo encontrado a fotografia "base" que o primeiro cartão é o mais fidedigno nos detalhes originais, quais sejam: foi colorizado a partir de uma fotografia em preto e branco, mantendo detalhes arquitetônicos, paisagísticos (árvores), iluminação (fios, postes, projeção d, pavimentação, presença de militares em frente ao portão de entrada do Quartel. A fachada do Quartel está voltada para o Leste e pela inclinação da sombra do poste na fachada, hipoteticamente, considero que a fotografia foi obtida entre nove e dez horas da manhã. 



Editor desconhecido. Datação hipotética entre 1910-1915.


      Agora observemos o segundo cartão, reproduzido abaixo, que recebeu um trabalho artístico primoroso que o deixou "clean". A pintura das paredes externas é de um cinza claro; uma bandeira do Brasil foi fixada e que inexistia no primeiro cartão; o ângulo esquerdo e direito sofreu redução para concentrar o foco na fachada (reduzindo árvores e uma das janelas superior e inferior da fachada direita); bandeira e soldados marchando no portão de entrada se tornaram nítidos para visualização; o céu ganhou detalhes de nuvens brancas e de fundo azul claro; a fiação de luz se tornou transparente para não poluir o cenário e o último poste (e sua projeção de sombra na fachada do quartel) foi excluída; a clarificação e equilíbrio do piso escondeu o fato de que a pavimentação era de chão batido, areia e irregularidades que se tornavam problemáticas em dias de chuva. Neste segundo cartão, a identificação escrita foi ampliada com mais detalhes do objeto. É menos fidedigno e mais voltado a construção estética agradável ao olhar dos colecionadores de cartões. Portanto, fogem da realidade da infraestrutura de acesso terrestre ao Quartel que era relativamente precária.    

Editor R. Strauch/Livraria Rio-Grandense. Datação hipotética entre 1910-1915.

      Depois destes breves comentários/observações que poderiam se multiplicar, podemos afirmar que o cartão-postal é um produto de retoques e de recriação artística de uma matriz fotográfica original? Que, inclusive, a releitura pictórica poderá ter tido por base outro cartão-postal? 
       E ainda questiono subjetivamente o leitor: a sua preferência estética reside no primeiro ou no segundo cartão?

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